São Paulo, quinta-feira, 28 de setembro de 2006
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Neurociência

Casamento e longevidade

O neurocientista Robert Sapolsky é um dos maiores especialistas em estresse da atualidade e, como tal, é muitas vezes solicitado a dar entrevistas. Em uma delas, a repórter perguntou qual era sua receita particular para lidar com o estresse crônico. A resposta: "Eu amo o meu trabalho, faço exercício regularmente -não dispenso minhas três partidas de futebol por semana- tenho um casamento maravilhoso há quase 20 anos".
A repórter ficou furiosa. A reportagem era para uma revista direcionada a mulheres executivas, solteiras e poderosas. "O senhor percebe que essas mulheres já têm em média mais de 35 anos, vivem para o trabalho e talvez nunca se casem? Como posso dizer a elas que sofreriam menos as conseqüências do estresse crônico se estivessem casadas?"
E, no entanto, é fato: em média, pessoas casadas adoecem menos e vivem mais do que as solitárias.
Eventos devastadores, como a morte de um filho, não aumentam a mortalidade nos anos seguintes entre pais casados, mas aumentam entre aqueles já divorciados ou viúvos na época da perda, que não contavam com o apoio de um cônjuge. Entre pacientes com doenças cardíacas graves, a taxa de mortalidade é três vezes maior entre aqueles que não contam com o apoio social de amigos íntimos e cônjuges.
Relacionamentos afetam nossa vida de várias formas.
Uma delas, que tem impacto diretamente sobre o bem-estar, é a regulação da resposta ao estresse. Pessoas socialmente isoladas têm o sistema de resposta ao estresse exageradamente ativo, o que provoca hipertensão, leva à formação de placas nas artérias e aumenta a chance de doenças cardíacas. No final das contas, viver sozinho pode ter um impacto negativo sobre a longevidade tão grande quanto fumar, ser hipertenso, obeso ou sedentário -tudo, aliás, devido ao estresse crônico.
Claro que isso não significa que o casamento seja a solução de todos os problemas. Ele pode, sim, ser um fator de proteção -mas só se for com a pessoa certa. Não é preciso ser cientista para saber que um mau casamento faz mal à saúde, com conseqüências negativas para corpo e mente.
E ter um(a) companheiro(a) estável é ótimo, mas não é tudo. Amigos íntimos -bons amigos, daqueles que sabem da nossa vida, nos apóiam em qualquer circunstância e aparecem ao primeiro pedido de ajuda- reduzem nossa resposta ao estresse e fazem um bem danado à saúde. Mas isso você já sabia...


SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Sexo, Drogas, Rock'n'Roll & Chocolate" e de "O Cérebro Nosso de Cada Dia" (ed. Vieira & Lent)
suzanahh@folhasp.com.br


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