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Edgard Alves

Dama e homem nu

A segurança dos Jogos Olímpicos tem lá os seus deslizes; não há nada de inédito nisso

Uma mulher de vermelho invadiu a delegação da Índia e participou do desfile de abertura no Estádio Olímpico de Londres. A delegação espera um pedido de desculpas dos organizadores da competição. A revelação é do jornal londrino "The Times", e imagens do evento registram a misteriosa personagem ao lado do porta-bandeira da delegação, em contraste com as demais mulheres do país, que vestiam amarelo.

Aparentemente banal, o incidente é gravíssimo, pois mostra como a segurança da Olimpíada é vulnerável. Seria patético justificar que se tratava justamente de uma agente de segurança (seria mesmo uma mulher ou um homem disfarçado?).

Mas os ingleses talvez não fiquem constrangidos pela falha, apesar das declarações de que a segurança dos Jogos é a melhor possível. Deslizes desse porte costumam ocorrer.

Comprovo isso com um episódio bizarro. Eu e milhares de pessoas testemunhamos tropeço semelhante na cerimônia de encerramento dos Jogos de 1976, no Estádio Olímpico de Montréal. Foi bizarro. Com a luz ambiente fosca para que holofotes destacassem as bailarinas, em movimento, formando os arcos olímpicos no centro do gramado, os espectadores ficaram boquiabertos quando surgiu entre elas, no ponto iluminado, um homem nu. Conforme as moças faziam evoluções, o peladão dançava, pulava, ora levantando a perna direita ora a esquerda. E conhecia o quadro porque se manteve no foco da luz.

Com aquela cena fora do script, pude ver no monitor da bancada dos jornalistas o narrador oficial incrédulo, com a boca meio aberta, sem saber o que falar, e olhando para os lados em busca de socorro. Alguns segundos mais, e tive uma prova de como a imaginação humana é fértil. Ouvi: "Incrível, só pode ser uma homenagem aos Jogos Olímpicos da Antiguidade, quando os atletas competiam nus. 'Wonderful'!".

Mais alguns segundos, e os seguranças que davam cobertura ao gramado partiram em disparada para dominar e retirar o intruso de cena. Fato grave, levando-se em conta que os Jogos anteriores haviam sido palco do massacre de Munique. Como tudo acabou bem em Montréal, a ousadia do fanfarrão virou uma pitada de humor ao espetáculo.

A segurança de grandes eventos costuma consumir fortunas. Certamente há desperdício, mas é difícil fugir das exigências, muitos dos serviços implicam em sigilo absoluto.

E muitas ações, inclusive as que resultam em sucesso, imagino, nem sequer são divulgadas. O que importa é o resultado final, sem ocorrências de monta, sem nada a registrar, exceto que uma dama de vermelho tenha conseguido a façanha de participar de um evento planetário e saiu de cena discretamente, deixando no ar um perfume olímpico.

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