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Primeira-dama teve acesso inédito ao alto escalão do poder
soviético; ela se tratava de leucemia na Alemanha
Morre Raíssa,
mulher de Gorbatchov
JEAN-PIERRE THIBAUDAT
do "Libération", em Moscou
Raíssa Gorbatchova, mulher do ex-presidente soviético Mikhail
Gorbatchov, morreu ontem, aos 67 anos, em Muenster (noroeste da Alemanha),
onde se tratava de leucemia aguda.
Desde a internação de Raíssa, em 26 de julho, Gorbatchov,
68, que governou a extinta União Soviética (URSS) entre
1985 e 91, passava todos os dias ao lado da mulher. Visivelmente fatigado,
parecia não acreditar na proximidade irremediável de seu
fim.
Será que Khruschov, Brejnev e Andropov, antecessores de Gorbatchov
no cargo máximo da União Soviética (extinta em 1991,
com o fim do regime comunista), tiveram mulheres? Sem dúvida. Mas
seus rostos nunca apareciam com destaque nos noticiários.
Com o casal Gorbatchov foi diferente. O rosto sorridente e a silhueta
fina de Raíssa deram a volta ao mundo. Ela foi a primeira primeira-dama
da Rússia e, de certo modo, a única.
Os casos (mais trágicos e complicados) das mulheres de Lênin
e Stálin pertencem a outra época. Já Naina, mulher
de Boris Ieltsin, é eclipsada por sua filha, Tatiana.
Em suas "Memórias'', o líder que desempenhou um papel
fundamental no desmantelamento do comunismo na Europa e na ex-URSS relata
com emoção seu encontro com Raíssa Titarenko, numa
residência universitária de estudantes moscovitas. Ele era
estudante de direito; ela, de filosofia _marxista, é claro.
O casamento civil foi em 25 de setembro de 1953, mas a festa ocorreu em
7 de novembro, aniversário (no calendário russo) da Revolução
Soviética. No início, foram obrigados a viver separados.
Mas acabaram conseguindo um "quarto familiar''.
Depois de chegar ao cargo de primeiro secretário do Partido Comunista,
Gorbatchov não hesitou em impulsionar a carreira de Raíssa,
a quem admirava.
Mas essa presença radiosa e elegante, que tanto contribuiu para
a popularidade de Gorbatchov no Ocidente, teve um efeito exatamente inverso
na ex-URSS.
Pouco habituados a ver a mulher do chefe de governo ter destaque, muitos
russos se sentiram chocados ao ver a filha de um ferroviário agir
como se fosse uma czarina.
O gosto de Raíssa pela alta costura, numa época de dificuldades
econômicas, fez com que ela se tornasse alvo de críticas.
Ela introduziu a moda ocidental na Rússia, onde a moda era o modelo
único de vestidinho florido.
Como outras primeiras-damas do mundo, Raíssa também atuou
no âmbito social, e, sob sua influência, boa parte do orçamento
da medicina foi dedicado à assistência maternal e infantil.
Atualmente, as mulheres russas ocupam um lugar maior _embora ainda limitado_
na vida política. Mas na URSS, o poder delegado às mulheres
não ultrapassava determinado grau de responsabilidade. Raíssa
levou a feminilidade ao primeiro escalão do Estado.
A queda de Gorbatchov atingiu duramente o casal. Quando, recentemente,
Gorbatchov pediu ajuda ao chanceler alemão, Gerhard Schroeder,
e ao presidente dos EUA, Bill Clinton, para sua esposa doente, o Ocidente,
agradecido, lhe ofereceu os melhores hospitais. Optou-se pela Alemanha,
mais próxima da Rússia.
O corpo deve ser levado a Moscou hoje, num jato especialmente enviado
por Ieltsin. O funeral deve ocorrer na próxima quinta-feira. Ontem,
o ex-presidente Gorbatchov não deu declarações.
Tradução
de Clara Allain
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