São Paulo, quinta, 11 de dezembro de 1997.



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Resumindo
Castro Alves também fez poemas de amor e morte

FRANCISCO ACHCAR
especial para a Folha

Castro Alves (1847-1871) surgiu numa época em que o Brasil passava por grande ebulição política e ideológica, que envolveu a literatura e fez da poesia declamada em espaços públicos (inclusive nas praças) uma forma privilegiada de comunicação.
Faziam-se frequentemente comícios, e se discutia a Guerra do Paraguai, a questão militar, os problemas centrais do Segundo Império, a viabilidade da República etc. Com seu discurso de tom elevado e sua figura bela e empolgante, o poeta chegava na hora certa. Foi consagrado principalmente porque sua eloquência agradava muitíssimo ao público do tempo.
A escravidão foi o tema mais candente de seus poemas de sentido social, mas ele não foi apenas o "poeta dos escravos", como é chamado, e "Navio Negreiro", "Vozes d'África" e outros poemas de temática abolicionista não foram incluídos em "Espumas Flutuantes" (coletânea que publicou em 1870), reservados que foram para outro livro, afinal publicado postumamente, chamado "Os Escravos".
Castro Alves foi também um belo poeta do amor e da morte, e esses temas existenciais avultam em "Espumas Flutuantes", deixando em segundo plano a poesia de fundo cívico e social que também se encontra no livro.
Como poeta do amor, Castro Alves é um caso singular entre os nossos românticos. Sua expressão amorosa é carregada de sensualidade, e a representação da mulher, nos melhores momentos de seus poemas eróticos, é marcada por uma realidade, uma "carnalidade" inteiramente ausente da poesia de seus contemporâneos e predecessores imediatos, que tendiam à pura idealização feminina, seja na figura da mulher-anjo, seja na da mulher-demônio. Castro Alves, diversamente, fala de mulheres de carne e osso, que despertam desejos concretos.
A escola condoreira, de que ele é a maior figura, caracteriza-se pelo gosto das imagens grandiosas, realçadas por antíteses, por hipérboles (exageros) e pelo tom elevado, de oratória enfática e messiânica, a serviço de causas sociais.
No poeta das "Espumas Flutuantes", essas características não se encontram apenas em poemas de temática que se pode chamar épica, porque abordam grandes questões coletivas, mas aparecem também em poemas propriamente líricos, seja os de tema amoroso, seja os que nos revelam o poeta como uma admirável pintor de paisagens.
Suas imagens, quase sempre arrojadas e intensas, costumam alternar o pequeno e o grandioso e têm o que se pode chamar "pendor cósmico" -uma preferência pelos magnos elementos da natureza, como oceanos, céus, noite, estrelas, montanhas, tufões.


Francisco Achcar é professor de Língua e Literatura Latina na Unicamp e autor de "Lírica e Lugar-comum" (Edusp).



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