São Paulo, domingo, 10 de setembro de 2006

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JUCA KFOURI

País do mensalão e da Timemania



O Brasil não só não pune os que prevaricam como, agora, deu para premiá-los nas urnas e nos cofres

O FUTEBOL brasileiro está em festa. A Timemania está, enfim, aprovada.
A cartolagem caloteira acaba de ser premiada com uma loteria.
Caloteira sim, mas não só.
Também contumaz em apropriação indébita, por recolher de seus funcionários os tributos trabalhistas e não depositá-los onde de direito, o que é crime.
Daqui a alguns dias, nas eleições, os políticos brasileiros também festejarão, porque muitos dos seus representantes envolvidos em mensalões e sanguessugas serão reeleitos. E, como se eleição fosse tribunal, se considerarão absolvidos pelo voto.
Alguns nem serão, é verdade, mas pleitearão, com grande chance de sucesso, voltar a um ministério, por exemplo, como o ex-ministro do Esporte, Agnelo Queiroz, cuja grande contribuição foi exatamente a de ter criado a Timemania, o mensalão do futebol, mesada que amortizará as dívidas atuais e abrirá as portas para as que ainda estão por vir.
Sem castigo, com perdão, ou melhor, com prêmio, como ganhar na loteria. Motivo mesmo para festa, aval para continuar a vampirizar os clubes cada vez mais débeis.
Cartolas com vida pregressa decente até reclamam das generalizações que os misturam no mesmo saco sob a alcunha de cartolagem. E protestam em meio à festa surrealista da Timemania que apoiaram.
Não deixam de ter certa razão, como não deixam de votar nos mesmos na CBF e nas federações, com o que, desculpe, passam a merecer a generalização que os indigna.
O futebol brasileiro está em festa. A seleção deu um baile na Argentina e recompôs seu amor próprio.
A festa é tamanha pelo bom desempenho no amistoso londrino que não faltam as vozes sensatas que pedem menos oba-oba e ufanismo, também com certa razão.
Se bem que, aí, dá até para ponderar:
Por que não se pode curtir cada boa vitória por si mesma? Por que o objetivo é a Copa do Mundo, a cada quatro anos? Quem disse que a Copa do Mundo é tudo? Ainda mais essas últimas que temos visto, onde cada jogo é mais tortura que espetáculo?
A perda da Copa do Mundo na Alemanha elimina a alegria das conquistas da Copa América e da Copa das Confederações, nas circunstâncias em que se deram? Quer saber? Dane-se a Copa do Mundo! Carpe diem (aproveite o dia), como se diz, com sabedoria.
Ainda mais em tempos tão sombrios, violentos e irracionais.
Veja o clássico de hoje entre São Paulo e Corinthians.
Quem irá ao Morumbi?
Somente os temerários, porque os responsáveis terão medo, dado o clima de provocações, estimulado por cartolas levianos, por jogadores inconscientes e por uma certa imprensa inescrupulosa, que bota pilha no ressentimento que fez inimigos os que antes eram apenas adversários.
Prova disso viu-se no último clássico, entre Santos e Palmeiras, que tinha menos gente que no jogo, de uma torcida só e em horário pior e com times piores, entre Corinthians e Ponte Preta.
Exatos 30 anos atrás, Francisco Horta, presidente do Fluminense, provocou a torcida corintiana. Queria ver se ela era fiel mesmo e a desafiou a ir ao Maracanã para a semifinal do Campeonato Brasileiro. Estimulou-a pelo positivo, e nada menos do que 70 mil alvinegros transformaram a via Dutra na Avenida Timão, para dividir o Maracanã com os tricolores.
O país de então não era melhor que o de hoje, sob ditadura militar, mensalões escondidos pela censura à imprensa e, em vez da Timemania, a Loteria Esportiva é que era a panacéia, revelada, em 1982, também como corrompida.
Festejemos, pois.

blogdojuca@uol.com.br


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