São Paulo, domingo, 30 de agosto de 2009

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5 PERGUNTAS SOBRE O PRÉ-SAL

Governo Lula dá viés social e nacionalista ao pré-sal

Modelo de exploração das novas reservas de petróleo põe fim ao sistema privatizante adotado no governo de Fernando Henrique Cardoso

Com estardalhaço, o governo federal anuncia amanhã as suas propostas para a exploração das reservas de petróleo na chamada camada do pré-sal. Estima-se que essa nova fronteira exploratória, a até 7 km de profundidade na costa brasileira, tenha potencial para mais do que dobrar as reservas de petróleo do país, torná-lo ator fundamental no mercado energético global e gerar receitas capazes de mudar o patamar de desenvolvimento nacional.
As propostas, que serão enviadas ao Congresso, preveem a criação de uma estatal petrolífera e um fundo para a educação, o combate à pobreza e a inovação tecnológica. As páginas seguintes discutem as principais questões do pré-sal.

Ricardo Stuckert - 2.set.08/PR
Lula, Dilma Rousseff (Casa Civil) e Edison Lobão (Minas e Energia) durante evento de produção do primeiro óleo do pré-sal, no ES

VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Classificado de "passaporte para o futuro", o novo modelo de exploração de petróleo no país foi desenhado num viés nacionalista, pronto para se encaixar ao discurso de campanha da candidata do presidente Lula à sua sucessão, a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil).
Sai de cena o sistema "privatizante" adotado no governo tucano de Fernando Henrique Cardoso e entra em vigor, uma vez aprovado pelo Congresso, um modelo petista estatizante e tido como estratégico, baseado num tripé:
1) Criação de uma estatal do setor petrolífero; 2) fortalecimento da Petrobras; e 3) montagem de um fundo com a renda do petróleo para investir na educação, no combate à pobreza e na inovação tecnológica.
O aspecto político e estratégico também definiu a Petrobras como a grande vitoriosa no novo modelo. Contestada internamente no início dos estudos, a estatal virou o jogo e saiu como a futura operadora única do pré-sal e dona de pelo menos 30% dos consórcios que irão explorar as reservas.
A decisão levou as petrolíferas internacionais a criticarem reservadamente o sistema, classificando-o de nova versão do monopólio do petróleo no país -flexibilizado por FHC com a abertura da exploração e na comercialização do setor a empresas privadas nacionais e estrangeiras.
Debatida e elaborada dentro do governo há mais de um ano, a nova Lei do Petróleo será divulgada amanhã debaixo de outras duas críticas: falta de transparência na sua elaboração e divulgação de um "propalado" risco zero posto em dúvidas por especialistas.
Ao longo de 14 meses, período de funcionamento da comissão interministerial criada por Lula para mudar a legislação do setor, o governo discutiu praticamente sozinho as mudanças, deixando governadores e empresários de fora.
Além disso, refutou os questionamentos de que superestimou o potencial das reservas para justificar seu discurso de que o pré-sal é um "bilhete premiado". Nesta reta final, o anúncio de dois poços secos perfurados por empresas estrangeiras reacendeu as dúvidas sobre o "risco zero" das novas reservas, argumento usado para justificar a mudança.
Apesar das dúvidas lançadas por especialistas, ninguém contesta a importância do pré-sal. Nas previsões mais pessimistas do governo, as reservas na região, que vai do litoral de Santa Catarina ao do Espírito Santo, devem ficar entre 30 bilhões e 40 bilhões de barris, muito acima das atuais, de 14 bilhões de barris.
Os mais otimistas falam em reservas de 80 bilhões a 100 bilhões. O governo trabalhou com o primeiro número como teto e desenvolveu a maior parte dos seus cenários com uma reserva de 50 bilhões de barris, suficiente para colocar o país entre os maiores produtores de petróleo do mundo.
A despeito dos ataques nessa reta final, o governo espera que o novo marco regulatório do petróleo seja aprovado pelo Congresso e conte com o apoio da população. Motivo: foi elaborado dentro do conceito de incentivar a indústria nacional e investir em dois setores considerados estratégicos: educação e inovação tecnológica.
Além disso, argumentam assessores presidenciais, o modelo do governo Lula não prioriza o curto prazo, e, sim, o médio e o longo prazos, numa estratégia para administrar a riqueza do pré-sal e garantir que ela seja revertida para a população.
Esses assessores lembram que seria muito mais vantajoso para Lula manter o sistema de concessões criado por FHC e seguir com os leilões do pré-sal, o que renderia uma receita elevada imediata aos cofres públicos. Afinal, no modelo atual, ganha o campo quem pagar mais pela concessão.
Lula preferiu cancelar os leilões e desenhar novas regras, pelas quais ficam com os campos do pré-sal as empresas que entregarem à União a maior parte do óleo extraído. Um sistema que começará a render grandes recursos ao governo apenas quando o pré-sal entrar em escala comercial -o que deve ficar para depois de 2015.
Esse argumento é usado pelos governistas para rebater o discurso da oposição de que o novo marco regulatório do setor se resume a uma "plataforma eleitoral" para eleger a ministra Dilma no próximo ano.
Os assessores de Lula não escondem, porém, que desejam destacar as diferenças entre os dois modelos na campanha eleitoral de 2010. O tucano é mais liberal e aberto ao capital estrangeiro; o petista privilegia a Petrobras e mantém sob controle da União o gerenciamento da nova riqueza.


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