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FUTEBOL
Todo mundo sabe; o mundo todo sabe
RODRIGO BUENO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Dizem que o Rio tem duas
estações: o verão e o fogo
do inferno. O diabo certamente
fez o pior na final da Copa JH.
Isto não é um conselho de vida
depois do evento. Eu mencionei
minhas preocupações na apresentação do jogo que eu mandei para
o serviço mundial da BBC.
Eu tenho frequentemente difundido advertências sobre os perigos deste estádio. Realmente
não é preciso ser um gênio para
apontar os principais problemas.
Extra-oficialmente, dirigentes
do Vasco compartilharam minhas angústias. O jogo começou
às 16h, um absurdo no forte verão, mas necessário devido à toda-poderosa TV Globo, que quer
a partida terminada às 18h para
o início de suas novelas sem fim.
Eu cheguei duas horas antes do
jogo, e o estádio estava quase
abarrotado. Os assentos reservados para a imprensa ficam na
sombra; apesar disso o calor foi
intenso. Deve ter sido insuportável do outro lado, onde as bancadas sentem toda a força do sol.
Pouco depois de uma hora antes do início do jogo, parecia que o
estádio estava superlotado. Tinham sido vendidos mais ingressos -ou deixaram pessoas entrar- do que o estádio poderia
racionalmente comportar.
Muitos torcedores viram pouco
ou nada dos 24 minutos de futebol que foram jogados. Superlotação é uma prática padrão em São
Januário. É fácil para os jornalistas perceberem porque ficamos
cercados por torcedores que não
encontram espaço e têm de implorar aos seguranças por um lugar vazio no meio da imprensa.
Por anos, o problema da superlotação no estádio tem sido um
vulcão adormecido. O calor e a
importância do jogo resultaram
em uma força explosiva que colocou em risco a vida de milhares.
A substituição de Romário foi o
catalisador. Depois de 22 minutos, ele saiu mancando com um
de seus frequentes problemas
musculares. Uma briga teve início
logo após a saída dele de campo.
Assim que o goleiro Hélton se
preparou para bater o tiro de meta, houve movimento nas arquibancadas à sua esquerda. O calor
e a tensão deixaram os torcedores
mais propensos ao pânico.
Pessoas iam se empurrando a
partir do foco do problema, e a
onda humana foi ganhando intensidade, movendo-se para a
parte de baixo da arquibancada,
atirando muitos para a frente
com uma força que derrubou 30
metros de grades. Uma frota de
ambulâncias estava logo em cena, e, depois, os helicópteros.
Mais de uma hora depois do incidente os feridos ainda estavam
sendo carregados em macas.
Com surpreendente intensidade, o Vasco queria retomar o jogo.
Uma chamada do governador do
Rio pôs fim ao tamanho absurdo.
O Vasco respondeu à notícia de
que o jogo tinha sido cancelado se
proclamando campeão e enviando jogadores para volta olímpica.
Isso poucos minutos depois de o
excepcional goleiro Hélton ter feito a melhor dupla defesa que já vi.
Poderia ter ficado na minha memória o tempo de uma vida, mas
foi eclipsada por cenas de evitável
sofrimento humano, produto da
negligência, da ganância e da estupidez daqueles que fazem o futebol brasileiro."
Eis o relato do jogo do enviado
da BBC. O mundo sabe a história.
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