São Paulo, sábado, 24 de janeiro de 2004

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Os alagamentos serão eliminados?

Mesmo com investimentos pesados, o problema não será resolvido por completo, por causa da excessiva impermeabiliza ção do solo, da localização da cidade e da falta de obras e planejamento nas décadas passadas

DA REPORTAGEM LOCAL

A água acumulada no asfalto, atingindo a cintura dos moradores e entrando pelas frestas das casas, enquanto objetos e automóveis são arrastados pela correnteza, forma uma cena comum nos meses de verão e que continuará a se repetir na paisagem paulistana pelas próximas décadas, segundo especialistas ouvidos pela Folha.
Engenheiros e geógrafos apontam três fatores como responsáveis pela permanência das enchentes no cotidiano da cidade: a impermeabilização do solo gerada pelo processo de urbanização, a falta de investimentos em obras de drenagem ao longo das décadas passadas e a própria localização da cidade.
Em um prognóstico, decretam: se as obras estruturais forem feitas continuamente, a impermeabilização do solo for contida e a ocupação das áreas de mananciais for controlada, as inundações vão permanecer, mas os seus efeitos poderão ser minimizados, melhorando a qualidade de vida da população afetada.
"A cidade não tem meios de controlar as inundações no curto prazo. Mas, com obras e medidas preventivas, vamos ficando a cada ano um pouco melhor", explica o engenheiro Mário Thadeu Lemes de Barros, professor do Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Poli/USP.
Barros conta que existem cerca de 500 pontos de inundação em São Paulo, gerados ao longo dos anos principalmente pelo crescimento desordenado da cidade. Com a impermeabilização do solo, a água da chuva escorre de maneira mais superficial, indo diretamente para rios, córregos e galerias. Quando esses não conseguem transportar toda a água, ocorrem as inundações.
Antes da formação da cidade, as inundações eram uma característica natural da região da bacia do Alto Tietê, abrangendo colinas e amplas várzeas. A geógrafa Vanderli Custódio, do Departamento de Geografia da USP, autora de tese sobre enchentes em São Paulo, afirma que mais de 60% do território da região metropolitana assemelha-se a um grande reservatório elevado, com apenas um canal de esvaziamento.

Planejamento
Não houve um planejamento da ocupação do solo e nem uma política pública de longo prazo para obras de drenagem, afirma o geógrafo Augustinho Ogura, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas da USP. "A enchente virou problema quando a cidade invadiu as áreas de várzea e foi além, ocupando áreas de cabeceira de rios, aumentando o desmatamento e ampliando as moradias precárias."
Custódio afirma que não é possível discutir saídas definitivas, mas soluções eficientes para as inundações, com a adoção continuada de medidas preventivas e um novo enfoque para as obras de drenagem, que até hoje, segundo ela, copiaram modelos de outros países sem considerar as particularidades da região.
A geógrafa enfatiza também a importância de considerar o aspecto social das enchentes, uma vez que a maioria dos pontos de inundações está nos bairros periféricos e com mais carência de infra-estrutura. Nessa parte, o trabalho de conscientização da população deverá ser feito continuamente e o uso do solo controlado, para não aumentar as moradias precárias em áreas de mananciais e locais de risco.
A obra de rebaixamento e ampliação da calha do rio Tietê, feita pelo governo do Estado, e a construção, por parte da prefeitura e do Estado, de piscinões em áreas problemáticas são apontadas por Barros como ações necessárias para não piorar a situação atual.
"Essas obras vão reduzir as enchentes, mas é um investimento que sempre terá de existir. Será preciso continuar com as obras de drenagem e tentar conter a expansão e impermeabilização da cidade. As medidas não-estruturais, preventivas, são tão importantes quanto as obras de drenagem, ou até mais do que elas." (SIMONE IWASSO E CHICO DE GOIS)

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