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FUTEBOL
Os profissionais também amam
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Dois jogadores saíram do
jogo Palmeiras 2 x 1 Botafogo condenados por suas torcidas,
mas por crimes opostos.
Se os palmeirenses condenaram
Dodô por não amar o bastante a
camisa alviverde, os botafoguenses condenaram Galeano por
amá-la demais, mesmo depois de
ter mudado de clube.
O suposto "corpo mole" de Dodô é algo impossível de ser aferido
de modo objetivo, mas não dá para negar que seu comportamento
em campo contrasta com a correria desenfreada (e muitas vezes
descerebrada) de companheiros
como Muñoz e Nenê. Talvez seja
só uma questão de estilo, mas o
torcedor não perdoa.
Quanto a Galeano, não tenho
dúvida de que ele queria converter em gol o pênalti que bateu.
Se iria comemorá-lo ou não, é
outra história. Mas o fato é que,
desde Freud, sabemos que o homem não faz apenas aquilo que
deseja conscientemente. Muitas
vezes faz o contrário, por razões
insuspeitadas.
Talvez, em algum desvão do inconsciente, Galeano tenha sentido o peso de tantos anos no Parque Antarctica, de tantas partidas jogadas com a camisa verde.
Somente os levianos e os insensíveis trocam com muita facilidade
sua segunda pele.
O episódio ganhou dimensões
maiores pelo fato de Galeano ter
declarado dias antes que, se por
acaso marcasse um gol em seu ex-time, não o comemoraria, a
exemplo do que o são-paulino
Reinaldo fez contra o Flamengo.
Considerar mera frescura esse
negócio de não comemorar gol é
ter uma visão demasiado fria e
"profissional" (no mau sentido)
do futebol. Posso ser um otário,
mas acho bonito quando determinados valores de lealdade e
paixão sobrevivem, ainda que
simbolicamente, no mundo tão
mercantilizado do esporte.
Reinaldo foi, ao mesmo tempo,
profissional (ao fazer dois gols
contra seu antigo clube) e fiel a
seus sentimentos (ao não comemorá-los).
Já o pênalti perdido por Galeano me lembrou de um episódio semelhante vivido por Edmundo,
que foi demitido do Cruzeiro depois de desperdiçar uma penalidade contra o clube do seu coração, o Vasco, em São Januário.
No caso de Edmundo, alegou-se
"justa causa" para a demissão
porque o atacante tinha declarado, antes do jogo, que não gostaria de marcar contra o Vasco.
No caso de Galeano, fez-se um
enorme barulho só porque o volante disse que, se marcasse, não
comemoraria.
São coisas bem diferentes, mas
ambas mostram que o melhor,
nesses casos, é o jogador não dizer
nada antes da hora. Seu profissionalismo e seu amor à camisa
(tanto à nova quanto à antiga) se
demonstram em silêncio, ali dentro das quatro linhas.
Releio os parágrafos acima e vejo que ficaram um tanto sisudos.
Muito mais divertida foi a reação da torcida palmeirense, que
depois do pênalti perdido gritou
em coro: "Uh, Galeano, uh, Galeano", como se ainda saudasse
um dos seus.
Para encerrar o assunto Palmeiras, pelo menos por hoje, devo
corrigir, a pedido de Levir Culpi,
uma afirmação que fiz aqui sábado passado. Segundo o treinador,
ele nunca cogitou convidar o deputado Enéas para dar uma palestra no clube, embora o considere "um homem inteligente".
De ponta-cabeça 1
Ao concentrar nas últimas
rodadas vários jogos entre
forças tradicionais, os organizadores do Brasileirão certamente esperavam que viessem a ser confrontos pelas
primeiras colocações. Ironicamente, estão sendo brigas
de foice para fugir do rebaixamento. Neste fim de semana são dois os "jogos da morte": Flamengo x Botafogo e
Vasco x Palmeiras. A ponta
de baixo da tabela está mais
emocionante que a de cima.
De ponta-cabeça 2
No início do campeonato, alguns afoitos disseram que o
São Paulo era "o Real Madrid
do Brasil". Depois de alguns
tropeços do time, outros afoitos disseram que o tricolor
era só papo-furado. A ironia,
no caso, é que o Real verdadeiro não vence há cinco partidas, e o São Paulo está ganhando todas. Hoje é o Real
Madrid que gostaria de ser "o
São Paulo da Espanha".
E-mail jgcouto@uol.com.br
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