São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2001

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FILANTROPIA

Segundo consultores, nova perspectiva, introduzida por grandes companhias, é estimular funcionários a realizar ações voluntárias

Empresas trocam doações por trabalho social de longo prazo

MIRELLA DOMENICH
FREE-LANCE PARA A FOLHA

As empresas estão deixando de praticar somente a filantropia paliativa para atuar em ações de impacto social de longo prazo.
Os estudiosos afirmam que esse é um fenômeno global, disseminado pelas multinacionais.
"As empresas estão percebendo que podem proporcionar à sociedade uma contribuição maior do que apenas doar dinheiro, comida ou roupas", diz a consultora de voluntariado empresarial, Ruth Goldberg.
"Elas devem promover o desenvolvimento social, compartilhando com as entidades seu conhecimento em gestão, que é o que as empresas sabem fazer", afirma.
Para que as ações sejam efetivas, Ruth diz que as empresas não devem só fazer doações, mas precisam estimular o trabalho voluntário entre funcionários.
A estratégia do BankBoston, por exemplo, acompanha essa tendência. Desde a criação da Fundação BankBoston, em 1999, o banco deixou de apenas fazer doações para mobilizar seu quadro de funcionários em prol de ações sociais.
"Há três anos desenvolvemos uma gincana chamada rali social, que mobiliza 3.900 dos nossos 4.000 funcionários", diz a superintendente da fundação, Sonia Consiglio.
A gincana tem como objetivo chamar a atenção do maior número de pessoas para o voluntariado e formar multiplicadores de conhecimento. Nem por isso o banco deixa de incentivar ações filantrópicas, como o apoio às crianças da cidade de Russas, no interior do Ceará.
Em 2000, foram descontados R$ 25 da folha de pagamento de cada funcionário que colaborava com o projeto. O dinheiro foi utilizado para custear o material didático e o transporte escolar.
"Nossa atitude não foi paternalista porque não adotamos as crianças. Apenas contribuímos financeiramente para que elas pudessem voltar a estudar", diz Sonia. Hoje a fundação ajuda a gerenciar o projeto.
Segundo o presidente do grupo Yázigi Internexus e do conselho do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, Ricardo Young, é cada vez maior o número de empresas que, além de contribuírem financeiramente com as entidades, elaboram projetos de impacto duradouro, como ensinar técnicas administrativas.
Na prática, segundo dados da pesquisa Ação Social das Empresas, realizada pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), as empresas continuam contribuindo mais com recursos financeiros do que por meio de atividades voluntárias de seus funcionários.
No Sudeste, por exemplo, das 300 mil empresas que realizam ações sociais para a comunidade, 57% desenvolvem projetos assistencialistas e apenas 36% têm funcionários envolvidos em atividades voluntárias.
O diretor do site www.voluntarios.com.br e conselheiro do Ethos, Stephen Kanitz, diz acreditar que a filantropia, em muitos casos, é mais legítima do que as ações de longo prazo porque não tem relação com os negócios da empresa."Sou mais a favor do assistencialismo do que a criação de uma ONG como braço social da empresa, porque não cria conflito de interesses."
Young, também do Ethos, é menos radical. "A filantropia é importante em questões imediatas, mas está diretamente ligada ao lucro da empresa, o que a torna imprevisível", diz.
O grupo Orsa, por exemplo, destina 1% de seu faturamento bruto anual para atividades sociais, divididas entre filantropia e ações de engajamento dos funcionários. "Temos de atuar conforme as possibilidades do grupo", diz o presidente do Orsa, Sergio Amoroso.
O consultor de cidadania empresarial Antonio Carlos Martinelli recomenda que as empresas diminuam aos poucos as doações para que as entidades tornem-se auto-suficientes.
Isso, no entanto, não impede que elas continuem contribuindo com recursos financeiros e materiais. A HP Brasil, por exemplo, destina 17% dos R$ 800 mil que aplica por ano em ações sociais para campanhas de apoio e viabilização de projetos desenvolvidos por seus funcionários voluntários. Há três anos, a empresa somente fazia doações.
"Nosso objetivo é continuar contribuindo com a sociedade, mas chamando a atenção dos nossos funcionários para isso", diz o diretor de assuntos corporativos da HP Brasil, Gilberto Galan.


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