São Paulo, sexta-feira, 05 de março de 2004

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FUTEBOL

Últimas palavras

JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA

"A última impressão é a que fica."
A frase acima poderia ser o slogan de uma casa funerária. Mas é mais que isso. É uma verdade incontestável.
Deixar uma boa impressão final é uma arte, um privilégio de grandes homens. Ela pode vir de vários jeitos. Por exemplo, com uma bela frase à beira da morte. Goethe ficou célebre por pedir "Mais luz!" antes de fechar os olhos para sempre, e Jesus fez um sábio resumo da humanidade quando disse "Perdoai-os, senhor, eles não sabem o que fazem".
Mas isso é coisa para grandes homens. Nós, da ralé, geralmente nos despedimos da vida dizendo coisas como "Atira se for homem!", "Que caminhão?", "Tem certeza que seu marido não vai chegar?", "Fica tranqüila, hic, eu dirijo melhor quando bebo", "Estou com uma dorzinha do lado esquerdo do pei.." ou, então, apenas com um prosaico "Uh...".
Mas, no futebol, não há últimas frases. Há jogos de despedida.
O maior exemplo desse adeus foi Pelé. Aliás, ele despediu-se quatro vezes. Duas pela seleção, uma pelo Santos (a única vez que o vi em campo, chuif...) e uma última pelo Cosmos.
Por outro lado, Garrincha e Ademir da Guia, mesmo sendo craques maravilhosos, tiveram despedidas modestas, para não dizer melancólicas.
De qualquer forma, não deve ser fácil decidir parar de jogar bola. Desde pequeno o jogador faz do futebol a sua principal diversão, e deixar os campos é mais ou menos como enterrar de vez a infância. Isso sem dizer que a maioria dos jogadores não sabe fazer outra coisa na vida. Poucos poderiam imitar Tostão e Afonsinho, que se tornaram médicos.
Mas há que saber pôr o ponto final. Dondinho aconselhou Pelé a parar antes que lhe pedissem para fazer isso. Ele obedeceu ao pai e saiu deixando uma imagem vitoriosa (ainda por cima venceu seu último torneio pelo Cosmos).
Já Garrincha não fez o mesmo, e o resultado é que Romário já se diz o segundo melhor jogador da história do futebol brasileiro.
Falando em Romário, como será sua festa de despedida? Pelo Vasco (time que o lançou), pelo Flamengo (clube do seu coração) ou pelo Fluminense (provável equipe dos seus últimos dias)?
Eis aí um problema. Como hoje em dia ninguém mais fica muito tempo num só time, fica difícil fazer uma festa derradeira. Afinal, só vai embora deixando saudades aquele que um dia esteve presente, e presente de uma maneira tão constante, fiel e regular que parecia que jamais iria partir.
Talvez os goleiros Rogério e Marcos ainda consigam fazer belos jogos finais. Mas e grandes atletas como Ronaldo, Ronaldinho, Rivaldo, Marcelinho e Edmundo, que vestiram várias camisas? Como diria minha avó, "em velório que tem muita viúva, nenhuma chora".
De minha parte, ando pensando seriamente no assunto e tento achar quais seriam minhas palavras finais. Estou em dúvida entre "Perdoai-me, senhor, eu não sei o que fiz" e "Mais Fanta Uva!".

Botões
Falando em despedidas, acho que foi no começo da década de 70 que os times de botão deixaram de vir com a carinha dos jogadores e passaram a estampar os escudos dos times. Os fabricantes perceberam que não poderiam competir com a velocidade do mercado futebolístico. Acho que a solução para os tempos de hoje seria fazer rostos reaproveitáveis, assim como se faz com pulseiras de relógio e capas de celular. Desse modo os garotos fariam as mudanças nos times de acordo com o vai-e-vem dos atletas. Só que os fabricantes teriam que pagar direito de imagem aos jogadores. É, pensando bem, acho que é o fim dos botões com carinhas...

Contagem regressiva
Um... (é na próxima!)

E-mail torero@uol.com.br


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