São Paulo, sábado, 07 de julho de 2007

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JOSÉ GERALDO COUTO

A nova era Dunga

Vê-se de novo o reinado dos volantes e delegou-se a Robinho a missão salvadora que foi de Romário em 94

D IZEM QUE o Brasil jogou "com o regulamento debaixo do braço" contra o Equador. Deve ser por isso que os jogadores estavam tão travados, tão duros, sem jogo de cintura. Não é fácil correr com um calhamaço sob o sovaco.
Ainda bem que Robinho, em algum momento, livrou-se do seu.
O mais triste desse tristíssimo jogo foi ouvir Dunga dizer que estava satisfeito como o desempenho. Segundo ele, a seleção não deixou de ser ofensiva ao jogar com quatro volantes, e a "prova" disso seria a vitória. "Fomos objetivos", declarou.
O discurso do vencedor é terrível quando não admite que a vitória se deu apesar de suas escolhas e atitudes, e não por causa delas. Como se tudo estivesse calculado de antemão: o arroubo de Robinho, o pênalti duvidoso (acho que foi, outros acham que não), a cobrança fraca, o goleiro ficando no quase. E também a não-marcação do pênalti de Alex.
Dunga viu um jogo diferente do que vimos, diferente até mesmo do que o público venezuelano viu. Nunca pensei que um dia chegasse a ver a seleção brasileira ser vaiada por uma platéia que não fosse argentina. A vida é uma caixinha de surpresas.
A má notícia, amigo, é que estamos em plena "era Dunga", segunda edição. A primeira, como se sabe, veio na ressaca das duas copas perdidas pela bela seleção de Telê (em 82 e em 86) e durou de 1990 a 94. Jogo burocrático, feio e defensivo passou a ser a ordem do dia, futebol bonito era "frescura", coisa do passado. A Copa conquistada em 94 chancelou e coroou a primeira era Dunga. Com a taça na mão, gritando todos os palavrões do mundo, o capitão lavava a alma dos cabeças-de-área do país inteiro e consagrava o tal futebol de resultados. Como se tudo tivesse sido previsto: a genialidade de Romário (convocado de última hora e a contragosto), os pênaltis perdidos na final pelos combalidos Baggio e Baresi.
Agora, na segunda era Dunga, instaura-se de novo o reinado dos volantes. Robinho é investido da ingrata tarefa que em 94 coube a Romário: salvar a pátria e a cara do treinador. Pode até dar certo. Vencer é o que importa, não é verdade?
Só que então, em vez de impingir mais sessões de 90 minutos de tédio e feiúra aos torcedores que ainda gostam de futebol, por que não combinam com o outro time e fazem o seguinte? Os capitães tiram par ou ímpar no centro do campo, e quem ganhar ganhou. O jogo. Quem ganhar mais vezes é campeão. Os ufanistas ficarão igualmente felizes e poderão desfraldar bandeiras e soltar fogos à vontade. Galvão poderá gritar: Brasil-sil-sil.
Não quero esse pesadelo para mim. Ainda tenho alguma fé no bom senso e na imaginação do homem (não só do Dunga, mas do homem em geral). Confio que uma boa safra de futebolistas, como a nossa atual, não será desperdiçada pela pobreza de espírito e pela teimosia.
Mesmo o elenco desfalcado que está na Venezuela pode ser mais bem aproveitado. Dando nome aos boys: Diego, Anderson e Kléber não devem ficar no banco. Deles pode vir um futebol mais inteligente e criativo do que o que está aí. Colocar cada um deles para jogar meio tempo e depois dizer que fracassaram é sacanagem. Contra eles e contra o futebol brasileiro.

jgcouto@uol.com.br


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