São Paulo, terça-feira, 07 de agosto de 2007

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SONINHA

O porre e o esculacho


O Brasil não perdeu a Copa do Mundo por culpa de um porre, mas do descontrole geral. Que não era segredo


O QUE FAZER agora com a inconfidência de Ricardo Teixeira ao repórter do "Estadão"? Tentar descobrir quem foi que voltou bêbado para a concentração às 4h da manhã? Encostar o irresponsável na parede e dizer: "Por que você fez isso? Você não sabe que seu rendimento seria prejudicado no dia seguinte? Você não estava comprometido com o grupo, interessado no resultado, preocupado com a expectativa de milhões de pessoas? Você estragou tudo!".
O Brasil não perdeu a Copa porque, em um dia de folga (presumo), um ou mais jogadores se excederam e acordaram de ressaca. E nem perdeu porque Ronaldo se apresentou bem acima do peso. Também não foi a meia do Roberto Carlos ou a venda de ingressos para treinos em Weggis o que causou a eliminação ridiculamente precoce. Foi isso tudo junto, e principalmente o que levou a isso.
Quando escorraçamos um jogador que perde um pênalti decisivo e com isso sela a derrota do time, o certo seria analisar tudo o que levou a vitória a ficar pendurada por um fio, condicionada a um elemento isolado. O jogador tem seu papel e sua responsabilidade, mas o jogo é coletivo, a estratégia e a tática são definidos por aqueles que lhe são "superiores", e incontáveis fatores interferem no resultado de um jogo ou uma campanha. Assim também na Copa.
O problema não foi o porre eventual. A história registra vitórias que se seguiram a baladas; Garrincha talvez jogasse pior se ficasse trancado no quarto a pão e água, frustrado e infeliz. Bem que tentavam -ele fugia, voltava e jogava. Muito. Mas Garrincha, por todos os motivos do mundo, não vale como parâmetro para ninguém. E são outros tempos, outras necessidades. O preparo físico necessário a um jogador de futebol, de maneira geral, não se compara ao exigido décadas atrás.
Se um jogador chegou fora do peso e outro (ou o mesmo) encheu a cara de madrugada, há sinais de desinteresse e descompromisso. Roberto Carlos estava sóbrio quando viu o jogo contra o Japão deitado na beira do campo... E Parreira estava sóbrio quando insistiu em Ronaldo como titular e quando se irritou com os questionamentos a essa opção. Por que houve essa frouxidão, desencontro de intenções, desequilíbrio no nível de adesão do grupo, a falta de autoridade da comissão técnica?
No jogo de cartas, quando alguém pergunta "de quem é a vez?", é comum a resposta ser "de quem pergunta". Quando Ricardo Teixeira indaga, perplexo, "como é que ninguém viu isso", como é que ninguém impediu que a preparação em Weggis se transformasse em (mau e inútil) espetáculo e como é que a comissão técnica não percebeu que alguns jogadores estavam longe das condições ideais (físicas, técnicas, psicológicas) para disputar uma Copa do Mundo, a situação é análoga: quem tem de responder isso é quem pergunta...
É sintomático que Ricardo Teixeira "atire pedras no próprio telhado", como alguém escreveu, na ocasião em que vai à Suíça defender sua capacidade de organizar uma Copa. A CBF renuncia a quase tudo o que poderia ser obrigação sua para se dedicar apenas à seleção brasileira, e é assim que faz seu trabalho. Imagine o que vem pela frente.

soninha.folha@uol.com.br


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