São Paulo, domingo, 16 de setembro de 2001

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À BORDO

Primeiro vôo para NY estava vazio

Reuters - 15.set.2001
Avião decola do Aeroporto Logan, em Boston, Massachusetts


Comissárias da American Airlines não respondiam perguntas e talheres eram de plástico

FERNANDO RODRIGUES
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

Tensão, silêncio, pouca mudança no procedimento de segurança e um avião quase vazio. Assim foi o primeiro vôo do Brasil para Nova York depois da tragédia do dia 11. A companhia era a American Airlines. O avião, um Boeing-767 -como os que destruíram o World Trade Center.
Previsto para decolar de São Paulo às 21h10 de sexta-feira, o vôo 950 saiu do chão só às 22h41. O primeiro momento de tensão ocorreu logo após a decolagem. Uma equipe de jornalistas de TV pediu permissão a uma comissária para gravar cenas da cabine.
A comissária-chefe foi ao local, negou a autorização e disse: "Você não está autorizado a fazer nenhuma pergunta às comissárias que não seja sobre o cardápio ou suas necessidades fisiológicas". Concluiu com uma pergunta: "Estou sendo clara o suficiente?".
Aparentando irritação, a comissária-chefe foi até a cabine de comando. Voltou em seguida: "Acabei de falar com o capitão. Se vocês insistirem em fazer perguntas ou em gravar alguma coisa, ele vai pousar o avião e vocês descerão presos". A câmera foi confiscada pela comissária, sendo devolvida só na chegada em Nova York, às 7h30 (6h30, no horário local).
O Boeing-767 usado tinha 188 lugares. Estava com menos da metade da lotação. Na classe econômica (154 lugares), a Folha contou só 50 passageiros.

Segurança quase idêntica
Apesar das restrições internas no vôo, antes do embarque a mudança de procedimentos de segurança era quase imperceptível. A rigor, só um detalhe fez a diferença: uma pergunta.
"O sr. porta alguma faca ou objeto cortante de metal na sua bagagem?", perguntou o atendente da American Airlines no aeroporto de Guarulhos, São Paulo. Diante da resposta negativa, não houve revista manual de bagagem.
A maioria dos poucos ocupantes do vôo 950 era de estrangeiros. Não foram divulgados dados precisos, mas quase ninguém falava português ao fazer o check-in.
Na checagem de passaportes, o corredor brasileiro estava quase sempre vazio. "Os brasileiros estão com medo de viajar", disse um agente da Polícia Federal.
Na refeição servida durante o vôo, os talheres fornecidos eram de plástico transparente.
Durante o vôo, o piloto alertou os passageiros para que ficassem calmos se vissem pela janela algum outro avião muito próximo. "O espaço aéreo dos EUA está sendo patrulhado pelos militares. Se vocês virem algum avião voando muito próximo a nós, por favor não se assustem. Eles apenas querem checar visualmente se nós somos realmente quem dizemos que somos", explicou o piloto. A Folha não viu nenhum desses aviões durante a viagem, de aproximadamente nove horas.
Depois da aterrissagem no aeroporto JFK, em Nova York, o piloto agradeceu: "Obrigado por sua coragem e por confiar em nós, da American Airlines, e na segurança das viagens aéreas. Obrigado aos dez comissários de bordo por estarem cumprindo seu dever nesse momento difícil". Um grupo de passageiros aplaudiu.
No desembarque, comissárias choravam ao se despedir dos passageiros. A tripulação usava uma fita roxa e negra na lapela.
A saída do aeroporto em Nova York foi calma e rápida. Pouquíssimas bagagens estavam sendo revistadas. Na cabine de imigração, o agente americano olhou a foto no passaporte do repórter, carimbou-o, devolveu-o e só.
Às 8h55, o repórter já estava no táxi dirigido por Ahmed Shabbir, 40, muçulmano de Bangladesh e há 16 anos nessa profissão em Nova York. "Mas penso em ir embora, porque o preconceito e o racismo nunca foram tão grandes."


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