São Paulo, quinta-feira, 02 de agosto de 2007

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"Corri muito", relata cubano desertor

Rafael Capote, que pode atuar nos Jogos Abertos por São Caetano, diz ter fugido da Vila do Pan por baixo de uma cerca

Primeira baixa de seu país nos Jogos do Rio, jogador da seleção de handebol afirma que a saudade da terra natal será superada com o tempo

RENAN CACIOLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando Rafael Capote se viu sozinho no meio da Vila Pan-Americana, no Rio, foi a senha para uma fuga cinematográfica que começou no dia 11 como um grande susto e encontra-se agora bem perto de um sonho.
O jovem armador da seleção cubana de handebol, 19, foi o primeiro atleta do país a desertar nos Jogos. Depois dele, dois dos principais boxeadores do país seguiriam trilha parecida, mas com destino à Alemanha.
Capote não foi tão longe. Seu paradeiro: São Caetano do Sul, na Grande São Paulo. Assim como os colegas do boxe, tinha em mente o objetivo que os faz utilizar algumas das principais competições ao redor do mundo como portas de saída.
"Podia seguir em Cuba. Mas sei que tenho talento para jogar aqui [Brasil] ou na Europa. Posso melhorar de vida em outro país", disse à Folha o jogador, que acabou adotado pelo Imes-Santa Maria/São Caetano.
O clube já tem um atleta com trajetória igual à de Capote. O goleiro Michel, ex-companheiro de seleção, aproveitou uma série de amistosos que o país veio fazer no Brasil em dezembro de 2005 para escapar da delegação e nunca mais voltar.
"Fazia algum tempo que eu pensava em vir para o Brasil. Conversava com o Michel pela internet sobre a possibilidade de jogar aqui. Ele falou que não tinha problema e que iria me ajudar", explicou o atleta.
Foi Michel, via MSN, quem deu as coordenadas sobre o que Capote deveria fazer quando estivesse em solo carioca.
Na noite do dia 11, Capote relata que chovia muito e que a maior parte da delegação de Cuba -inclusive os seguranças responsáveis por vigiar possíveis desertores- estava em seus quartos na Vila.
"Aproveitei e fugi por debaixo de uma cerca. E corri. Corri muito", afirmou ele.
A essa altura, ele sabia que precisava chegar à rodoviária da cidade e pegar algum ônibus com destino a São Paulo.
"Falei com um motorista, e ele disse que, àquela hora [segundo ele, por volta das 23h], o mais seguro seria um táxi."
Capote pagou US$ 300 (R$ 565) para ir até a casa onde Michel mora, em São Caetano. Chegou às 6h do dia seguinte. Dias depois, com a notícia já correndo -a Folha revelara a deserção no dia 14-, ficou assustado e teve a ajuda dos companheiros do time do ABC para se isolar no interior de SP. Ficou duas semanas em Itapira (176 km da capital), alojado na casa de um dos colegas.
Capote só voltou a São Caetano nesta semana, quando teve certeza de que a delegação cubana não estava mais à sua procura. Ontem, já com o uniforme da equipe da cidade, estava no banco de reservas, à espera de uma chance no amistoso que a equipe fazia contra a seleção brasileira juvenil.
"Ele tem muita competência. Voltou pra cá, está atrás da legalização e vai trabalhar com a gente", disse o técnico do São Caetano, Washington Nunes.
Como o time já conta com dois atletas estrangeiros -o limite para o Paulista e o Nacional-, Capote não pode jogar.
Mas Nunes admitiu a hipótese de utilizá-lo nos Jogos Abertos do Interior, entre os dias 15 e 28 de outubro, em Praia Grande, litoral sul de São Paulo. "A gente conversou com a direção do clube, e resolveram ajudar. Ele vai ter uma casa para morar e vai treinar aqui."
Ontem, o cubano foi à Polícia Federal dar entrada na documentação para, posteriormente, pedir asilo político no Brasil.
Tímido, Capote tem o olhar distante e não é de muitas palavras. Quando comenta sobre Cuba, prefere não fazer críticas. Mas não esconde a apreensão com o que as pessoas andam falando sobre ele no país.
"Isso [deserção] não agrada muito ao nosso governo. Chamam a gente de traidor."
Saudade da terra natal? "É estranho, porque vivi 19 anos lá. Mas é só uma questão de tempo", disse ele, que só ligou para casa e contou o fato quando já estava bem longe do Rio.


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