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2 - Atingir o ensino básico universal
País alcança meta antes de 2015, mas alunos saem sem domínio elementar de língua portuguesa e matemática
Baixa qualidade compromete alfabetização
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Até 2003, parte dos alunos de
três escolas rurais de Capão Bonito -cidade de 47 mil habitantes
no Vale do Ribeira, uma das regiões mais pobres do Estado de
São Paulo- chegava à quarta série sem saber ler ou escrever, alguns com dificuldades de alfabetização. A partir de 2004, o desempenho desses estudantes, com os
mesmos professores, saltou 18
pontos nas avaliações aplicadas.
"O curso de capacitação de professores provocou uma revolução", analisa a ex-diretora da escola Ana Benta, Eliana Silva, 40.
A "revolução", na verdade, foi
de pequenas modificações na
rotina das escolas, como valorização da participação dos pais, criação de oficinas de leitura, estímulo aos professores para usar
recursos além da lousa e da cartilha e mais trabalhos em grupo.
Resultado de uma parceria com
a Fundação Lemann, que deu o
curso de formação para diretores
-e estes para os professores-,
a iniciativa envolveu 200 escolas
de São Paulo e de Santa Catarina
e beneficiou 100 mil alunos. Agora
o projeto será implantado em
outras cidades e Estados.
Outra experiência nesse sentido
vem da capital paulista. Wesley
Lima, 13, e Marcelo Henrique
Godói, 13, tocam violino; Izabela
Dallmann, 13, violoncelo. Eles
moram no bairro pobre de Cidade Dutra, na zona sul, uma
das áreas mais violentas da cidade, e estudam no CEU (Centro
de Educação Unificada) local.
Ali, graças a uma parceria en-
tre o Instituto Pão de Açúcar, o
banco Santander e a prefeitura,
foi montada uma orquestra com
os alunos, que ensaiam todas
as terças e quintas. Outros três
CEUs participam desse projeto.
Quantidade vs. qualidade
Exemplos como os de Capão
Bonito e Cidade Dutra ilustram
o principal alvo da responsabilidade social das empresas hoje:
educação. "O chamado terceiro
setor faz uma pressão importante
para que as pessoas e as autoridades vejam e tratem a educação
como prioridade", afirma o
representante da Unesco no Brasil, Jorge Werthein, 64. "E educação de qualidade", completa.
O Objetivo do Milênio (ODM)
relacionado à universalização do
acesso à escola será atingido no
país bem antes de 2015, mas só
quantitativamente. A qualidade
de ensino continua baixíssima.
Relatório do Saeb 2001 (Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Básica), do Ministério da
Educação, revela que o país forma
cidadãos semi-analfabetos e que
não dominam nem sequer operações básicas da matemática. A soma de conceitos "muito crítico" e
"crítico" passa dos 52%, na quarta
série, e dos 58%, na oitava. O percentual de "avançado", na quarta
série, foi zero, e 0,1% na oitava.
Entre os alunos de quarta série,
na prova de língua portuguesa,
22,2% não passaram do conceito
mínimo, "muito crítico"; 36,8%
tiveram desempenho "crítico";
36,2%, "intermediário"; 4,4%,
"adequado", e 0,4%, "avançado".
"Isso significa que mais da metade deles [59%] não entendeu
nada da prova e a devolveu em
branco ou rasurada ou entendeu
algo, mas não conseguir montar
uma única frase para responder",
analisou o professor de macroeconomia da PUC-MG Márcio Antônio Salvato, 35, coordenador do
laboratório do Sudeste de acompanhamento de testes do ODM
para o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
Além do Saeb, o Brasil participa
do Pisa (Programa Internacional
para Avaliação do Estudante), sob
a coordenação da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). A
prova tem conceitos de 1 a 5.
Na avaliação da língua, 55,7%
dos brasileiros não passaram do
conceito 1. Apenas 3,1% chegaram no 4; e 0,6%, no 5.
Os mexicanos foram melhores:
6,9% dos alunos chegaram a 4 ou
5, e 44% ficaram abaixo de 1. Os
americanos se destacaram mais:
17,9% não passaram de 1, mas
33,7% alcançaram 4 ou 5.
Segundo o IDH-Educação (Índice de Desenvolvimento Humano específico da área), o Brasil tinha índice 0,745 em 1991 e melhorou um pouco, chegando a 0,849
em 2000. Era o mesmo nível de
Costa Rica, Argélia e Vietnã.
Para 2015, as projeções apontam um IDH de 0,906, próximo
do que já têm hoje Israel e os vizinhos Argentina, Uruguai e Chile.
O índice varia de 0 (nota mais baixa) a 1 (mais alta).
Para piorar, o acesso aos ensinos médio e superior tornam-se
gargalos. A Taxa de Escolaridade
Líquida (percentual da população
estudando no nível de escolaridade de sua idade) no nível fundamental está em torno de 94%.
Mas a Taxa de Escolaridade Líquida no ensino médio despenca
para 40%. E cai para menos de
10% no ensino superior.
Ano da qualidade
Nem o governo nega a situação
do ensino, tanto que o Ministério
da Educação instituiu 2005 como
o ano da qualidade da educação
básica. Entre outras medidas, haverá a troca do Fundef (Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento
da Educação Fundamental e Valorização do Magistério) pelo
Fundeb (Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), que estende financiamentos até o ensino médio. "Com o novo fundo,
cerca de R$ 4 bilhões devem ser
injetados", diz o secretário-executivo do Conselho Nacional de
Educação, Ronaldo Mota.
Além disso, a proposta de
emenda constitucional prevê o
aumento da vinculação de tributos federais à educação dos atuais
18% para 22,5%, em quatro anos.
A Unesco recomenda gastos
anuais de 6% do PIB na educação
(somando recursos federais, estaduais e municipais). "Faz décadas
que o Brasil não atinge o mínimo.
Fica entre 4,5% e 4,6% do PIB. Para pagar a dívida educacional, o
país precisa investir mais", alerta
Werthein.
(EF)
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