São Paulo, Terça-feira, 09 de Novembro de 1999
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BASQUETE NO MUNDO
Sem dívidas

MELCHIADES FILHO
O calvário das irmãs Sobral desencavou um discurso que vez ou outra infesta TVs e jornais -e que insulta o bom senso.
Leila, Marta e Márcia estavam desempregadas até a semana passada, em busca de um time para jogar neste semestre.
Era uma situação difícil para elas, que dependem do basquete para viver. E difícil para o basquete, pois as duas primeiras são importantíssimas à seleção que vai aos Jogos de Sydney -e estamos em um ano pré-olímpico.
Esse diagnóstico já foi apresentado aqui, como um convite à reflexão endereçado aos "estrategistas" do esporte no Brasil.
Mas, feita a ressalva, não há compaixão que justifique o discurso choramingas e egoísta que sempre nasce dessa situação.
Como muitos atletas em condição similar em outros esportes -o nome do judoca Aurélio Miguel me vem à cabeça-, as irmãs Sobral passaram quase dois meses cobrando, pela mídia, uma solução do "país".
Você certamente ouviu os apelos, e, quem sabe, até se comoveu. São frases como "Eu fiz muito pelo Brasil lá fora, e agora ele nada faz por mim", "Larguei tudo pelo meu país, e ele me deve isso", "Dei meu sangue pela pátria e veja no que deu" etc.
Isso é dissimulação -ou desespero, vá lá. Ninguém mergulha de cabeça no esporte por "amor" ao verde-e-amarelo. Escolhe-se esse caminho porque ele é estimulante, porque atende a desejos competitivos e/ou porque, várias vezes, representa a única saída da lama social.
Há também uma dose de egocentrismo -ou ingenuidade, vá lá. Pode-se argumentar em favor de Pelé, Senna e, possivelmente no futuro, Kuerten, pois são nomes que contribuem para definir como o Brasil se vê e como ele é visto lá fora. Mas, em linhas gerais, os esportistas entram e saem da vida do cidadão da mesma forma passageira. Deixam sorrisos aqui, afetos acolá, mas não enchem o bucho de ninguém, a não ser o dos seus. O "país" não deve nada a eles.

NOTAS

Devo, não nego...
Eu devo muito ao Navarro e ao Totó, tampinhas da escola que me mostraram que a bola laranja não machuca tanto. Eu devo a Hélio Rubens e a Ubiratan a paixão pelo basquete "que não é jogado para a torcida". Eu devo aos iugoslavos Kicanovic, Petrovic e Dalipagic meu fascínio pelos nomes terminados em "ic". Há mais de dez anos, eu devo a Luciano do Valle, porque, graças a ele, não acompanho sozinho -e, portanto, tenho com quem discutir- os jogos da NBA aqui no Brasil. Eu devo a sanidade ao inventor da tecla SAP, já que acompanhar a NBA em português ainda é dose. Nossa, como eu devo a Renata, pois, convenhamos, uma mulher que gosta de basquete e sabe de cor as escalações do Chicago Bulls é um verdadeiro milagre.

pago quando puder
Tirando a Renata, podem esperar sentados.

E-mail melk@uol.com.br


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