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JUCA KFOURI
"Bem-vindo ao Congo". E daí?
Nós, brasileiros, gostamos de brincar de esconde-esconde e odiamos quando alguém revela o esconderijo
Q
UE O GERENTE de imprensa
do Comitê Olímpico norte-americano fez uma brincadeira infeliz ao chegar ao Brasil e escrever "Bem-vindo ao Congo" é fora
de discussão.
Kevin Neuendorf já foi devidamente punido e afastado.
Talvez aproveite para estudar geografia, porque nem sequer distinguiu a qual Congo se referia, se ao
Congo-Brazzaville ou ao Congo-Kinshasa, também chamado de República Democrática do Congo.
Seja qual Congo for, no entanto, ficam as perguntas: quem se horrorizou com a piada sem graça o fez por
termos sido comparados a um país
africano ou com a ignorância do bobalhão? Se ele tivesse escrito "bem-vindo à França", também haveria
reações patrióticas?
As perguntas cabem porque, na
Copa da Alemanha, o francês
Thierry Henry declarou que a habilidade natural do brasileiro para o
futebol se deve à falta de escola. "Os
brasileiros jogam futebol desde que
nascem. Nós tínhamos de ir à escola
das 8h às 17h e, quando pedíamos
permissão à mãe para jogar, ela dizia
não. Eles jogam das 8h às 18h, então
em algum momento a técnica aparece", arrematou o craque.
E muita gente se ofendeu por aqui,
embora seja inegável a verdade que,
desafortunadamente, a frase contém. Ou estamos felizes com o padrão educacional brasileiro e temos
nossas crianças bem atendidas na
rede escolar, seja a pública, seja a
particular? Ou não é verdade que
um dos poucos meios de ascensão
social para a garotada excluída é o
futebol, ou a música, ou, por pouco
tempo, o tráfico de drogas?
Confesso a minha também ignorância sobre a quantas anda a corrupção nos Congos.
Nem sei quem é o presidente do
Senado deles.
Nem se a Gautama já andou por lá
(e é possível), ou se jovens de classe
média batem em brancas pela madrugada. Ou se há mensalão, mensalinho, apagão aéreo, sanguessugas,
ou mosquito da dengue, embora saiba, ao menos, que o calor é forte, como no Rio, ou em Nova York no verão. Carros blindados, há?
O que sei, ainda, é que não há o
menor motivo para nos fazermos de
indignados quando verdades são ditas sobre o Brasil, por mais que venham da boca de estrangeiros.
Afinal, a mesma globalização que
descaracterizou a seleção de futebol,
permite que cada um dê sua opinião
sobre tudo e todos, como, por exemplo, Carlos Nuzman fez questão de
ridicularizar os Jogos Pan-Americanos de Santo Domingo, em 2003.
Verdade que começa a pagar pela
língua mais cedo do que imaginava,
com todos os atrasos do Rio-2007 e
com a proteção que cobre seus parentes e amigos, cada vez mais revelada, onde se cutuca nas diversas
empresas que gravitam em torno do
evento.
O americano no Rio pode se imaginar no Congo como nós podemos
dizer que George W. Bush não passa
de um sanguinário mentiroso.
É jogo jogado.
O que não podemos é defender
que nossas mazelas fiquem escondidas do mundo, porque sempre haverá alguém para mostrar que o rei está nu.
E a nudez nacional é daquelas de
dar vergonha, no esporte e fora dele,
em partes iguais.
blogdojuca@uol.com.br
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