São Paulo, segunda-feira, 24 de setembro de 2001

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Achar substituto para o Taleban será tão difícil quanto derrubá-lo

DA REUTERS

Encontrar um novo governo para o Afeganistão pode ser tão difícil quanto derrubar o antigo.
Se a "guerra contra o terrorismo" dos EUA expulsar o Taleban de Cabul, uma nova liderança precisa surgir rapidamente para preencher o vácuo deixado por quase três décadas de comunismo, guerra e islamismo radical.
Mas nenhum sucessor óbvio aguarda nos bastidores.
O nome do ex-rei Zahir Shah está sendo mencionado com mais frequência, mas especialistas crêem que sua idade avançada o torna um candidato improvável.
É mais possível que o próximo líder venha das fileiras de homens que lutaram contra a União Soviética nos anos 80 e, depois disso, sumiram de vista.
"Muitos dos mujahidin que eram comandantes nos anos 80 devem reaparecer", disse Ahmed Rashid, um especialista paquistanês em Afeganistão e Taleban.
Não está claro, contudo, como sua influência será desenvolvida. Mesmo nos melhores momentos, a política afegã é um ninho de cobras com rivalidades tribais, lealdades obscuras e traições.
O fato de o nome mencionado com mais frequência hoje ser o do ex-rei Zahir Shah, 86 -exilado em Roma desde sua deposição, em 1973-, diz muito sobre o estado sombrio da política afegã.
A esquerda pró-Moscou que governou até 1992 foi varrida do mapa depois que os mujahidin destruíram, em uma guerra civil, o crédito que eles haviam ganhado ao derrotar a União Soviética.
O Taleban chegou ao poder em 1996 e foi visto como um "salvador da pátria" que restauraria a paz, mas acabou ganhando a inimizade de muitos muçulmanos moderados com seu extremismo.
Zahir Shah nem mesmo deseja voltar ao poder, mas é a única figura que os afegãos permitiriam coordenar uma assembléia tribal para escolher um novo líder.
"Temos de dar poder ao povo afegão", disse Hamid Karzai, um líder tribal pashtu da área de Candahar que foi ex-vice-ministro de Relações Exteriores no governo mujahidin, de 1992 a 1994.
"O rei não se ofereceu para nenhum trabalho, ele simplesmente quer ajudar o povo afegão a retomar sua soberania."
Karzai trabalha há muitos anos com o ex-rei e outros líderes exilados para tentar organizar uma Loya Jirga, uma assembléia de 700 a 1.000 pessoas que se reuniria para escolher um novo líder tão logo o Taleban fosse deposto. Mas quem poderia ser o escolhido?
O líder da oposição com mais destaque atualmente é Burhanuddin Rabbani, 60, que era presidente quando o Taleban tomou Cabul em 1996 e ainda é reconhecido como tal pela ONU.
Sua Aliança do Norte, aliada a outros grupos de oposição do Afeganistão, está combatendo o Taleban, e diplomatas dizem que poderia receber auxílio material dos EUA em breve para promover ataques a Cabul.
Mas Rabbani acaba de perder seu melhor comandante, o lendário Ahmad Shah Masood, morto dias antes dos ataques a Nova York e a Washington.
E, mesmo que vencesse no campo de batalha, a aliança enfrentaria uma verdadeira guerra para conseguir governar em Cabul, já que é formada por tadjiques, uzbeques e outras minorias.
Entre os pashtus, a maioria étnica que tradicionalmente governa o país, muitos ex-comandantes e líderes tribais foram jogados para escanteio pelo Taleban, formado majoritariamente por pashtus.
Abdul Haq, que promoveu bombardeios espetaculares a Cabul durante a guerra contra a União Soviética até perder uma perna em combate, tem o respeito dos pashtus e o apoio dos EUA.
Mas outro pashtu proeminente, o líder islâmico radical Gulbuddin Hekmatyar, poderia desequilibrar a equação.
Hekmatyar, um dos líderes mais controversos da guerra soviética, atacou outros líderes mais frequentemente do que combateu os russos e declarou uma guerra contra o primeiro governo mujahid. Bombas enviadas por suas forças transformaram grande parte de Cabul em ruínas em 1993.
"Hekmatyar estragou tudo na época e poderia estragar tudo agora", disse Rashid, observando que Islamabad apóia Hekmatyar desde os anos 70.
O Paquistão tem o hábito de se intrometer na política afegã para impedir que Cabul reivindique áreas pashtus controladas pelo Paquistão e para manter um vizinho muçulmano amigo, que dá ao país "profundidade estratégica" contra a rival Índia.
Mas Karzai e Rashid advertiram contra deixar o Paquistão ter um papel tão ativo em questões afegãs. "Se os americanos deixarem que isso aconteça, será o fim de tudo", disse Rashid.



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