São Paulo, Quarta-feira, 01 de Dezembro de 1999


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TOSTÃO
Sonho adiado

Pela quarta vez consecutiva (Grêmio, Cruzeiro e Vasco também foram finalistas), um time brasileiro perde o Mundial interclubes.
Marcos, o melhor jogador do Palmeiras durante todo o ano, falhou no gol do Manchester United.
O Palmeiras se preparou corretamente para este jogo, atuou melhor do que eu esperava, pressionou sem deixar sua defesa desprotegida, criou mais oportunidades de gol, mas falhou nas finalizações. Júnior foi o destaque do time.
O Manchester ganhou seu quarto título na temporada: campeão do Inglês, da Copa da Inglaterra, europeu e mundial. A equipe teve mais tranquilidade, confirmou sua experiência, mas mostrou também as deficiências de sua defesa, lenta e facilmente driblada pelos brasileiros. O goleiro Mark Bosnich foi o melhor do jogo.
Mesmo considerando que o Palmeiras foi melhor, o Brasil perdeu outro título internacional. O fato confirma as evidências, que não querem enxergar, de que o futebol brasileiro está entre os melhores do mundo, mas não é o melhor.
O Brasil só voltará a ganhar títulos com mais frequência quando tiver mais equilíbrio emocional e perder a auto-suficiência e o ufanismo.

Pênalti não é loteria

Uma boa cobrança de pênalti depende da técnica e treino do batedor, de seu equilíbrio emocional (a responsabilidade do cobrador é maior), da qualidade, do tamanho e elasticidade do goleiro e também da sorte.
Está evidente que um jogador que perde um pênalti numa partida não deve bater outro, mesmo se for experiente e tiver, como Raí, uma ótima média de aproveitamento.
A obrigação de reparar seu erro faz com que ele tenha menos tranqüilidade que na primeira cobrança. Se o Raí batesse o terceiro, provavelmente perderia, igualando o recorde do jogador argentino Palermo, que perdeu três pênaltis contra a Colômbia, na Copa América. Será uma falta de bom senso escalar o Raí novamente para cobrar na próxima partida.
Dida defendeu três dos nove pênaltis no Corinthians. Na seleção, defendeu quatro pênaltis. Em outra oportunidade, porém, Dida rebateu, e um mexicano marcou. Qual o segredo do Dida na defesa dos pênaltis?
Ele escolhe um canto, e, antes da partida da bola, dá um passo à frente (o que é ilegal) e, com impulso e favorecido por seu tamanho, consegue saltar e fechar todo um lado do gol.
Se tivesse esperado o chute para pular, seria impossível defendê-lo, mesmo o chute não sendo forte. A solução é chutar alto, forte e no outro canto.
A escolha do canto certo parece sorte, como o próprio Dida disse, mas é uma intuição, um saber inconsciente, influenciado pela posição do corpo do batedor. Como ele sabe? Sabendo. Ele sabe, mas não sabe que sabe. Existe um saber que foge à compreensão humana.

Defesa e ataque

Corinthians e São Paulo confirmaram, domingo, a excelente qualidade de seus ataques e a fraqueza de suas defesas.
O sistema defensivo do Vitória falhou na goleada contra o Atlético-MG. O Galo só melhorou no campeonato depois que arrumou sua defesa. Cláudio Caçapa, um dos jogadores mais fracos no início, é hoje um dos destaques do time.
Vitória e Atlético-MG também têm ótimos atacantes (Tuta, Guilherme, Marques etc.).
O Cruzeiro caiu fora cedo porque sua defesa falhou muito, em todo o torneio. Tomou dez gols nos últimos três jogos, e o Vasco levou 11, nos quatro últimos. O Flamengo, então, nem se fala. Sem comentários.
Por que as defesas dos times brasileiros estão tão ruins e os ataques tão bons? Será pela qualidade dos jogadores, ou porque os times jogam muito ofensivamente? Penso que as duas hipóteses estão certas.
Em outras épocas, o futebol brasileiro era muito ofensivo. Defender era uma opção dos cabeças-de-bagre, dos violentos e por falta de criatividade. Jogador bom, com algumas exceções, era atacante.
Depois da Copa de 94, em que o Brasil deu show de eficiência na defesa (por isto aquela seleção não é valorizada) ocorreu uma transformação no país. Todos os times passaram a jogar na defesa, atrair o rival e explorar o contra-ataque. Confundiram defender bem (que é também uma arte) com defensivismo. O futebol tornou-se feio, aumentaram os empates e os torcedores sumiram dos estádios.
Nos últimos anos, após a vitória passar a valer três pontos, os times voltaram a jogar no ataque, pressionar o adversário e valorizar os jogadores habilidosos no meio-campo.
Os ataques de novo melhoraram e as defesas pioraram. Organizar um bom sistema defensivo com muitos jogadores é fácil, nem é preciso treinar.
O difícil é ter uma boa defesa jogando ofensivamente. Os técnicos não perceberam que quanto mais se ataca, mais se precisa treinar a defesa.
A postura ofensiva não explica a deficiência individual de nossos defensores. De qualquer forma, é preciso atingir o equilíbrio. O mito de que a melhor defesa é o ataque já era.


Tostão escreve às quartas-feiras e aos domingos

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