São Paulo, Domingo, 06 de Junho de 1999
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TOSTÃO

Semifinal paulista

O São Paulo foi melhor, até este momento, mas ainda não ganhou nada. O campeonato de verdade começou ontem. Nas duas vezes que o time decidiu neste ano, foi derrotado pelo Botafogo, na Copa do Brasil, e pelo Vasco, no Rio-São Paulo.
Gosto muito das inovações táticas do Carpegiani, da presença de três zagueiros, que não são fixos, e das mudanças durante a partida. A equipe é leve, habilidosa e criativa. A dupla Raí-França e mais Dodô empolgam pela troca rápida de passes, pela beleza do drible e pela conclusão.
Esse estilo encanta, mas nem sempre vence em uma decisão. O time precisa associar a técnica à jogada feia, ao gol por acaso, transpirado e grosso. Prefiro ver o Raí vindo de trás, ao lado do Dodô e do França, do que jogando na frente, com o Dodô na reserva.
O Corinthians está preocupado em marcar o excepcional lateral-esquerdo Serginho. Se recuar o Marcelinho para essa função, perde a presença do jogador no ataque. Se deixá-lo mais solto na frente, terá de deslocar o volante Vampeta para ajudar o tímido lateral Índio na marcação do jogador do São Paulo. Por causa dessa mesma dúvida, Marcelinho brigou com o ex-corintiano Luxemburgo, já que o atleta não queria jogar recuado, para fazer essa função.
O grande diferencial do time de Oswaldo de Oliveira é a presença, no meio-campo, de dois armadores (Rincón e Vampeta), que são ofensivos e defensivos ao mesmo tempo. Vampeta é o único jogador de meio-campo, no Brasil, com essa capacidade. Parece que o preconceito do treinador da seleção brasileira, pelo fato de o jogador ter posado nu para uma revista, está atrapalhando sua convocação.
O Corinthians perdeu a Libertadores e a Copa do Brasil e não quer ficar sem esse terceiro título. O São Paulo precisa se afirmar como um grande time de decisão. Portanto, teremos hoje um jogaço, sem favoritos.

Decisão carioca

Quando começou o Campeonato Carioca, todos nós dizíamos que o Vasco era o franco favorito. Eurico Miranda, com sua empáfia, falava que a disputa seria pela segunda colocação.
Tudo mudou. O Flamengo melhorou, e o Vasco piorou. Hoje, existe um equilíbrio. O Mengo, além do genial Romário, tem Iranildo -que vai progressivamente conquistando um lugar de destaque no futebol brasileiro-, Athirson, Beto, Clêmer, Luiz Alberto, Caio e outros bons jogadores. O Flamengo não é um timaço, mas é um bom time, equilibrado e regular.
O Vasco perdeu sua confiança e a tranquilidade de ganhar quando quisesse. Agora, ganha se o adversário permitir.
O clube trouxe Edmundo, como se o atacante, sozinho, fosse resolver todos os seus problemas e, para hoje, provavelmente estará desfalcado de seus dois outros grandes jogadores (Juninho e Mauro Galvão), além da falta crônica do Pedrinho.
Seu sistema tático, com Nasa jogando praticamente de zagueiro, correndo atrás do atacante adversário, um armador ofensivo de cada lado e dois atacantes, está se tornando saturado.
A equipe do Vasco precisa mudar sua filosofia em campo, criar outras opções táticas e descobrir novos caminhos.

Auto-estima

Existe jogador que, ao ser elogiado por seu técnico e pelos torcedores, se torna insuportável, deslumbrado e piora seu rendimento.
Outros, pelo contrário, precisam ser reconhecidos, valorizados, para aumentar sua auto-estima e melhorar sua qualidade técnica. Sentem-se mais seguros com os elogios e o apoio dos treinadores e dos torcedores.
João Saldanha, em 69, assumiu o comando da seleção brasileira, chamou-me e disse: "A partir de hoje, você é titular absoluto da equipe, ao lado do Pelé. Se jogar mal, continuará no time".
Eu, que até aquele momento me sentia inseguro, pelo receio de que seria o eterno reserva do Rei, passei a jogar muito melhor e tive, nas eliminatórias para a Copa do Mundo, o meu maior momento no time brasileiro.
Luiz Felipe escalou os jogadores Arce e César Sampaio, para vigiar o Alex e não deixá-lo sonolento em campo. O jovem meia precisa somente do reconhecimento do técnico, dos torcedores e da imprensa. Ele é um atleta excepcional e não deveria ser substituído com tanta frequência.
O mesmo aconteceu como o Iranildo no Flamengo.
Giovanni passa por esse mesmo problema no Barcelona. Com mais segurança, confiança e apoio, o futebol desses e de outros jogadores atingiria as alturas.

Lembranças

Aqui, em Cali, Colômbia, o Palmeiras perdeu para o Deportivo, mas novamente venceu, pois terá ótimas chances de ser campeão da Libertadores, em São Paulo.
Há 30 anos, estive aqui na Colômbia, para disputar as eliminatórias para a Copa do Mundo de 70. Ganhamos por 2 a 0, e sofri um corte no supercílio esquerdo. Os médicos disseram que esse problema não teve relação com o descolamento da retina, em setembro do mesmo ano, no Pacaembu, durante a partida entre o Cruzeiro e o Corinthians.
Naquele período, assisti, em Bogotá, pela TV, o homem pisar na lua pela primeira vez. Fiquei deslumbrado com o fato. Como um bom mineiro, desconfiado, perguntei-me se tudo aquilo era verdade. Imaginei, ao mesmo tempo, que 30 anos depois estaríamos viajando de rotina, para a lua.
Antes de viajar desta vez para a Colômbia, estive na Universidade de Campinas (Unicamp). Um professor me perguntou o que senti quando parei de jogar, ainda jovem, por causa de uma grave contusão no joelho. Corrigi que não tinha sido por causa do joelho, e sim por causa de um problema no olho esquerdo.
Esta é uma pequena amostra de como a história vai sendo transformada com o tempo. Talvez, daqui a 30 anos, dirão que o meu problema foi no pé, que o homem não chegou à lua, que tudo foi um sonho.


Tostão escreve aos domingos e às quartas-feiras

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