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Quem ocupa hoje o trono?
CÉSAR LUIS MENOTTI
especial para a Folha
Quando o sol caía sobre a incipiente careca de Alfredo Di
Stéfano, apontando o ocaso de
um grandíssimo jogador de futebol, todo-senhor das duas
áreas e um verdadeiro ícone, já
aparecia a explosiva, genial e
incomparável figura morena
de Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, que mostrou ao
mundo que com samba e magia se podia jogar em toda a extensão do campo.
Quando Pelé se despedia do
mundo e parecia que todos íamos ficar órfãos do bom futebol, quando pegava seus últimos saltos, dava seus últimos
passes mágicos no Cosmos, já
ingressava no cenário um senhor que, desde Amsterdã, dizia que, no futebol, sempre outra coisa era possível.
Magro, alto, pernas longas, só
lhe faltava a oportunidade para escandalizar os senhores da
repressão e das armadilhas,
impondo sua canhota larga,
precisa e elegante.
Sua maneira de pairar no
gramado, seu jeito de ver tudo e
indicar a partir de onde se ataca, em equipe, e não individualmente, sua capacidade de
observar todos os pontos do
campo, sem dúvida, o fizeram
distinto. Um verdadeiro rei.
Johan Cruyff foi o piso a partir do qual o futebol holandês,
sem ganhar um só título, com
somente uma Eurocopa em
suas vitrines, nos ensinou que
se perde uma partida, sim, mas
apenas isso. Jamais se perde a
história.
O futebol holandês deixou
para sempre o ensinamento de
que, se se vence, também se podem, além de obter glórias e títulos, respeitar símbolos e valores próprios de um povo.
Mais tarde, um menino moreno, com sorriso de gnomo e a
força que só os grandes têm, irrompia o firmamento do futebol. Levava em seus pés a tradição de lendários jogadores argentinos, como José Manuel
Moreno, Adolfo Pedernera,
Orestes Omar Corbata ou René
Housseman.
Diego Maradona completava
esse pôquer de distintos, de geniais, de incomparáveis.
Hoje, cabe uma pergunta, em
meio a este futebol pós-moderno que faz do resultado e do
utilitarismo todo um culto. Por
que não há um sucessor? O último Mundial foi patético. Muitos pensaram que seria Ronaldinho, mas a história foi outra,
e todos conhecem seu final.
Por que, perguntam os que
conservam utopias, não há um
seguidor desses quatro grandes? Pessoalmente, tenho algumas opiniões sobre a incógnita.
Em primeiro lugar, já não
existe aquele futebol espontâneo e fresco das ruas. Para uma
infinidade de pós-modernos,
isso é antigo, malvisto e não
deixa nenhuma lição.
Eu posso dizer a esses burocratas do futebol que não somente estão no comando do esporte, como também apregoam
desde os grandes meios de comunicação, que essa foi a primeira escola desses grandes.
Esses quatro grandes sabiam
tudo, e o que não sabiam inventavam. Mas, além disso, tinham a coragem de levar seu
jogo até as últimas consequências. Hoje, o risco e a aventura
aparecem como uma coisa fora
de lugar. A especulação e a violência de um jogador contra
outro ganham cada dia mais
terreno.
Apesar disso, conservo intimamente a esperança de que
apareça aquele que ocupe o
trono vago. Oxalá possamos
vê-lo antes de 2002.
˛
César Luis Menotti, técnico argentino de futebol, foi campeão mundial em 1978
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