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Pai só é chamado
em último caso
FERNANDO ROSSETTI
da Reportagem Local
O pai é a segunda instância na
criação dos filhos. Essa idéia, formulada por um advogado, resume
o debate entre seis pais de classe
média reunidos pela Folha.
Segunda instância é o nível da
Justiça que resolve as disputas que
perduram após uma decisão em
primeira instância. Isto é, a mãe
-ou a primeira instância- lida
com a maioria dos problemas que
surgem no dia-a-dia. Mas, quando
as coisas se complicam, entra o pai
-a segunda instância.
Não que todos os pais digam tão
claramente que têm esse papel secundário e ao mesmo tempo de
maior poder na família. Dependendo da relação com a mulher,
ou ex-mulher, a visão dos papéis
de cada um se altera.
Guido Antonio Andrade, 58,
ex-presidente da seção paulista da
OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil), a pessoa mais velha na roda, foi o mais explícito: "A minha
filha me respeita porque ela percebe que a gente é a segunda instância, inclusive para a mãe. Porque,
quando a mãe está nos apertos, é a
gente que vai resolver".
Guido fala com a experiência de
quem criou dois filhos, hoje com
25 e 29 anos, no primeiro casamento, e agora é pai de uma menina, de 4 anos. Mas a sua idéia do
que é ser pai se repete nas falas das
outras pessoas.
"A mãe incorpora um papel
muito mais fiscalizador, controlador. Quando a minha filha vai para casa, ela já tem uma visão de
que eu, apenas com uma palavra,
com um olhar, defino as coisas",
afirma Judi Cavalcante, 33, jornalista separado, cuja filha, de 5
anos, mora com a mãe.
"A mulher tem uma carga emocional maior do que a nossa, é
mais próxima dos filhos, tem um
relacionamento mais intenso",
afirma o funcionário público José
Francisco Pinto, 42, que tem dois
filhos (14 e 16 anos) do primeiro
casamento e dois (5 e 7 anos) do
segundo. "Não que eu seja desligado", acrescenta.
"O pai é o primeiro a não saber
de nada. Ele fica ali meio de espelho, mesmo. É um cara que tem
que ir lá ganhar dinheiro e dar certo. E o filho fica olhando", afirma
o músico e compositor Kiko Zambianchi, 37.
Com uma filha com 19 anos
-"que quando era criança me
via mais pela televisão do que ao
vivo"- e duas, de 7 e 8 anos, do
segundo casamento, Kiko acha
"até bom" que o pai não saiba de
nada. "Quando ele fica sabendo é
porque alguma coisa não está dando certo", diz.
Separados
Mesmo os pais que criam sozinhos seus filhos tendem a repetir o
esquema de segunda instância.
O comerciante Valdir Kachvartanian, 37, mora, com o filho de
10, na casa dos pais. "Em muitas
coisas, minha mãe me substitui,
porque não dá para ficar 24 horas
ao lado dele. Ela assume esse papel
normal." Papel "normal" significa passar todas as manhãs da semana com o neto, cuidar que ele
vá para a escola à tarde e, à noite,
alimentá-lo e colocá-lo na cama.
"Eu sou o pai e mãe, mesmo.
Até nas dúvidas a respeito de vários assuntos, tanto do que ele
precisaria ter da mãe como do
pai", diz Valdir, cuja ex-mulher
tem, segundo ele, uma relação
"muito distante" com o filho.
"A mãe, por conta dessa coisa
de ser fácil o convívio direto, parece que não tem um respeito imediato. Ela ficava impondo o meu
respeito por telefone: "Olha, eu
vou ligar para o seu pai' ", conta o
advogado Heber Soares, 34.
Depois de 11 anos separado da
mulher -impondo respeito por
telefone-, Heber levou para casa
o filho, hoje com 12. Mas ele sente
o peso: "Eu preferia que tivesse
alguém para fazer o papel de mãe,
assim de ficar cobrando tarefa, ver
se ele tomou banho, se não tomou,
se jantou ou não. Esses miudinhos
enchem o saco".
"Mas eu não sei mais qual é o
papel do pai, porque para mim
confundiu tudo", diz Heber, que
depois de se separar tornou-se militante gay (por isso seu nome foi
trocado nesta reportagem).
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