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Entrevista - Cynthia Montgomery

Muitas empresas fracassam por que não pensam direito na estratégia antes de abrir

SEGUNDO AUTORA, DEFINIÇÃO DE O QUE A EMPRESA SERÁ E POR QUE ELA SERÁ IMPORTANTE PODE LEVAR EMPREENDEDOR AO SUCESSO, MAS É NECESSÁRIO MANTER ESTRATÉGIA FRESCA E NOVA

MARIA PAULA AUTRAN
DE SÃO PAULO

Não importa o tamanho da empresa. O fundamental é que ela saiba quem é, como vai competir e, principalmente, por que será importante no mercado, diz Cynthia Montgomery, professora da Harvard Business School.

Ela, que está lançando no Brasil o livro "O Estrategista" (Sextante), diz que a clareza sobre essas ideias pode definir o sucesso ou o fracasso de uma companhia iniciante, por exemplo.

Para Cynthia, uma empresa deve sempre trazer algo diferente para o mercado, mas é preciso fazer isso com estratégia. Confira a entrevista.

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Folha - O que é estratégia?
Cynthia Montgomery - A estratégia diz quem uma empresa é, como ela vai competir e por que ela vai ser importante.

Por que ela é tão importante para um negócio?
Peter Drucker [guru da administração] fez uma distinção sobre fazer as coisas de maneira certa e fazer as coisas certas.
A estratégia está ligada a fazer as coisas certas. É fazer essas escolhas que estão no coração da empresa, que vão determinar todo o resto sobre ela: quem e como ela vai servir. São essas perguntas fundamentais que determinam a essência de uma empresa.

Os princípios da estratégia servem para qualquer tipo de empresa, inclusive as pequenas e médias?
Muitas pessoas pensam que os empreendedores não precisam de estratégia, que a estratégia é algo estável e duro e que ela é para empresas grandes e já estabilizadas.
Isso é totalmente um mau entendimento. Acredito que os empreendedores precisam ter sua estratégia, eles devem ter seu próprio ponto de vista. Um exemplo disso -não é exatamente uma companhia pequena- é o serviço de buscas da Microsoft, o Bing.
Já existia o Google e o líder da divisão de serviços pergunta à equipe: por que o Bing? Por que o mundo precisa de outro mecanismo de busca?
Por que o mundo precisa do seu negócio? Essa é a pergunta que todo empresário precisa responder.

Por que a estratégia é importante para empreendedores?
Empreendedores têm enormes taxas de fracasso. Alguns devido a boas ideias mal executadas, mas muitos devido a ideias que foram mal concebidas desde o início.
Pensar claramente nesse ponto [estratégia] pode fazer uma enorme diferença na trajetória deles. Pode também fazer uma enorme diferença na habilidade da companhia para atrair financiamento, empregados e consumidores.
Eu incentivo os líderes de empresas pequenas e grandes, novas e velhas, a responder essa questão: por que essa é companhia é ou será importante?
Para uma empresa iniciante, a experiência de pensamento é real: por que o mundo precisa desse negócio?

Qual o erro mais comum dos empreendedores quando se trata de estratégia?
Eles tendem a subestimar obstáculos e a superestimar o valor agregado de seus negócios.

Quando é o melhor momento para um empreendedor pensar na sua estratégia?
Não há um momento certo, porque as coisas mudam rapidamente e a estratégia e as organizações precisam ser fluidas. Uma boa estratégia no começo pode levar o empreendedor ao sucesso, mas é igualmente necessário manter a estratégia fresca e renovada, para mantê-la relevante na medida em que o mercado e as oportunidades se desenvolvem.
É por isso que um líder precisa ser um estrategista e liderar com essas perguntas sempre em mente.

Qual a relação entre liderança e estratégia?
Como um líder, é fácil ser engolido pelas demandas urgentes do cotidiano.
O líder é o responsável por fazer as escolhas que definirão o caminho que aquela empresa terá de tomar e quem ela será.
Se você não faz essas escolhas, será difícil fazer bem todas as outras coisas necessárias. Se o líder faz esses julgamento errado [sobre mudanças no ambiente e no mercado], tudo que a companhia fizer estará em risco.

O que grandes estrategistas têm em comum?
Pensam com clareza e são bons "conceituadores". Eles conseguem olhar um problema e entender qual o ponto mais profundo, olhar para várias peças e pensar de um jeito diferente.
Eles entendem as implicações das experiências pelas quais a companhia passou e conseguem pôr tudo isso junto e pensar de forma holística. Estratégia é pensar holisticamente.

Qual seria um exemplo de boa estratégia no mercado hoje?
A Ikea [fabricante de móveis sueca] passou a ser a maior empresa de móveis do mundo, mas a estratégia que vemos hoje foi cunhada por seu fundador empreendedor, Ingvar Kamprad.
Ele frequentemente a descrevia como uma "empresa de conceito", construída em torno de uma compreensão clara de quem era.
Suas palavras são instrutivas: a Ikea ofereceria "uma vasta gama de móveis bem desenhados e funcionais a preços tão baixos que o maior número de pessoas possível será capaz de pagar por eles".
Essas palavras foram ditas por ele muitas vezes. Em uma indústria forte, com muitos jogadores, a Ikea é uma alternativa atraente. E fez de Kamprad um dos homens mais ricos do mundo.

Qual o ponto fundamental da estratégia de empresas como Google ou Apple? O mundo não necessariamente precisava do que elas criaram...
Quando eu falo em "por que você vai ser importante" não quer dizer, necessariamente, que os consumidores estão insanos pensando "nós precisamos disso".
O que você deve fazer é pensar em um produto que você acha que os consumidores vão precisar e, nessa situação, a ideia é a mesma.
Você tem que pensar quem vai precisar, como o produto será e qual preço ele terá. Seja o consumidor que demande ou a empresa que perceba uma necessidade, só funciona se a companhia criar algo que vá repercutir em algum grupo de consumidores.

Como as empresas podem e devem usar as novas tecnologias e as mídias sociais nas suas estratégias?
A ameaça e as oportunidade das novas tecnologias e das mídias sociais diferem dependendo da indústria. Em algumas áreas, essas as novas tecnologias e mídias sociais causaram rupturas, levando a uma reorganização dos "players" da indústria.
Em outras (como a saúde) é algo bom de se ter, mas que não leva novos jogadores a substituirem os antigos.
As novas tecnologias, com uma aplicabilidade tão extensa, são uma mina de ouro para os empreendedores porque há um potencial enorme ainda não aproveitado -para conquistar velhas indústrias e começar outras novas.
Empresas estabilizadas ficam muito vulneráveis em períodos como esse. Elas também precisam pensar "fora da caixa" e antecipar as mudanças que podem ameaçá-las e torná-las obsoletas.
Para qualquer empresa, no entanto, o desafio não é apenas como criar um negócio popular, mas como desenvolver um modelo rentável viável. Pense no Facebook. Atrair usuários é muito mais fácil do que gerar lucro.

Em tempos de crise, a estratégia tem um papel mais importante?
O que geralmente as empresas fazem em tempos de crise é cortar custos e tentar continuar a ser quem elas eram antes. Mas o que é realmente importante é repensar quem você é e como você está competindo.
Particularmente, se houver uma mudança estrutural forte no mercado, o que você não vai querer é se manter o mesmo competidor. Como sempre na estratégia, você precisa pensar "estamos fazendo a coisa certa?".
Uma crise pode ser uma oportunidade para mostrar que o que você está fazendo pode não ser mais relevante.
É preciso pensar se aquela é uma mudança temporária e se o mercado deve voltar a ser o que era.
Ou se será uma mudança fundamental e, nesse caso, você precisa lidar com a pergunta: "por que seremos relevantes nessa nova realidade?".

Qual diferença deveria existir entre a estratégia de empresas de países desenvolvidos e a de empresas dos emergentes?
A única diferença seria a velocidade das mudanças.
Se você olha para os Brics, há muito crescimento, muito movimento, o que significa que, assim como em qualquer país ou em qualquer companhia do mundo, é preciso ter uma estratégia.
Só que, como as coisas estão acontecendo mais rapidamente, a estratégia precisa ser mais fluida, mas os princípios são os mesmos.

O ESTRATEGISTA
AUTORA Cynthia A. Montgomery
EDITORA Sextante
TRADUÇÃO Liliana Negrello
QUANTO R$24,90 (208 págs.)

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