São Paulo, quarta-feira, 10 de julho de 2002

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FUTEBOL

Futebol é o pio do povo

JORGE KAJURU
ESPECIAL PARA A FOLHA

Antes da Copa, era difícil para mim imaginar que um Brasil pentacampeão pudesse ser bom para FHC e RT.
Primeiro, porque o que é bom para eles certamente não é para nós. Segundo, porque apareceria bicho de toda espécime: rato bigodudo, querendo canonizar diabo. Tucano arrogante, dando parabéns pra cartola. Daqui a pouco vão lembrar Gregório de Mattos em "Reprovações": "Se sois homem valoroso, dizem que sois temerário; se não compondes, sois néscio; se honesto sois, não sois homem".
Muito mais que "o ópio do povo", já dizia João Saldanha, "o futebol é o pio do povo".
Mas, hoje, entendo que esse esporte-negócio (só inferior ao petróleo) acaba sendo tão vital para o país que deveria ser considerado uma razão de Estado.
Assim, duas instituições que devem ser voltadas para o bem-estar do povo, como corpo e alma, merecem ser dirigidas por gente acima de qualquer suspeita.

Imprensa é oposição
Seleção e governo não estão só nos coraçõe$.
Na política, a imprensa não deve ter lado, não pode bajular e precisa manter distância cética e crítica do poder. No futebol, as regras não podem ser diferentes.
Antes do Mundial, eu brincava com Juca Kfouri, Juarez Soares e Sócrates que a chance de a nossa seleção ganhar a Copa era mais em função do pessimismo e da desconfiança da imprensa.
2002 e 1994, Felipão e Parreira pareciam ter tudo a ver. Mas nem tanto. É preciso lembrar que antes desta Copa o Brasil disputara sua pior eliminatória (perdeu do Equador) e sua pior Copa América (de Honduras).
A imprensa criticou o que todo mundo enxergava. Onde erramos? Em não acreditar que Ronaldo poderia desequilibrar, assim como Didi, Pelé, Garrincha, Maradona e Romário em outras Copas? Mas como, se o próprio "Fenômeno", depois da Copa, confessou que nem mesmo ele esperava jogar o que jogou?
Discriminamos Rivaldo? Não, na verdade apareceu um Felipão-Freud que bem soube compreender o gênio pernambucano.
O que precisamos refletir é sobre nossa falta de paciência. Não é uma questão de ser otimista ou pessimista, mas, sim, de saber esperar antes de prejulgar.
Numa Copa de sete jogos, dificilmente em qualquer geração, ou safra, não seremos os favoritos.
Em cada década veremos um, dois craques acima da média.
Nesta Copa, o nosso melhor esquema foi o de três atacantes. Toda glória a Felipão, que priorizou, melhorou e arrumou a maneira de marcar, até durante o torneio.
Reconheço, repito e realço: ganhamos o penta, 50% pelos três "erres" do ataque; 25% por um treinador que reuniu uma seleção de estrelas sem nenhum estrelismo; e 25% por um time com 100% de transpiração...
Mas, também, sejamos justos: quiseram calar a nossa boca. Conseguiram. Jogamos um bolão.
E é por isso que a imprensa tem que ser oposição. O resto, como diz o Millôr, é armazém de secos e molhados. E a mim pouco importa que as êmulas claudiquem, o que vale é festejar.

Uma vez Flamengo
Sempre Flamengo. Adeus Imundo. E que também desapareçam os Ricaços e os Euvírus de nossas vidas...

3 em 13 anos
Voltemos na história das nossas Copas. Em 58, o time tinha como base o futebol carioca. Eram três do Botafogo e três do Vasco. De São Paulo, dois eram do Santos. Em 62, o time era um combinado entre cinco do Botafogo, quatro do Santos e dois do Palmeiras. O tri de 70 tinha como base cinco atletas do Santos e do Cruzeiro. Ah, que saudades... Até aí nenhum campeão jogava no exterior -e nosso futebol encerrava o ciclo de times hegemônicos.

2 em 32
Só 24 anos depois veio nossa quarta Copa. Adeus, base. No time titular, só dois atletas do Palmeiras e dois do La Coruña. Dos 22 convocados, 12 atuavam fora. Em 2002, sepultamos a base de qualquer time. Felipão teve, no time titular, 11 atletas de 11 clubes diferentes. Dos 23 chamados, 10 vinham de fora. Ufa! Menos dois em relação a 94.

E-mail kajuru@terra.com.br


Tostão, em férias, não escreve neste espaço até 4 de setembro



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