|
Texto Anterior | Índice
FÁBIO SEIXAS
Cordeiro à brasileira
Massa parece ter aprendido com o exemplo de Barrichello de que não adianta chiar,
mas parece sonhar como ele
SE MASSA teria condições de
vencer em Hockenheim é conversa de boteco. Sim, ele andou
perto de Schumacher o tempo todo
e quase ficou à frente após o primeiro pit. Mas o alemão não tinha motivos para sair desembestado, acelerando, forçando motor, fritando
pneus.
Ao contrário. Ciente de que tinha
atrás de si um inofensivo, controlou
o ritmo. Estivessem Alonso ou Raikkonen em segundo, seria diferente
-só para citar o primeiro pit, imporia suas célebres voltas voadoras para tentar abrir alguma folga.
Isso tudo é conhecido. É público e
notório. O aspecto especulativo, botequeiro, da conversa fica por conta
de Massa. Ele alcançaria Schumacher? Faria a ultrapassagem na pista? Conseguiria passar no pit?
Não sabemos. Massa nunca foi
visto pilotando um carro de ponta
com licença para vencer. Das 12 etapas até agora, Schumacher só abandonou na Austrália, logo um GP em
que o brasileiro bateu na largada.
Aos fatos, pois. A Ferrari tem todo
o direito de exigir o que bem entender de seus pilotos, mesmo que isso
fira o puritanismo e a ética do esporte, princípios que a própria FIA colocou no museu ao deixar impune a
marmelada de 2002.
O que é esquisito é alguém aceitar
tudo, abdicar do direito de vencer,
inalienável até para o pior piloto da
pior equipe do grid. O que é curioso e
merece reflexão é que os dois últimos a fazerem-no sejam brasileiros.
Barrichello tinha a ilusão inicial
de que superaria o contrato na pista.
Num segundo momento, delirou
com a idéia de que, agradando a escuderia, seria alçado a primeiro piloto quando Schumacher parasse.
Se Massa alguma vez sofreu da
primeira ilusão, não falou aos jornais nem choramingou ao Louro José -pelo menos para isso serviu a
experiência do antecessor. Mas ele
tem martelado na cabeça, o tempo
todo, a segunda possibilidade.
Mais uma vez, aos fatos. Com um
incerto amanhã em mente, como o
Barrichello dos últimos anos, Massa
se comporta na pista exatamente
como o Barrichello dos últimos
anos. Na largada em Hockenheim,
fez força para não ultrapassar o alemão. Na saída do tal pit stop, deixou
a impressão de que frearia se o companheiro demorasse.
E ninguém acha estranho.
Talvez fruto da anestesia recente.
Talvez porque Massa conte com a
paciência (ou indiferença?) da torcida. Talvez reflexo da simpatia do microfone global. Ou talvez porque, como no prefácio de Olavo Bilac em
"Lendas e Tradições Brasileiras", de
Affonso Arinos, resgatado ontem
nesta Folha por Clóvis Rossi, sejamos mesmo um povo "dócil e resignado".
Na F-1, esse mundinho sem importância em meio às mazelas do
país, não éramos assim.
Daí tanto fascínio no passado.
Mas não resistimos à vocação, ser
cordeiro já se tornou normal.
Povo marcado, povo feliz.
RARIDADE 1
Como de hábito, os pilotos reclamarão hoje de sujeira na pista.
Uma prova de como Hungaroring
nunca é usado? No ano passado, esqueci um adaptador na tomada da
sala de imprensa. Ontem cheguei,
sentei-me no mesmo lugar. E lá estava meu velho adaptador.
RARIDADE 2
À pergunta sobre sua eventual
vantagem no duelo por vaga contra
Villeneuve, Kubica não pestanejou.
"O ritmo." Pode ser mais um engano, mas este polonês, dentro e fora
da pista, parece ser especial.
RARIDADE 3
Tracy e Tagliani se engalfinharam em San Jose e foram punidos.
As cenas da pancadaria estão no
www.youtube.com, é só digitar os
nomes. Folclore à parte, o veterano
deveria ser proibido de correr depois do que fez na pista.
fseixas@folhasp.com.br
Texto Anterior: Perfil: Título deu vaga na F-1 Índice
|