São Paulo, sábado, 05 de maio de 2007

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JOSÉ GERALDO COUTO

Bolas à mão-cheia

Num projeto inusitado, 5.000 bolas de futebol serão utilizadas para combater a miséria africana

BENDITO O que semeia livros à mão-cheia, diz o verso de Castro Alves. O irlandês-americano-brasileiro Michael Mitchell, professor de educação física formado pela Universidade do Estado da Califórnia, resolveu mudar um pouco o mote do poeta baiano, substituindo os livros por bolas de futebol. Eu explico. Em 1983, quando servia a Força de Paz da ONU no Níger, Mitchell fez amizade com crianças da cidade de Zinder e deu a elas 15 bolas de futebol. No ano seguinte, o time local, L'Équipe Espoir (Equipe Esperança), conquistou pela primeira vez o Campeonato Nacional do Níger, elevando enormemente a auto-estima de seus cidadãos.
Mais de duas décadas depois, Mitchell planeja agora voltar ao país levando não 15, mas 5.000 bolas a serem distribuídas nas escolas e nos clubes das principais cidades do país. Para isso, já conta com a promessa de ajuda da própria Força de Paz e do governo nigerino. Parece pouco, mas não é. Uma bola de futebol é artigo de luxo no Níger, um dos países mais pobres do planeta. Localizado na África Ocidental, ao sul da Argélia e ao norte da Nigéria, o Níger tem dois terços de seu território no deserto do Saara. Ocupa a 174ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU, à frente apenas de Serra Leoa.
O analfabetismo chega a 86%. Claro que, por si só, despejar milhares de bolas sobre essa gente não vai mudar sua condição de vida miserável. Livros, sozinhos, também não mudariam. Tudo vai depender de como essas bolas serão distribuídas e do que será feito com elas. Se o terreno for fértil, e cultivado adequadamente, elas frutificarão de algum modo. Penso no aspecto simbólico do gesto. No final do século 19, Charles Miller, de volta de uma temporada na Europa, trouxe ao Brasil duas bolas de futebol. Embora pesquisas recentes tenham mostrado que já se praticava o esporte no país antes disso, a imagem de Miller desembarcando com duas bolas debaixo dos braços ficou eternizada como a origem mítica do futebol brasileiro.
Se um mero par de bolas de futebol pôde ter em nossos tristes trópicos a conseqüência que se conhece, o que não poderão fazer 5.000 no Níger? É, de todo modo, um projeto a ser acompanhado com atenção. Quem quiser mais informações, ou estiver interessado em ajudar, deve visitar o site www.projectplay.net. Acho que todo brasileiro que, como eu, não esquece a emoção do primeiro contato imediato com uma bola "de capotão" é capaz de avaliar a lucidez dessa loucura.

Estados de emergência
Por motivos diversos, várias decisões estaduais ganharam contornos espetaculares. No Rio, o Flamengo tenta afugentar a crise diante do redivivo Botafogo depois da derrota feia para o Defensor na Libertadores e do afastamento de Juninho Paulista. Em Minas, só um milagre pode levar o Cruzeiro a descontar a goleada de 4 a 0 para o Atlético no primeiro jogo. No Sul, Grêmio e Juventude vão para a decisão no Olímpico em igualdade de condições. E, no Morumbi, o Santos vai ter que se desdobrar se quiser tirar a sólida vantagem do São Caetano. É bom deixar o desfibrilador de prontidão.

jgcouto@uol.com.br


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