São Paulo, sábado, 04 de outubro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JOSÉ GERALDO COUTO

Vai e vem


De volta agora ao Parque Antarctica, Roque Júnior é o mais novo "repatriado'; será feliz como uma década atrás?


NESTES TEMPOS de êxodo de talentos, um fenômeno dos mais interessantes, do ponto de vista cultural, social e humano, é o dos jogadores ""repatriados".
Um exemplo em evidência é o de Roque Júnior, que esta semana reestreou no Palmeiras depois de oito anos de uma carreira internacional por alguns clubes reluzentes e outros inexpressivos, da Europa e do Oriente Médio. Com sua técnica, personalidade e experiência, Roque Júnior -campeão mundial com a seleção em 2002- tem tudo para ajudar muito o Palmeiras na luta pelo título nacional deste ano e, quem sabe, pelo da Libertadores da América do ano que vem.
Mas para cada Roque Júnior, para cada Athirson, Marques ou Marcelinho Paraíba, há centenas de repatriados mais obscuros, para não dizer anônimos. Alguém aí conhece, por exemplo, Giovanni Caliari Pedrini, que no ano passado deixou o K.N. Onisillos Sotiras FC, de Chipre, para jogar no Tupy, do Espírito Santo? Ou então Gilson Domingos, que veio do Hubei Wuhan Professional FC, da China, para o Astral Esporte Clube, do Paraná?
Você já viu em campo (ou mesmo fora dele) o Vinicius Rabello Miguel Brito, que trocou o Toronto Lynx, do Canadá, pelo Imbituba FC, de Santa Catarina?
Pois saiba que eles são apenas alguns dos 489 futebolistas brasileiros repatriados em 2007. Se há uma semana escrevi aqui sobre os que partem (coluna ""Canção do exílio"), hoje é a vez dos que, bons ou maus filhos, à casa tornam. Repatriar pode ser um verbo belo -na forma pronominal, de alguém que retorna à pátria por vontade própria- ou terrível, na forma transitiva, de alguém obrigado a contragosto a voltar a seu país, como bem sabe quem viu o filme turco-alemão ""Do Outro Lado".
No caso dos futebolistas, é pouco provável que algum seja trazido à força de volta ao Brasil, mas, dadas as atuais circunstâncias do futebol como negócio global, esse retorno, quando não é só transitório (como o de Zé Roberto no Santos ou o de Adriano no São Paulo), tem quase sempre sabor de derrota.
É como se o atleta fosse devolvido por não servir mais como insumo de primeira para uma indústria de ponta. Sugaram o seu sumo, devolvem o bagaço. Há, claro, inúmeras possibilidades de exceção. Muitos voltam precocemente por não se adaptarem, ou por problemas familiares, banzo, desejo de jogar no ""clube do coração" etc.
Mas, como regra geral, o repatriado volta ao lar cansado de guerra, à beira da aposentadoria ou do esquecimento. Os mais famosos, de nível de seleção, geralmente vêm de um percurso descendente mais ou menos assim: clube europeu de ponta, clube europeu mediano, clube de destaque da Turquia, da Grécia ou do Oriente Médio e, por fim, clube obscuro desses mesmos lugares.
Felizes são aqueles como Roque Júnior, que conseguem voltar ao time em que foram felizes, aos braços acolhedores de uma torcida familiar.
É uma sensação de fim de ciclo, de dever cumprido, como no poema ""A Pátria", de Hölderlin: "Volta alegre o barqueiro a seu sereno rio/ desde distantes ilhas onde fez sua colheita;/ assim viria eu ao lar, quando/ os bens e as dores tivesse colhido".

jgcouto@uol.com.br


Texto Anterior: Com ele, o Internacional é outro
Próximo Texto: São Paulo quer desencantar fora
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.