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Justiça meia-boca é pura politicagem
JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas
Mais uma vez os assuntos extracampo ocupam as manchetes dos
cadernos esportivos e ofuscam o
jogo praticado dentro das quatro
linhas. O caso Sandro Hiroshi, por
exemplo, continua dando pano
para mangas.
A pergunta que não quer calar é
a seguinte: se é para ser rigoroso,
por que não tirar do São Paulo todos os pontos conquistados em
partidas nas quais Hiroshi participou? Por que só do jogo contra o
Botafogo-RJ?
Mais que isso: se a questão é a
transferência irregular do atleta
do Tocantinópolis para o Rio
Branco, por que não tirar todos os
pontos do time de Americana no
último Campeonato Paulista e assumir a confusão que isso causaria, retrospectivamente, na evolução daquele torneio?
Claro que nada disso vai acontecer. O São Paulo será prejudicado "um pouco" (pode ficar fora da
próxima fase do Brasileirão) para
que o Botafogo seja beneficiado
"um muito" (ao se afastar do rebaixamento).
O futebol brasileiro segue à risca
a tradição que herdamos dos tempos da Colônia e do Império: aos
amigos, tudo; aos inimigos, a lei.
Quem pode mais chora menos. É
tudo política, e quem disser que a
lei está prevalecendo ou é otário
ou tem má-fé.
Reportagem publicada há alguns dias neste caderno mostrou
que os clubes que baixaram o preço dos ingressos para suas partidas (como o Atlético-MG e o Vasco) conseguiram encher as arquibancadas, e os que mantiveram
preços altos tiveram que se conformar com públicos mais baixos.
A conclusão é óbvia: pouca gente, no Brasil de hoje, pode se dar
ao luxo de gastar R$ 10 por um ingresso de arquibancada, aos quais
se adicionam os custos de condução, lanche etc.
Num frio raciocínio contábil, os
executivos dos grandes clubes
-ou das empresas que os sustentam- podem concluir que dá no
mesmo vender 10 mil ingressos a
R$ 10 ou vender 100 mil a R$ 1.
É nesse ponto que quero chegar
quando digo que o lucro não pode
ser o valor supremo e que os interesses das empresas nem sempre
coincidem com os interesses dos
aficionados e do futebol como um
todo.
O que está por trás de uma decisão sobre o preço do ingresso é
muito mais que uma mera relação custo/benefício. É uma questão de política cultural e até de
política no sentido mais amplo.
O que se decide, no caso, é se o
futebol é um lazer popular ou um
espetáculo para a classe média remediada e a elite. No fundo, a
questão é: queremos um país de
cidadãos participantes ou de telespectadores passivos?
Mesmo quem não tem a menor
preocupação com o destino das
massas, mas gosta de futebol, há
de concordar que um estádio lotado contribui muito mais para a
qualidade do espetáculo que uma
arquibancada vazia.
Há uma vantagem adicional na
ampliação do público que frequenta os estádios. Quanto mais
gente na arquibancada, mais se
diluem e perdem força os núcleos
violentos de torcedores (as chamadas torcidas organizadas).
A vocação fascista desses agrupamentos ficou mais uma vez evidente esta semana, quando os líderes de um deles ameaçaram de
agressão física jogadores do Palmeiras que forem "pegos na noite". Só faltava essa.
Coincidência ou não, o Palmeiras é um dos clubes que vendem o
ingresso mais caro.
E-mail jgcouto@uol.com.br
José Geraldo Couto escreve aos sábados e
às segundas-feiras
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