São Paulo, domingo, 09 de setembro de 2007

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JUCA KFOURI

A Perestroika brasileira

A operação da Polícia Federal choca menos pelo que ela revela e mais pela nenhuma cerimônia dos envolvidos

A PF FOI foi feliz ao escolher o nome de sua operação para investigar a parceria Corinthians/MSI. Se quisesse apenas homenagear a Rússia, poderia ter dado o nome de Glasnost -abertura- e não o que deu, Perestroika -reestruturação. Porque é disso que se trata: nosso futebol precisa ser reestruturado de cima a baixo.
Não ache o leitor que uma maldição se abateu só sobre o Corinthians. Tenha certeza, sim, de que o Parque São Jorge foi abalado por uma catástrofe de graves conseqüências, mas a maldição contamina todo o nosso futebol, com as exceções de regra.
Não será temerário dizer que nenhum clube brasileiro, se não hoje, ontem, que seja assim investigado, escapará ileso. Nem federação.
Porque o que está revelado nesta Folha não é nada mais do que os usos e costumes dos cartolas.
Com mais ou menos sofisticação, o que se conclui do relatório não é muito diferente do que se viu nas CPIs do Futebol e da CBF/Nike.
E tão forte é o apodrecimento da superestrutura que comanda o futebol nacional que a podridão comeu até figuras exponenciais daquelas CPIs, em acordos espúrios.
Até mesmo para incrementar a política externa brasileira, vide o tocante jogo da seleção no Haiti, sem dúvida generoso de um lado, mas perverso pelo outro.
É isso. O problema não está nas pessoas, é estrutural, basta ver que os nomes até mudam de vez em quando, embora não a prática.
Mas a sem-cerimônia com que são tratadas as burlas à lei, de fato, impressiona. O cinismo, o sentimento de impunidade, a mentirada nas relações entre os atores são de tal ordem que, se não fossem frutos de gravações de conversas, seriam daquelas coisas que muita gente atribuiria à imaginação fértil de jornalistas levianos ou recalcados.
"Cadê as provas?", perguntaria essa gente, ou por incredulidade verdadeira mesmo ou, no mais das vezes, por covardia ou cumplicidade, muito comum até, ou principalmente, na mídia. Quantas vezes os jornalistas que produzem reportagens de tal teor não são acusados de irresponsáveis e não acabam na Justiça, processados pelos meliantes?
Fato é que jogo de futebol há muito deixou de ser um jogo de futebol para se transformar num jogo de práticas corruptas, viciadas do começo ao fim, graças à paixão popular que banca as quadrilhas espalhadas pelo país afora.
Não é teoria, atenção, é a prática, eis aí a Operação Perestroika para demonstrar novamente.
Que o presidente da República se arrependa de ter dado uma Timemania a mais para manter o esquema e de seu discurso isentando a cartolagem é o mínimo que se espera, ainda mais dele, que recebeu tantas vezes a direção corintiana.
Claro, com a desculpa de que não sabia de nada, embora a ninguém seja admissível tanta ingenuidade.
E que, daqui por diante, com o aval da polícia de seu governo, retome o caminho iniciado quando assinou o Estatuto do Torcedor e a Lei da Moralização do Esporte, para que uma nova geração de dirigentes esportivos possa surgir profissionalizada e com a visão do negócio do futebol, não a das negociatas.


blogdojuca@uol.com.br

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