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JOSÉ GERALDO COUTO
A nova era Dunga
Vê-se de novo o reinado dos volantes e delegou-se a Robinho a missão salvadora que foi de Romário em 94
D
IZEM QUE o Brasil jogou "com
o regulamento debaixo do
braço" contra o Equador.
Deve ser por isso que os jogadores
estavam tão travados, tão duros,
sem jogo de cintura. Não é fácil correr com um calhamaço sob o sovaco.
Ainda bem que Robinho, em algum
momento, livrou-se do seu.
O mais triste desse tristíssimo jogo foi ouvir Dunga dizer que estava
satisfeito como o desempenho. Segundo ele, a seleção não deixou de
ser ofensiva ao jogar com quatro volantes, e a "prova" disso seria a vitória. "Fomos objetivos", declarou.
O discurso do vencedor é terrível
quando não admite que a vitória se
deu apesar de suas escolhas e atitudes, e não por causa delas. Como se
tudo estivesse calculado de antemão: o arroubo de Robinho, o pênalti duvidoso (acho que foi, outros
acham que não), a cobrança fraca, o
goleiro ficando no quase. E também
a não-marcação do pênalti de Alex.
Dunga viu um jogo diferente do
que vimos, diferente até mesmo do
que o público venezuelano viu. Nunca pensei que um dia chegasse a ver a
seleção brasileira ser vaiada por
uma platéia que não fosse argentina.
A vida é uma caixinha de surpresas.
A má notícia, amigo, é que estamos em plena "era Dunga", segunda
edição. A primeira, como se sabe,
veio na ressaca das duas copas perdidas pela bela seleção de Telê (em
82 e em 86) e durou de 1990 a 94. Jogo burocrático, feio e defensivo passou a ser a ordem do dia, futebol bonito era "frescura", coisa do passado.
A Copa conquistada em 94 chancelou e coroou a primeira era Dunga. Com a taça na mão, gritando todos os palavrões do mundo, o capitão lavava a alma dos cabeças-de-área do país inteiro e consagrava o
tal futebol de resultados. Como se
tudo tivesse sido previsto: a genialidade de Romário (convocado de última hora e a contragosto), os pênaltis perdidos na final pelos combalidos Baggio e Baresi.
Agora, na segunda era Dunga, instaura-se de novo o reinado dos volantes. Robinho é investido da ingrata tarefa que em 94 coube a Romário: salvar a pátria e a cara do treinador. Pode até dar certo. Vencer é o
que importa, não é verdade?
Só que então, em vez de impingir
mais sessões de 90 minutos de tédio
e feiúra aos torcedores que ainda
gostam de futebol, por que não combinam com o outro time e fazem o
seguinte? Os capitães tiram par ou
ímpar no centro do campo, e quem
ganhar ganhou. O jogo. Quem ganhar mais vezes é campeão.
Os ufanistas ficarão igualmente
felizes e poderão desfraldar bandeiras e soltar fogos à vontade. Galvão
poderá gritar: Brasil-sil-sil.
Não quero esse pesadelo para
mim. Ainda tenho alguma fé no bom
senso e na imaginação do homem
(não só do Dunga, mas do homem
em geral). Confio que uma boa safra
de futebolistas, como a nossa atual,
não será desperdiçada pela pobreza
de espírito e pela teimosia.
Mesmo o elenco desfalcado que
está na Venezuela pode ser mais
bem aproveitado. Dando nome aos
boys: Diego, Anderson e Kléber não
devem ficar no banco. Deles pode vir
um futebol mais inteligente e criativo do que o que está aí.
Colocar cada um deles para jogar
meio tempo e depois dizer que fracassaram é sacanagem. Contra eles e
contra o futebol brasileiro.
jgcouto@uol.com.br
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