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FUTEBOL
Saber antes de entender
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Rinus Michels, que morreu
durante a semana e foi eleito
o técnico do século passado, foi
um visionário, revolucionário.
Entretanto não podemos dizer
que ele mudou o futebol, pois os
treinadores não o seguiram, apesar de todos o elogiarem.
A concepção principal da seleção holandesa de 1974 era a pressão sobre o adversário. Onde estava a bola, havia vários holandeses. Eles não tinham posição fixa,
tomavam a bola com facilidade e
chegavam rapidamente ao gol.
Era o futebol total, o carrossel holandês, a pelada organizada.
Cruyff, o mais brilhante jogador
coletivo de todos os tempos, disse
que essa postura foi adotada dias
antes da Copa. Resolveram inovar e arriscar. Fizeram dois treinos e encantaram o mundo. As
pessoas comuns só sabem depois
que treinam, entendem e aprendem. Os grandes talentos sabem
antes de entender.
Existe um saber que antecede
ao raciocínio lógico. Esse saber
vem dos genes, das experiências e
dos encantamentos na infância e
dos mistérios.
Nenhum técnico adotou mais
essa filosofia. Uns tentaram, mas
por pouco tempo. Com exceção de
raros momentos, os treinadores
fazem o contrário. Preferem um
estilo mais contido, pragmático,
de pouco risco e equilibrado. É
mais seguro.
Rinus Michels foi um visionário, um "maluco beleza". Único.
Intolerância
De longe, não dá para dizer se
Daniel Passarella é ou não um
ótimo treinador e se vai dar certo
no Corinthians.
Não se pode analisar também
um técnico somente pelos títulos
conquistados. Ele teve altos e baixos na sua carreira, como a maioria dos técnicos, o que não justificaria a sua contratação para o lugar de um brasileiro. Mas a MSI
quer um nome famoso para valorizar o seu time (produto).
Isso é uma coisa. Outra são as
pesadas críticas a Passarella, como se ele fosse a mais pedante das
criaturas e um medíocre treinador. A imprensa tem de ser dura e
investigativa, como tem sido, para esclarecer o nebuloso negócio
entre a MSI e o Corinthians. Os
profissionais argentinos não têm
nada a ver com isso.
A seleção da Argentina, dirigida por Passarella e eliminada pela Holanda na Copa do Mundo
de 98, na França, era muito bem
preparada. Em um amistoso antes desse Mundial, contra o Brasil,
no estádio do Maracanã, poucas
vezes vi uma equipe marcar tão
bem por pressão e não dar nenhuma chance ao adversário, como
fez a Argentina.
Assim como criticamos e cobramos mais respeito aos brasileiros
que trabalham no exterior, temos
de ser mais tolerantes com os estrangeiros que estão no Brasil.
Detalhes
Pelo que os times mostraram
neste início de ano, Santos e São
Paulo serão os grandes favoritos
ao título do próximo Campeonato Brasileiro. Os melhores momentos do Santos são mais encantadores do que os melhores
momentos do São Paulo, mas o time dirigido pelo Leão é mais regular e dá menos chance ao adversário.
Leão está ensinando aos treinadores como se joga com três zagueiros, sem priorizar a defesa. Os
alas Cicinho e Júnior são armadores e chegam ao ataque pelo
meio e também pelas pontas. Eles
não são apenas laterais apoiadores. Por causa dos dois atletas,
Leão adotou o esquema com três
zagueiros, que não é o seu preferido. Nem o meu.
Os dois volantes do São Paulo
desarmam mais à frente e chegam, alternadamente, ao ataque.
Com três zagueiros, não há razão
dos volantes ficarem muito atrás.
Com o técnico Cuca, o meia Danilo recuava demais para marcar
e não tinha velocidade para ir ao
ataque. Hoje ele atua mais próximo dos dois atacantes, onde aproveita melhor o seu bom chute.
O atacante Grafite não corre
mais atrás de lateral, como era
antes do Leão. Economiza energia para chegar ao gol.
Leão também encheu a bola de
Diego Tardelli e exigiu a sua retribuição em campo. A atenção e o
incentivo do treinador eram o
que faltavam ao jovem atacante.
Qualquer técnico razoável, até
o do Tabajara Futebol Clube, conhece os desenhos táticos, possui
todas as informações do seu e do
outro time e ensaia jogadas.
Porém poucos treinadores são
ótimos observadores e dominam
os detalhes, dentro e fora de campo, que fazem a diferença. Leão
aprendeu com o tempo. Outros
podem fazer o mesmo.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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