São Paulo, sexta-feira, 09 de agosto de 2002

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FUTEBOL

A paixão de Alaor, o torcedor

JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA

Alaor era um torcedor. Um torcedor fanático. Ele assistia a todos os jogos do seu time, lia os jornais esportivos de cabo a rabo, não perdia uma mesa-redonda e passava horas na internet atrás de notícias sobre seu clube.
Neste ano, porém, os dirigentes mudaram a vida de Alaor. Criaram um calendário tão estúpido que seu time iria ficar quatro meses fora do campo. Quatro meses!
Nos primeiros dias sem futebol, Alaor ficou irrequieto e mal-humorado. Tinha suores noturnos, não cumprimentava os vizinhos, zangava-se com os filhos e dava respostas secas para sua mulher, Rosa, a bondosa.
Mas o tempo foi passando. Alaor foi se conformando. Trocou os jogos por filmes, os jornais esportivos por livros, as mesas-redondas pelo Discovery Channel.
A família estranhou, mas espanto mesmo foi quando, num domingo, no café da manhã, Rosa e os filhos o ouviram dizer:
- E se a gente fosse ver essa exposição do Renoir?
Todos se entreolharam. Rosa se perguntou se ele teria uma amante. O filho adolescente pensou: "O velho enlouqueceu de vez". E a caçula imaginou que alienígenas deviam ter sequestrado o pai e colocado outro em seu lugar.
Naquela tarde, quando a família deixou o Masp e caminhou pela rua Augusta para ver um filme iraniano, ele comentou:
- O problema dessas exposições é que vem muito curioso. Os efeitos cromáticos do impressionismo são uma coisa que você precisa observar com calma.
E Alaor não parou por aí: o chuveiro do banheiro foi finalmente consertado, o quarto do filho ganhou uma nova pintura e, no Dia dos Namorados, Rosa, a bondosa, quase desmaiou ao receber seu presente: um baby-doll transparente acompanhado de uma garrafa de champanhe francês.
- Mas Alaor, essas coisas coisas são muito caras...
- Não para quem acaba de ser promovido.
Sim, ele também tinha se transformado num trabalhador exemplar. Já não era mais tão disperso nem ficava desenhando escudos do seu time de futebol nas circulares da empresa.
Alaor havia se tornado um sujeito perfeito. Sua mulher tinha um sorriso de Mona Lisa nos lábios, os filhos adoravam quando ele os ajudava com a lição de casa, e seu nome era cotado para a gerência. Caminhava a passos largos para o topo da montanha. Porém, curiosamente, Alaor não sorria mais.
Então, ontem, quando Alaor fazia os preparativos para a festa de aniversário da mãe de Rosa, percebeu que não havia jiló na despensa. Sem pestanejar, ele vestiu o paletó (agora ele usava paletó em vez da camisa do time) e foi comprar a comida preferida de sua sogra.
Ele vinha assobiando um tema de Mahler pela rua quando uma folha de jornal levada pelo vento atingiu seu rosto em cheio. Era, por obra do destino, uma página esportiva e nela estava escrito que, finalmente, depois de quatro meses, seu time voltaria a jogar. Ele leu a reportagem com os olhos vidrados. Depois, sentou-se na calçada e leu outra e mais outra.
Alaor, o torcedor, só voltou para casa horas depois. Entrou pela porta sorrindo e cantando o hino do clube. Numa mão, trazia a bandeira do seu clube e, na outra, um cornetão enorme. Aí foi dançando até a cozinha e soprou bem no ouvido de sua mulher: Uóóóó!
Nesse momento, uma grossa lágrima caiu pela face de Rosa.

Meias
Um organizador de jogo é um animal raro no futebol de hoje, uma espécie de urso panda, e o Palmeiras deu um passo inteligente ao trazer Zinho para atuar ao lado de Arce e Lopes na armação das jogadas para Nenê e Munõz (ou Dodô). Já o Corinthians parece estar perdendo Ricardinho e não tem peças de reposição à altura. A saída pode ser imitar o Brasil de Felipão, que foi campeão do mundo sem esse tipo de meia.
Avantes A vinda de Guilherme pode ser uma boa opção para o Corinthians. É um jogador que precisa de um bom municiador (Gil talvez possa fazer o papel que Marques desempenhava no Atlético-MG) e que tem fases boas (quando não perde um gol) e péssimas (quando não acerta nem a bola). Na reserva, cutucando Guilherme, ficará Gilmar, que parece ser promissor.

E-mail torero@uol.com.br



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