São Paulo, terça-feira, 03 de agosto de 2004

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BASQUETE

Despertador

MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE

Como todo mundo, nós, basqueteiros, gostamos de dormir em paz com nossas opiniões, nossa realidade. Talvez por conta disso, porque isso nos reconforta, satélites cansados da órbita inercial, rezamos para o avanço global do esporte nos últimos anos. "Caiu o Muro de Berlim das quadras!" "Não há mais bobo no basquete!" "O império americano ruiu!" "Estamos aí!"
Não pretendo aqui arruinar o sono de ninguém. De fato, a periferia aprendeu um bocado desde que David Stern e seus marqueteiros ligaram a máquina NBA de espremer suco de bolas laranjas. Prova disso foi o desempenho dos EUA no Mundial de Indianápolis-02, quando os anfitriões, constrangidos, viram sérvios, argentinos e alemães no pódio.
Mas não custa ficar acordado um pouco mais e, antes de abraçar o travesseiro, lembrar que, ávida por novos mercados e ciosa de sua matéria-prima (o basquete), a liga profissional norte-americana não só não se preocupa como é a primeira a divulgar/comemorar que o planeta todo "aprendeu a jogar". Hummm...
O "Dream Team" nasceu de um plano comercial, e não, como a maioria ainda crê, do diagnóstico dos EUA de que urgia retomar a hegemonia técnica após os reveses na Olimpíada-88 e no Pan-87.
A verdadeira revolução nesses 15, 20 anos ocorreu dentro da NBA, e não fora dela. A receita operacional do campeonato foi de US$ 118 milhões a US$ 3 bilhões por ano. O faturamento bruto com o licenciamento de produtos saltou de US$ 10 milhões para outros US$ 3 bilhões anuais. O valor médio de uma equipe pulou de US$ 15 milhões para US$ 300 milhões. Em 2004, os direitos de TV renderão US$ 733 milhões, 13.000% a mais do que em 1984 -isso sem considerar os contratos internacionais.
É nesse ambiente zilionário que os astros de basquete se reproduzem. Empanturrados, eles não se importam mais com Jogos Olímpicos, Mundiais etc. Não à toa, ao menos 14 rejeitaram a convocação (ou melhor, convite) para Atenas. Fica estranho, portanto, falar em paridade quando os craques nem se dignam a competir.
O senso comum é de que a potência foi forçada a recorrer aos veteranos profissionais para evitar vexames internacionais. Mas basta conferir o grupo que buscará o ouro na Grécia. Ele tem 23,6 anos de idade em média, quase seis anos a menos do que seus adversários diretos.
Entre os olímpicos, figuram novatos como Dwayne Wade, LeBron James, Carmelo Anthony, Amaré Stoudemire e Emeka Okafor. Todos estariam hoje na faculdade não tivessem sido fisgados cedo pelos contratos da NBA.
Ou seja, passados 16 anos do bronze em Seul-88, os EUA mantêm uma seleção "universitária" capaz de lidar com o mundo.
Interessante: no comando dela, estará o treinador mais "didático" da NBA, Larry Brown.
Interessante, também: os garotos entrarão em ação justamente no 20º aniversário da Olimpíada de Los Angeles, o evento que despertou o mundo para Michael Jordan (e para a Nike), um alarme que não parou de tocar.

Sonho 1
Faltam um chutador de três pontos e um armador menos apoplético que Stephon Marbury. Tim Duncan, único pivô legítimo, está sobrecarregado. A seleção reuniu-se há oito dias. Ainda assim, é favorita.

Sonho 2
A Argentina treinou pouco e não mostra o apetite do Mundial. Embora conte com um grupo coeso e bem treinado, a Sérvia não terá sua estrela (Peja Stojakovic). A Espanha ascendeu, mas não assusta. É da Lituânia, de Jasikevicius e Macijauskas, que parte a maior ameaça à invencibilidade de 50 partidas olímpicas/pré-olímpicas dos EUA.

Sonho 3
A CBB encaixou Lula na Vila Olímpica para fazer intercâmbio. Afe.

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