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MOTOR
F-1 ao xadrez
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE
O treino livre de ontem em
Silverstone tinha apenas 19
carros. Um grid de F-1 tem espaço, determinado pelo regulamento, para 24. As duas vagas da
Prost foram para o vinagre antes
mesmo de a temporada começar.
As duas da Arrows foram ontem
-contam que a situação de Tom
Walkinshaw é péssima, e o pedido
de falência, iminente. Faltou ainda o Toyota de Salo, que mal conseguiu terminar uma volta por
conta de intensas dores no estômago. A coisa está bem feia.
A categoria vive sua pior crise
em muitos anos. Talvez caminhe
para a pior de sua história organizada, que já acumula mais de
50 anos. Para tanto bastaria um
terceiro time desistir do negócio
até o final deste ano. Minardi e
Jordan, a primeira mais que a segunda, são sérias candidatas. A
crise é conjuntural, financeira, esportiva e, graças à Ferrari, igualmente moral. Não há solução fácil, não há solução rápida.
O que há é um público dividido
entre o apreço ao esporte e a perplexidade diante das barbaridades que ele vem oferecendo. Dividido entre encarar passivo mais
um título do alemão ou curtir o
excelente momento de Barrichel-
lo, talvez o mais profícuo de sua
carreira. É um momento difícil
para o torcedor. Ponderar esse
momento ou deixar-se iludir por
ele? Havia muito desde a última
vitória. Talvez seja pedir demais
para o aficionado do automobilismo racionalizar tanto o esporte. Crise por crise, a dele, pessoa física, sempre será maior.
Um leitor assíduo escreve para
dizer que a coluna está "ácida" e
que, portanto, vai abandoná-la.
Acha um exagero falar de domínio da Ferrari, cita como parâmetro a McLaren de Prost e Senna
no final dos 80. Detecta, acredito,
um certo desprezo do colunista
por Barrichello e pela própria F-1.
Existe uma clara diferença entre as duas épocas, a começar pelos protagonistas, que corriam,
como se dizia antigamente, com a
faca nos dentes. Nasceu ali o duelo entre Prost e Senna, aquele que
seria um dos maiores da história.
O que existe hoje na Ferrari não é
um duelo, é um jogo de golfe, com
a última tacada sendo decidida
pelo cavalheirismo conveniente
(pronto, lá veio a acidez de novo).
Sobre o suposto desprezo, é necessário reconhecer não o suposto
desprezo, mas uma certa descrença. Acompanhar uma corrida
clássica de F-1 de maneira séria é
algo como disputar uma simultânea de xadrez. É necessário prestar atenção em vários jogos ao
mesmo tempo, ir resolvendo um a
um. No final ainda é preciso encontrar uma solução comum, que
satisfaça e dê todos os resultados.
A maioria não faz isso, não entende, por exemplo, como é possível uma corrida acachapante de
Schumacher ser espetacular. Ou
uma de Barrichello ser arruinada
pelo congelamento via rádio das
posições. O resultado final, a tal
solução comum, não bate com o
desenvolvimento das partidas intermediárias. A equação não fecha ou é muito fácil, não tem mistério resolver, não tem graça.
Essa é a descrença. Não acreditar mais que a F-1 consiga produzir essa espécie de desafio para o
público. Pior, muito pior, constatar que o público talvez não queira mais esse tipo de desafio, que
prefira contentar-se, diante de
tantas outras dificuldades, com a
sensação fortuita, leniente da
musiquinha após a bandeirada.
Outros esportes seguiram esse
caminho. Afundaram. Ignorar o
fato, isso sim seria desprezo.
Jogo de equipe
A FIA resolveu democratizar a discussão. Instalou um fórum em
seu site (www.fia.com) para que os fãs possam sugerir modificações no regulamento que inibam palhaçadas no futuro. Ou que
promovam, como escreve a entidade em comunicado, "uma revisão nas ordens de equipes no esporte a motor". O fórum ficará no
ar até 1º de setembro, quando as sugestões serão enviadas para um
grupo de trabalho criado pela FIA. Divirta-se.
Indy
O homem a ser batido neste fim de semana, em Toronto, aliás, no
campeonato, atende pelo nome de Cristiano da Matta. Ganhou as
três últimas, ganhou quatro das sete corridas deste ano, além das
últimas duas da temporada passada. Um bom piloto, um excelente
trabalho. Pena que o momento da categoria seja tão ruim. Fosse
outra a realidade da Indy, Cristiano já poderia acalentar sonhos
maiores e melhores.
E-mail mariante@uol.com.br
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