São Paulo, sexta, 8 de maio de 1998

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O dominó Dunga

MELCHIADES FILHO
Editor de Esporte

A escalação de Rivaldo, Giovanni, Romário e Ronaldinho pode deliciar os românticos. Mas o estudioso da bola deveria ficar no mínimo intrigado.
Falcão e Casagrande deram a deixa ao comentar a convocação de Zagallo. Com esses quatro, a seleção é vulnerável.
Na Copa de 94, quando Parreira montou talvez a melhor defesa da história dos Mundiais, Mauro Silva servia de xerife do miolo da área, quase um terceiro zagueiro.
Agora, Zagallo pretende confiar essa função a Dunga.
O problema é que jogar na sobra dos zagueiros nunca foi a vocação desse volante, que sempre atuou no sentido vertical do campo, dando dentadas na intermediária.
Hoje, sem o vigor físico que o notabilizou, Dunga, 34, está ainda menos habilitado para a missão. Prova disso, o teste contra a Alemanha -de tanto dar botinadas à caça dos adversários, ele acabou expulso.
Cedo ou tarde, Zagallo terá de agir em socorro ao volante.
Para alguns, a saída de emergência seria fixar uma linha de quatro na defesa, inibindo as avançadas dos laterais Cafu e Roberto Carlos.
O preço, todavia, é alto: abrir mão do único artifício tático que a seleção brasileira não precisa ensaiar e que ainda encanta (assusta) os europeus.
Para outros, Zagallo deveria inverter os volantes. César Sampaio escoltaria a zaga; Dunga sairia para o jogo.
Nesse caso, a seleção perderia na direita. Dunga não tem cacoete para fazer o chamado "1-2" com o lateral. Sem Sampaio, Cafu ficaria estéril.
E então? Você pode perguntar, estaria este colunista sugerindo a troca de Dunga por Doriva? Deus me livre!
Busco apenas destacar a importância da confecção do setor de meio-campo -o torcedor acaba de assistir a duas aulas a respeito disso, com Passarella (Argentina 1 x 0 Brasil) e Luxemburgo (Corinthians 2 x 1 São Paulo)- e chamar atenção para um buraco que Zagallo terá eventualmente de tapar na França.
Na Olimpíada-96, diante desse desafio, o técnico falhou.
A seleção jogava com dois volantes, Amaral e Flávio Conceição, e dois meias ofensivos, Rivaldo e Juninho. Depois do desastre diante do Japão na estréia, Zagallo viu-se forçado a reforçar a proteção à zaga.
Primeiro, sem efeito, trocou Amaral por outro meia defensivo, Zé Elias. Depois, e aqui está o alerta histórico, sacou Rivaldo e promoveu Amaral.
A seleção passou a usar três volantes e somente um meia ofensivo, Juninho. O improviso matou o poder de criação da equipe e deixou Ronaldinho e Bebeto à mercê do adversários. A medalha de bronze foi sorte.
Os personagens da seleção de Zagallo podem ter mudado nesses dois anos -Giovanni barrou Juninho; Romário, Bebeto. Mas o desafio que espera o time na França é o mesmo.
Na hora H, pressionado, o técnico terá três opções:
1) Afastar Romário, que joga paradão, e escalar Denílson, que fecha mais o meio-campo;
2) Ousar taticamente de vez e trocar Romário por um volante (Conceição?), liberando os laterais para fazer o pêndulo com Giovanni e Rivaldo;
3) Usar, sem ter treinado, a saída Parreira (Raí por Mazinho), tirando um meia ofensivo para colocar um volante.
Que dirão os românticos quando Zagallo cravar 3?



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