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PAULISTANOS
Sapopemba/São Mateus
Vergonha faz bairro sumir de currículo
AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL
Endereço: Santo André. Não foram poucas as vezes em que Uilma Rodrigues Duarte, coordenadora de um projeto social, viu os
jovens que atendia colocarem essa informação nos currículos que
enviariam a empresas. A resposta
era firme: "Você não mora em
Santo André, mora na Fazenda da
Juta. Se você não valorizar o lugar
onde vive, quem vai?".
O endereço falso dos jovens denuncia a baixa auto-estima da população que mora em Sapopemba, na zona leste de São Paulo. A
artimanha servia para fugir do
preconceito que costuma cair sobre quem vem de uma área famosa nas páginas policiais.
A violência é o principal problema para 46% das pessoas ouvidas
pelo Datafolha em Sapopemba,
São Mateus, Parque do Carmo e
Cidade Líder. Também acima da
média (24%) é o índice de pessoas
que sentem mais vergonha do que
orgulho do bairro em que vivem.
A criminalidade é associada pelos moradores ao envolvimento
de jovens com o tráfico de drogas.
"Passo na rua e vejo aquela turminha de meninos drogados, todos
valentes. Não estudam, passam o
dia ali. Parece que eles querem diploma de bandido", diz a vendedora Isabel Melo, 65.
Segundo uma pesquisa realizada pela Fundação Seade, em 2002,
Sapopemba está entre os distritos
com o maior Índice de Vulnerabilidade Juvenil da capital. O índice
inclui variáveis como a taxa de
homicídios entre jovens de 15 a 19
anos e a gravidez na adolescência.
A auxiliar administrativa Gisele
Aparecido, 19, é testemunha dessa
realidade. Ela já perdeu a conta
dos amigos que morreram em
brigas ou assaltos e uma de suas
amigas, de 12 anos, está grávida.
"Eu queria que onde eu moro tivesse sorveteria, bar, mas nem
adianta pois assim que abre fecha.
Na favela perto da minha casa
sempre tem toque de recolher."
Para a pedagoga Maria Lisabete
Santiago, que coordena o Centro
de Defesa da Criança e do Adolescente do Parque Santa Madalena,
em Sapopemba, o envolvimento
dos jovens com o tráfico é ligado à
falta de perspectivas de trabalho.
"Deixamos de ser um bairro-dormitório para ser um bairro-desemprego", diz. A região surgiu
para abrigar operários que trabalhavam nas fábricas do ABC.
"Eram pessoas que participavam
do movimento sindical, das greves. Por isso fomos abandonados
nos oito anos do Paulo Maluf
(1993-96) e do Celso Pitta (97-00).
Eles não tinham interesse em investir num reduto do PT."
Na pesquisa do Datafolha, 29%
dos moradores apontaram o PT
como partido preferido e 16%, a
prefeita Marta Suplicy como
quem mais contribuiu para a qualidade de vida dos moradores.
Os principais investimentos
municipais na região são os CEUs
(Centros Educacionais Unificados). São Mateus ganhou dois, e
Sapopemba, um.
Para 19%, a educação é a área
em que a prefeitura teve melhor
desempenho. Isso não significa
que o problema tenha sido resolvido. No Conselho Tutelar de Sapopemba, a maior demanda é por
vagas em creches.
Segundo o Datafolha, a região
concentra mais donas-de-casa
(16%) que a média (12%). Para a
assistente social Selma da Cruz,
da Associação União da Juta, esse
índice esconde a face feminina do
desemprego. "Aqui há muitas
mães que são chefes de família e
não conseguem trabalhar porque
não têm onde deixar os filhos."
Na ausência do Estado, a Igreja
Católica toma conta de grande
parte das ações sociais -65% dos
moradores da região se declaram
católicos. "A sociedade civil trabalha mas a estrutura é toda da
Igreja Católica", afirma Uilma
Duarte, secretária-executiva do
Instituto Daniel Comboni, que
tem origem religiosa.
"A gente tem que procurar
apoio em Deus, porque no governo não adianta", afirma a moradora Sueli Braga, 43, que mora
com dez filhos, um dos quais já
passou pela Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor).
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