São Paulo, segunda-feira, 09 de agosto de 2004

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FUTEBOL

Os extremos se tocam

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Até que enfim o Flamengo ganhou uma (a primeira com o técnico Paulo César Gusmão). Segue na lanterna, mas a vitória sobre um dos líderes do campeonato deve dar um novo alento ao rubro-negro.
Na partida de ontem, foi decisiva a volta do meia Zinho, que deu mais qualidade e equilíbrio ao meio-de-campo flamenguista.
Além disso, Jean e Athirson souberam explorar bem o espaço deixado na esquerda, às costas de Cicinho. No mais, o jogo foi equilibrado -e o gol do Flamengo acabou saindo quando o São Paulo parecia melhor no jogo, criando mais chances de marcar.
O jogo foi muito revelador do atual estágio de nivelamento entre os clubes brasileiros. Nenhum dos dois times mostrou solidez tática, padrão de jogo, entrosamento. Só muito raramente surgia uma jogada mais ou menos trabalhada. Predominavam, ao contrário, os rompantes individuais e os lances casuais.

Além do equilíbrio entre os clubes, o Brasileirão está mostrando também a irregularidade de grande parte deles. Alguns casos são flagrantes. O Goiás, por exemplo, depois de vencer o Palmeiras por 3 a 0 no Parque Antarctica, perdeu para o Coritiba em casa. O Grêmio venceu bem o líder Santos, mas perdeu em seguida para o Atlético-MG. Já o Atlético-PR é um time que goleia com a mesma facilidade com que é goleado.
Paradoxo dos paradoxos, a Ponte Preta, que disputa a liderança com Santos e São Paulo, tem saldo negativo de sete gols.
Com isso, o torneio fica ainda mais imprevisível. O próprio Santos, que dava a impressão de estar prestes a disparar na liderança, perdeu duas partidas seguidas e corre o sério risco de perder também seu treinador.
Ou seja, às vésperas do início do returno, tudo está em aberto no Brasileirão. O maior fosso de pontos que se abre é entre o bloco intermediário e o dos clubes ameaçados de rebaixamento. Esses cinco ou seis retardatários precisam se cuidar. Se a recuperação não começar logo, não virá nunca.

O Corinthians jogou muito mais que o Botafogo, mas foi punido por uma falha imperdoável numa defesa com três zagueiros, ao deixar Schwenk concluir na pequena área. E o Palmeiras venceu em Criciúma um dos jogos mais empolgantes da rodada, com dois gols bem construídos que contaram com a participação decisiva de Thiago Gentil.

O baixo nível do Campeonato Brasileiro tem levado muita gente a condenar o sistema por pontos corridos e a pregar a volta dos mata-matas. Como se esse passo atrás fosse elevar magicamente a qualidade dos elencos, evitar a evasão de craques, melhorar a situação dos estádios, sanear as finanças dos clubes etc. Para combater a idéia, basta lembrar que a última Copa do Brasil -feita toda ela em mata-matas- também foi de nível lastimável.

O sentido do esporte
O caderno Mais! de ontem publicou um trecho do maravilhoso texto que o crítico francês Roland Barthes (1915-80) escreveu para servir de narração ao documentário canadense "O Esporte e os Homens" (1961). Quem não leu deve tentar ler. Aqui vai um parágrafo, para dar o gostinho: "Pois há no homem certas forças, alegrias, conflitos e angústias: o esporte as exprime, libera, exacerba, sem permitir que se tornem destrutivas. No esporte, o homem vive o combate fatal da vida, mas esse combate é distanciado pelo espetáculo, reduzido a suas formas, livrado de seus efeitos, perigos e vergonhas: ele perde seu poder nocivo, mas não o brilho e o sentido". Em véspera de Olimpíada, nada melhor que pensar no sentido do esporte.

E-mail: jgcouto@uol.com.br



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