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TOSTÃO
Sonho de criança
Naquele dia, novamente, nada tinha dado certo. Por mais
que tentasse, se esforçasse em
campo, o passe, o drible em velocidade e a finalização para o
gol não acontecia, como em
outros tempos. Estava sem inspiração, pesado e cansado. Algo estava errado, e era preciso
descobrir os motivos.
Conversou com seu melhor
amigo, com o técnico, a namorada, os empresários e com
pais-de-santo. Todos disseram a
mesma coisa: "É a
fase ruim". Ele pensou: "Esta fase não
estaria muito longa?".
Estava indignado com as críticas a
seu respeito. Diziam que ele treinava pouco e que
só pensava em
marketing, comerciais, em viajar e
namorar. Ele queria, mas não
conseguia cancelar os compromissos fora dos gramados. Eles
aumentaram e se tornaram
maiores do que seu desejo.
O jogador era a atração e
precisava sorrir em todos os lugares. Além disso, era bom ajudar as crianças pobres e, ao
mesmo tempo, estar próximo
da riqueza, do glamour e das
pessoas importantes. A alma
humana é ambivalente e contraditória.
Preocupados com suas más
atuações, aconselharam-no a
procurar um psicólogo. Não tinha coragem. O que iriam pensar dele? Seria o reconhecimento de sua fraqueza. Diriam que
ele não é um super-homem, como teriam sido Pelé, Michael
Jordan e outros astros.
À noite, sentiu um enorme
vazio, um frio na barriga, na
espinha, seu coração disparou,
as mãos e a testa pingavam de
suor, todo o corpo tremia, e teve a sensação de que iria desmaiar.
Talvez, a ausência e a perda
dos sentidos fossem uma fuga
para seus conflitos. "Não teria
sido isso o que acontecera na final da Copa do Mundo?", ele
pensou. Quis chamar um médico, mas desistiu após tomar
um copo d'água com açúcar e
ficar mais calmo.
Continuou se
questionando, com
a cabeça no travesseiro: "De que
adianta ter uma
Ferrari, vestir Armani, ser rico, famoso, alegrar e dar dinheiro para as
crianças infelizes de
Kosovo se não estou
fazendo gols e me
sentindo bem? Seria
possível ser tão famoso e feliz ao mesmo tempo, ou era esse o preço
que teria que pagar?".
Dormiu e sonhou com sua infância e que corria com outros
garotos, atrás de balas e brinquedos, com os gols que fazia,
driblando todos os meninos do
outro time, e, por último, sonhou que sonhara em se tornar
o melhor jogador do mundo.
Acordou e percebeu que todas as belas jogadas que tinha
realizado em sua carreira
eram uma repetição do que já
tinha feito em São Cristóvão. A
diferença é que, no subúrbio do
Rio de Janeiro, a alegria e a
descontração eram mais naturais e verdadeiras.
Precisava recuperá-las. Estava mais aliviado, e a vida continuava. Nesta semana, em
que iria jogar contra a Holanda, pela seleção brasileira, repetiu que voltaria a ser o melhor jogador do mundo.
Festa no futebol
Hoje é dia de festa no futebol
brasileiro, que tem vários clássicos estaduais: Palmeiras x
São Paulo; Vasco x Flamengo e
Cruzeiro x Atlético-MG.
Além da rivalidade local, que
sacode as paixões dos torcedores, serão partidas importantes
na disputa pela classificação.
Todas as seis equipes estão entre as oito mais bem colocadas.
O Atlético-MG, animado
com a belíssima vitória sobre o
Flamengo, ganhou mais confiança para a partida de hoje.
O ataque do Galo está muito
perigoso, com o veloz e habilidoso Marques pela esquerda, o
bom passe de Adriano pela direita e a finalização do artilheiro Guilherme. O Cruzeiro,
apesar da boa campanha, foi
goleado por 4 a 1 pelo Vitória, e
sua torcida não vai admitir
uma nova derrota, principalmente para seu maior rival.
Vasco e Flamengo perderam
na quarta-feira, jogaram mal,
e outro resultado negativo colocará suas classificações em
perigo. O Mengo continua deficiente nas bolas cruzadas em
sua área. O Vasco, quando joga em São Januário, pressiona
o adversário, incentivado pela
sua torcida, e usa o contra-ataque quando atua no campo do
outro time. No Maracanã, um
campo mais neutro, o time carioca ficou indeciso, contra o
São Paulo, sobre qual postura
adotaria no gramado. E, contra o Flamengo, como o time
vai se comportar?
O Palmeiras está muito bem,
mesmo com a fragilidade de
sua defesa, desde o ano passado. O São Paulo nunca empata. Por esse motivo, é elogiado
ou criticado. Se conseguir uma
regularidade, chegará entre os
primeiros, já que é melhor vencer uma do que empatar duas,
ou até três partidas, por causa
do critério de desempate.
Como todas as equipes estão
bem classificadas, não existem
favoritas. Espero que este domingo seja sem violência, dentro e fora de campo. Estádio de
futebol é local de lazer, e não
uma praça de guerra.
Todos os dias, aprendemos
que um jogador, um técnico e
uma equipe e seu esquema tático devem ser avaliados pela
média de suas atuações e, no
mínimo, por uma temporada.
Tostão escreve aos domingos e às quartas-feiras
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