São Paulo, domingo, 03 de abril de 2005

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Papa usou internet e engajou Vaticano na mídia moderna

ESPECIAL PARA A FOLHA

Ideologicamente conservador, João Paulo 2º passará à história como um líder religioso que soube fazer uso dos meios de comunicação, incluindo a internet, para divulgar a mensagem da Igreja Católica e criar imagens marcantes, como o gesto de se abaixar para beijar o solo dos países que visitava.
Uma exceção ocorreu em 1989. Quando viajou à Indonésia, recusou-se a beijar o solo de Timor Leste, que já reivindicava independência (aprovada em plebiscito dez anos mais tarde). Depois, mesmo debilitado fisicamente, manteve a tradição sem o esforço físico da homenagem. Crianças passaram a trazer-lhe em uma bandeja a terra a ser abençoada.

Vaticano na rede
Lançado em 1995, o site do Vaticano (www.vatican.va) está disponível em seis idiomas, com parte do conteúdo em português. Contém biografias papais, uma agenda de celebrações e informações sobre o Museu do Vaticano.
Em junho de 1998, a Igreja Católica passou a usar a web para atingir a China, palco de perseguições a cristãos "não-oficiais". A agência católica de notícias Fides (www.fides.org) fez uma versão de seu site em chinês. Foi o primeiro documento oficial elaborado pelo Vaticano nesse idioma.
Desde agosto de 1998, o Vaticano também vinha transmitindo, via internet, discursos de João Paulo 2º proferidos aos domingos, durante a tradicional oração de Angelus perante os fiéis na praça de São Pedro. Quando iniciou a transmissão on-line das cerimônias, a Santa Fé disse que a idéia era "aumentar a presença do Vaticano no mundo moderno da comunicação social".
Em novembro de 1998, durante encontro com estudantes da universidade privada Luiss, em Roma, João Paulo 2º ressaltou a influência da informática. "O computador mudou um pouco o mundo e, obviamente, também a minha vida", afirmou.
A importância da comunicação e de aliá-la à tecnologia disponível fez-se nítida até em detalhes aparentemente irrelevantes. Na sala de imprensa do Vaticano, por exemplo, o protetor de tela dos computadores diz: "We, journalists, love John Paulo II" (Nós, jornalistas, amamos João Paulo 2º).

"Woodstock católico"
Em suas viagens, arrebatou multidões de fiéis -e combateu o hedonismo e o materialismo.
As Jornadas Mundiais da Juventude receberam incentivo de João Paulo 2º a partir de 1986. Reuniu mais de 2 milhões de jovens para um "Woodstock católico" em Roma, em agosto de 2000 -um dos maiores encontros realizados em Roma desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Ao final, recordou que a igreja não aprova relações pré-matrimoniais nem medidas contraceptivas, pois o sexo deve ter fim reprodutivo. Apelidados de "papa boys" e "papa girls" pela imprensa italiana, os jovens participaram de uma vigília no campus Tor Vergata da Universidade de Roma, normalmente usado para concertos de rock.
As audiências papais, às quartas-feiras, demonstravam de forma inequívoca a facilidade de comunicação do papa. João Paulo 2º discursava em diversos idiomas, incluindo russo, alemão e português, com uma fluência e pronúncia admiráveis para fiéis do mundo inteiro. Essa distinção era reconhecida e citada como exemplo da mensagem católica de união.
Quando diversos grupos homenageavam o papa com cantos nacionais ou hinos religiosos, durante a cerimônia, ele costumava acompanhar com o corpo -e muitas vezes com a voz.
Mas, à medida que o tempo passava (e que suas doenças, principalmente o mal de Parkinson, agravavam-se), ele recorria a seus assessores para tarefas simples, incluindo a leitura de mensagens. Ao final, muitas vezes lia apenas os discursos em italiano e polonês -e de forma quase ou completamente incompreensível, dependendo da ocasião.
O vigor físico inicial do pontificado deu lugar a uma fragilidade cada vez mais evidente, apesar de o papa ter continuado firme em seus propósitos. Nos últimos anos, seu espaço estava restrito a dois andares do palácio apostólico: o terceiro, onde ficam os apartamentos privados, e o segundo, o das salas de recepção, da biblioteca e de seu escritório oficial.
"Lá no alto, atrás da janela mais célebre do mundo, há um prisioneiro", dizia o vaticanista Marco Politi. "Um prisioneiro que sofre, que só consegue se locomover de um local a outro com um imenso esforço, apoiando-se em sua bengala, acometido por tremores parkinsonianos."
O "Manual da Indulgência" do Vaticano, de 1999, estabelece que rezar com o papa em frente à televisão (entre outras coisas, como ficar um dia sem fumar e arrepender-se em público) é uma das práticas que aliviam a punição de pecadores. A obra, editada anteriormente em 1968 e 1986 considera válidas a oração mental para surdos-mudos e as preces junto à TV e ao rádio. (PAULO DANIEL FARAH)


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