|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Seleção brasileira, 100% negra
JUCA KFOURI
Colunista da Folha
Dida; Evanílson, João Carlos,
Odvan e Roberto Carlos; Flávio
Conceição, Vampeta (Beto), Zé
Roberto e Alex (Christian);
Amoroso (Ronaldinho) e Ronaldo.
Se é verdade que o presidente
da República, FHC, tem um pé
na cozinha, como gosta de dizer,
o dono do segundo cargo mais
importante do país, o técnico da
seleção, Wanderley Luxemburgo, tem os dois.
E, por sua obra e graça, os 22
pés que entraram em campo para enfrentar o Chile representavam o que o Brasil tem de melhor -a magia de seus negros
craques de futebol.
E não só os 22 que entraram,
diga-se de passagem. Some mais
os seis pés que entraram no decorrer do jogo e nenhum era
branco.
Para não correr o risco do racismo ao contrário, é bom desde
logo explicar o porquê dessa
saudação.
Houve um tempo, mais remoto, em que se decretou que goleiro negro não servia, porque ficava nervoso e outras bobagens
-todas inventadas desde que
Barbosa foi escolhido como o bode expiatório da derrota diante
do Uruguai, na Copa de 1950.
Depois, em 1958, no mais famoso documento jamais visto
na história de nosso futebol,
consta que havia um conselho
para que a seleção fosse composta pelo maior número possível
de brancos, o que explicaria a
presença de De Sordi no lugar de
Djalma Santos; de Orlando e
não de Zózimo; de Joel em vez de
Garrincha e de Mazzola na vaga
de Pelé, na estréia brasileira em
gramados da alva Suécia.
Verdade ou lenda, o fato é que
o futebol brasileiro foi mesmo
embranquecendo, a ponto de os
ídolos maiores dos anos 80 serem todos brancos -Zico, Sócrates, Falcão- , tendência que
um pioneiro censo feito pela revista ""Placar", à época, constatou.
Era a supremacia dos que começaram a chutar bola na escola e não na rua, nos clubes e não
na várzea, fruto da especulação
imobiliária que dizimara os terrenos baldios que revelaram
tantos e tantos craques brasileiros.
E os brancos não corriam atrás
da bola como de um prato de comida, célebre definição do filósofo da praia carioca Neném
Prancha.
Pois Luxemburgo trouxe os
negros de volta, e, coincidência
ou não, eis que diante dos chilenos a seleção brasileira fez sua
melhor apresentação nesta pobre Copa América.
Por coincidência, esta coluna
foi escrita em Salvador, capital
remodelada, restaurada e novamente adorável, da Bahia, onde
se vê o povo ostentar com orgulho, estampada em suas camisetas, a frase ""100% negro", que
serve como luva ao time de Luxemburgo.
Dida pega pênaltis como se pegasse ônibus; João Carlos está
surgindo como uma solução
buscada desde 1994; Flávio Conceição é mais jogador do que
Émerson, embora não tenha a
personalidade dele; Zé Roberto
foi muito mais eficaz do que Rivaldo; Ronaldinho é mesmo o
bicho; Ronaldo perdeu quatro
gols por mero detalhe (bom dia,
Carlos Alberto Parreira, agora
ficou bem claro o que você quis
dizer um dia e virou motivo de
piada para nós que gostamos de
uma maldade); e o Chile só não
levou uma goleada, como a Venezuela, porque a bruxa estava
solta, Vampeta e a neblina que o
digam.
Juca Kfouri escreve aos domingos, às terças
e às sextas-feiras
Texto Anterior: Argentina deve ter domingo o seu "meio de campo ideal" Próximo Texto: Sparring - Eduardo Ohata: A arte da negociação Índice
|