São Paulo, terça-feira, 04 de maio de 2010

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PAUL DOYLE

O esporte favorito dos ingleses


Por melhor que esteja o futebol, a torcida local sempre acha motivo para fazer o que mais gosta: resmungar


ENTRE OS esportes nacionais da Inglaterra, o futebol não passa do segundo lugar. O líder absoluto é resmungar. Por isso não surpreende que, embora o campeão da Premier League só venha a ser decidido no último dia da competição e a batalha pela última vaga na Champions League esteja emocionante, a sensação que prevalece é a de uma temporada insatisfatória.
O que, é claro, é extremamente satisfatório, ao menos para aqueles que percebem o paradoxo dos ingleses: a mais doce das recompensas é aquela que se pode saborear mas também condenar com amargura (é por isso que eles bebem tanta cerveja -uma festa não é realmente divertida se você não acordar no dia seguinte com uma ressaca colossal da qual possa resmungar).
Os lamurientos deste ano alegam que, embora a disputa da Premier League tenha sido árdua, a qualidade do futebol foi inferior à do passado. A ausência de times ingleses nas semifinais da Champions League pela primeira vez em seis anos seria prova disso. Tal interpretação é um equívoco. Na verdade, os tropeços europeus de equipes inglesas ressaltam a força da liga nacional.
Sir Alex Ferguson costumava lamentar a fraqueza da Premier League nos anos 90, alegando que o Manchester United ia mal na Europa porque jogava com tão poucos times bons em seu país que estava sempre despreparado para enfrentar as fortes equipes do continente.
Agora a situação se inverteu -os quatro representantes da Inglaterra na Champions League foram prejudicados pela competitividade cada vez mais intensa da Premier League.
A ascensão de times como Manchester City, Tottenham Hotspur, Aston Villa, Everton e Fulham significa que as equipes inglesas têm muito menos jogos fáceis a enfrentar. A intensidade da Premier League pode significar que os times não tenham mais condições de revezar jogadores, o que resulta em número sem precedentes de lesões.
O Manchester United, por exemplo, teve de enfrentar o Bayern com Wayne Rooney baleado, e o Chelsea jogou meses sem Ashley Cole e Ricardo Carvalho, seus melhores zagueiros, bem como sem o cérebro do meio-campo, Essien. O Arsenal teve tantos desfalques que parece que o canhão que adorna sua camisa andou disparando contra o time.
Caso o Chelsea vença o Wigan no domingo, chegará aos 86 pontos. A última vez que esse total foi o bastante para vencer o campeonato foi em 2003 -também o último ano em que não houve times ingleses nas semifinais da Champions League.
É apropriado que os rivais de United e Chelsea na rodada final sejam Stoke e Wigan, pois esses times destacam outra das virtudes da Premier League: sua riqueza tática cada vez maior. Os comandados de Tony Pulis no Stoke são guerreiros medievais que arremessam pedras incansavelmente contra a área adversária, como se esta fosse um castelo fortificado. Roberto Martinez fez do Wigan equipe de estilo atraente, embora frágil, que troca passes com o entusiasmo de meninas que fazem belas guirlandas de flores.
Entre esses dois extremos, há 18 times bastante diferenciados. Um dos motivos para que Carlo Ancelotti pareça capaz de triunfar em um posto no qual Phil Scolari fracassou é que o italiano foi mais capaz de adaptar seu time aos distintos desafios criados por esses oponentes.


PAUL DOYLE é redator-chefe de futebol do jornal britânico "The Guardian". Tradução de PAULO MIGLIACCI


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