São Paulo, domingo, 06 de maio de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Bento 16 supera rejeição inicial de religiosos brasileiros

ESCOLHA DO ALEMÃO PARA SUBSTITUIR JOÃO PAULO 2º GEROU APREENSÃO EM RELIGIOSOS DO BRASIL, QUE HOJE AGUARDAM ATÉ PALAVRA DE INCENTIVO DELE

DA REPORTAGEM LOCAL

A Igreja Católica no Brasil irá receber o papa Bento 16 com mais entusiasmo -ou, ao menos, com mais boa vontade- do que acolheu o anúncio da escolha do cardeal Joseph Ratzinger como substituto de João Paulo 2º.
Quando o cardeal chileno Jorge Arturo Medina Estévez pronunciou as palavras "habemus papam", pouco depois das 13h do dia 19 de abril de 2005, religiosos e alunos do Seminário Santo Antônio, na cidade de Juiz de Fora (MG), receberam o anúncio com gritaria.
O clima na espécie de auditório -com carteiras enfileiradas e uma grande televisão ao fundo- já era de euforia desde que a fumacinha branca começou a ser despejada no céu pela chaminé da Capela Sistina.
Apenas o primeiro nome do novo papa, e dito em latim -Iosephus-, bastou para a mudança de ânimo. Alguém, em meio às vozes que se abaixavam, completou: "Ratzinger". "Ninguém vibrou", disse à Folha o seminarista Sebastião Joaquim Filho. "Achei muito estranha a reação do pessoal", completou, admitindo receber com "tristeza" a escolha.
O desapontamento era coletivo, ao menos para uma parte significativa da igreja brasileira, que fez do compromisso social e do engajamento na luta política por uma sociedade mais justa sua face pública. Um de seus ícones intelectuais, Leonardo Boff, havia sido duramente combatido nos anos 80 -e, em última instância, derrotado- pelo então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, agora papa.
O temor era que o guardião da doutrina, o "Panzerkardinal" que atacara com dureza o uso da teoria marxista para a compreensão do mundo e da igreja, voltasse agora suas baterias contra essa experiência de igreja na América Latina.
Os sinais recentes -percebidos por bispos, padres e leigos no país- são não só de tolerância como de incentivo ao papel social da igreja na região.
Em encontro em fevereiro último com os núncios apostólicos (embaixadores do Vaticano) na América Latina, o papa Bento 16 reafirmou princípios que fariam a alegria de muitos antigos seguidores da Teologia da Libertação.
Após chamar a região de "continente da esperança", retomando uma expressão de João Paulo 2º, anunciou que "a assistência aos pobres e a luta contra a pobreza são e permanecem uma prioridade fundamental na vida das igrejas na América Latina".
"A meu ver, isso é uma espécie de aperitivo do que ele vai dizer no Brasil", afirma o padre José Oscar Beozzo, teólogo e historiador ligado a essa tradição de igreja no país.
Bispos alinhados com o compromisso social do catolicismo dizem não esperar dele gestos de recriminação ou de desincentivo durante sua visita. Muitos falam que Bento 16 está "surpreendendo positivamente", embora ainda haja críticas e apreensões por parte do clero mais à "esquerda".
A advertência pública do Vaticano ao padre salvadorenho Jon Sobrino, jesuíta e um dos pioneiros da Teologia da Libertação, anunciada em março, por exemplo, foi recebida como um reendurecimento de Roma e abertamente criticada por alguns religiosos e leigos.
Um bispo ouvido pela Folha declarou ter ficado "apreensivo", mas afirma que, a essa altura, o "baque" já foi "absorvido". D. Moacyr Grechi, arcebispo de Porto Velho, declara ter certeza de que o papa, durante a visita, falará sobre os problemas sociais da região.
Bispos também elogiam a iniciativa de diálogo inter-religioso, tema caro a essa corrente da igreja, já que o papa se encontrará no país com representantes do islamismo, do judaísmo e de denominações protestantes não pentecostais.
(RAFAEL CARIELLO)


Texto Anterior: Evangélico vai e paga mais à igreja
Próximo Texto: Brasileiros defendem padres engajados
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.