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FUTEBOL
Seda chinesa
JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA
Caro leitor, aposto que há
vezes em que você nem passa
os olhos por estas páginas esportivas. Ou, se passa, dá apenas uma
olhada rápida nas notícias sobre
seu time. Aposto que há dias em
que você acorda um tanto mais
sério e prefere ler o Clóvis Rossi, os
editoriais, e os últimos acontecimentos no Brasil e no mundo. No
dia do atentado ao WTC, por
exemplo, só um fanático procuraria saber se o seu zagueiro tinha
recebido o terceiro cartão amarelo. O esporte, nestes dias, fica relegado à sua desimportância.
Pois confesso que comigo se dá o
mesmo. Há dias em que tanta coisa acontece no planeta que nem
quero saber de futebol. Porém minha obrigação é falar sobre o esporte bretão e não há como fugir
desta camisa-de-força (uma camisa-de-força macia e confortável, de seda chinesa). Mas nem sei
porque comecei este texto assim.
Vamos à rodada:
No sábado, tivemos uma partida interessante em São Januário.
Depois de tomar o primeiro gol, o
Vasco partiu para cima do Santos
assim como os tanques israelenses
foram brutalmente para cima do
quartel-general de Iasser Arafat.
O cerco foi terrível, e o Santos,
acuado na defesa, não teve como
sair para o jogo. Tal qual os palestinos, o time viveu de contra-ataques esporádicos contra a maior
força do exército inimigo. Outra
coincidência é que, assim como
Eurico Miranda proíbe jornalistas em seu bunker, Ariel Sharon
também decretou que Ramalah é
uma zona militar fechada, e expulsou a imprensa. No final das
contas aconteceu o previsível e
justo empate, onde os dois saíram
perdendo. Ou os quatro.
Já Guarani e Ponte Preta tiveram resultados chochos (uma
derrota para o Palmeiras e um
empate com o Bangu) e agora disputam a última colocação entre
os paulistas. Ambos começaram o
campeonato muito bem, com um
discurso de renovação e eficiência. Porém, com o passar do tempo, viu-se que não eram tão renovados e eficientes assim. Mais ou
menos como o governo, que começou seu primeiro mandato trazendo otimismo, mas que conseguiu, nestes sete anos, um crescimento do PIB de apenas 1,03% ao
ano, número que o deixa abaixo
de Itamar e, até, de Sarney.
Mas o grande clássico foi mesmo entre Corinthians e São Paulo. O jogo me lembrou a invasão
da fazenda dos filhos do presidente Fernando Henrique pelo MST.
No caso, o estádio Farazão seria a
fazenda Córrego da Ponte e os
sem-terra seriam os atacantes corintianos, que entraram por ali
sem o menor respeito e fizeram
uma grande festa, marcando 1 a 0
no primeiro tempo.
Porém, logo veio a vingança,
com o tricolor empatando a partida. Mais ou menos como a Polícia
Federal fez com os sem-terra, algemando os 16 líderes e obrigando-os a deitar no chão, mesmo
depois de invasores e representantes do governo terem acertado
um fim pacífico para o problema.
Aliás, as revistas semanais pouca
importância deram a este detalhe
(exceção feita a "Isto É" e "Carta
Capital"), preferindo apenas
mostrar sua indignação pelo fato
de os sem-terra terem sentado no
sofá presidencial.
No fim dos dois confrontos campais, tanto Corinthians quanto
MST conseguiram reverter um
quadro negativo. O MST voltou
às manchetes. O Corinthians,
com os dois gols do meia Renato,
garantiu-se nas semifinais do
Torneio Rio-São Paulo.
Enfim, tudo são jogos, tudo são
notícias.
Eletricidade
Quem se saiu bem na rodada
foi o São Caetano, que se beneficiou da própria vitória e
das derrotas e empates dos
concorrentes. Mais ou menos
como as distribuidoras de
energia, que aumentaram
suas tarifas na época do apagão (a título de indenização
pela diminuição do consumo), mas não reduziram seus
preços quando acabou o racionamento, e ainda estão às
vésperas de outro aumento.
Unita
Mais feliz que o povo angolano, que finalmente verá a paz
entre o governo e a Unita, está a torcida do América, que
conseguiu sua primeira vitória no Rio-SP e já sonha em
escapar do rebaixamento.
Dólar
Mais desvalorizado que o peso, só o Fla, que continua
caindo pelas tabelas de pontuação. Do jeito que está, só
tocando um tango argentino.
E-mail torero@uol.com.br
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