São Paulo, quinta-feira, 28 de setembro de 2006

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Executivo define agenda legislativa do Congresso

Sérgio Lima - 14.jun.05/Folha Imagem
O ACUSADOR
O escândalo do mensalão estourou no dia 6 de junho de 2005, quando a Folha publicou entrevista na qual o então deputado Roberto Jefferson (PTB) acusava o governo de pagar deputados para ter apoio no Congresso. Jefferson foi o primeiro deputado a ser cassado na esteira do escândalo, no dia 14 de setembro, por 313 votos a 156

Maioria dos projetos de lei aprovados desde a redemocratização, em 1985, são de iniciativa do Planalto, que ainda tem o poder de editar medidas provisórias

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A análise dos principais projetos aprovados pelo Congresso Nacional desde a redemocratização do país, em 1985, mostra que o Executivo manteve durante todo esse período a primazia na definição do que deputados e senadores debateriam e votariam.
Dos projetos sancionados ou promulgados, 935 são de autoria do Palácio do Planalto, contra 721 elaborados pelos congressistas.
A preponderância é ainda maior quando são computadas as medidas provisórias, atos com força de lei editados pelo presidente da República. Foram 837 desde 1985.
Os números dos projetos sancionados e promulgados desde o governo José Sarney (1985-1990) estão em relatório da presidência do Senado, que não inclui as propostas orçamentárias, também de iniciativa do Executivo e que se contam às centenas.
De todos os governos desde 1985, apenas o de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) registra menos projetos de sua autoria aprovados do que os elaborados por congressistas -260 contra 308. Mesmo assim, não se pode falar em predominância do Legislativo, já que FHC enviou 263 MPs para o Congresso, fora as reedições e as leis orçamentárias.
Sob Luiz Inácio Lula da Silva, a preponderância se fortaleceu -foram 166 projetos aprovados e 218 medidas provisórias, até 25 de agosto, contra 106 textos de autoria legislativa.

Redução de férias
Iniciativas que brotam exclusivamente da vontade dos parlamentares são exceção. Os casos recentes incluem a aprovação da redução das férias de deputados e senadores, o fim de pagamento por convocação extraordinária, o fim do voto secreto (esse ainda tramitando) e a criação de CPIs, quase sempre em discordância com a vontade do Executivo.
É importante ressaltar que, normalmente, os projetos do Executivo são alterados durante a tramitação no Congresso.

Constituição de 88
Um dos principais trabalhos que analisam a relação entre o Palácio do Planalto e o Congresso é o livro "Executivo e Legislativo na Nova Ordem Constitucional" (FGV, 1999), dos cientistas políticos Argelina Cheibub Figueiredo e Fernando Limongi. Os dois falam em "continuidade legal entre o período autoritário e o atual no que diz respeito às normas que regulam a relação entre os Poderes Executivo e Legislativo", o que se contraporia ao período democrático pré-1964.
"Sob a Constituição de 1988, o Executivo se constituiu no principal legislador. (...) Os mecanismos constitucionais que ampliam os poderes legislativos do presidente -ou seja, a extensão da exclusividade de iniciativa, o poder de editar MPs com força de lei e a faculdade de solicitar urgência para os seus projetos-, estabelecidos pelas reformas militares e ratificados pela Constituição de 1988, não só lhe permitem definir a agenda legislativa mas o colocam em posição estratégica para a aprovação de seus projetos", diz trecho do livro.
Os cientistas políticos e os trabalhos consultados pela Folha são unânimes em apontar a preponderância do Planalto.
"Nos Estados Unidos, por exemplo, o presidente não pode apresentar projeto de lei, exclusividade dos deputados e senadores. O nosso presidencialismo é mais imperial", diz David Fleischer, professor da UnB (Universidade de Brasília).

Medidas provisórias
Coordenador do Centro de Estudos do Legislativo do Departamento de Ciência Política da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), Carlos Ranulfo Melo afirma que, com exceção dos Estados Unidos, "o controle da agenda pelo Executivo não é "privilégio" do Brasil, mas uma característica das democracias contemporâneas, sejam parlamentaristas ou presidencialistas".
Ele reforça a constatação de que nem mesmo sob Fernando Henrique Cardoso houve preponderância do Congresso, tomando como base a tese de doutorado da professora de Ciência Política da UFMG Magna Inácio. No estudo, ela inclui as leis orçamentárias, o que amplia bastante a diferença pró-Executivo.
A divisão do número de MPs editadas mostra que Itamar Franco (5,3 MPs por mês, em média) e Lula (5 MPs por mês) foram os presidentes que, proporcionalmente, mais recorreram à medida. "Quanto mais fraco o Executivo, mais ele depende de MPs", analisa o professor de Ciência Política da UnB (Universidade de Brasília) Paulo Kramer.
O presidente da República conta ainda com outro importante instrumento para fazer valer sua posição: o veto, parcial ou total, aos projetos aprovados no Congresso. Sua decisão só é derrubada com o voto, secreto, de pelo menos metade dos deputados e senadores.
Outro mecanismo que fortalece essa situação é o poder que os líderes partidários exercem sobre suas bancadas, o que dificulta em muito ações independentes e isoladas de deputados e senadores. (RANIER BRAGON E FERNANDA KRAKOVICS)


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