São Paulo, Terça-feira, 11 de Julho de 2000
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OLIMPÍADA
Maria Lenk foi a Los Angeles-1932 e Berlim-1936 e compete até hoje
Tarzan e Hitler "seguem" a 1ª brasileira olímpica

Agência O Globo
Primeira brasileira a disputar uma Olimpíada, Maria Lenk, 85, inicia mergulho em treino


DA REPORTAGEM LOCAL

Conversar com Johnny Weissmuller (o mais famoso ator a representar Tarzan) numa festa em Hollywood na década de ouro do cinema dos EUA e presenciar um discurso do ditador alemão Adolf Hitler em pleno estádio Olímpico.
Para a nadadora Maria Lenk, 85, estas foram apenas atividades paralelas a suas atuações olímpicas.
Aos 17 anos, em 1932, ela desembarcou em Los Angeles para se transformar na primeira brasileira a disputar uma Olimpíada.
Como era a única atleta na delegação com 82 homens e era proibida a entrada de mulheres na Vila Olímpica, ficou em um hotel.
Na piscina, não passou da primeira eliminatória. Em Berlim-1936, foi melhor: chegou à semifinal. Mas seus feitos foram outros: obteve dois recordes mundiais e foi a pioneira do estilo borboleta. Sua carreira acabou prejudicada pela 2ª Guerra Mundial.
Hoje, Lenk continua nadando: detém 12 recordes mundiais na sua faixa etária e participa neste mês do Mundial, em Munique (Alemanha). (RB)

Folha - Como era ser atleta em uma época em que a mulher que aparecia descoberta era malvista?
Maria Lenk -
As famílias tinham preconceito, não deixavam as filhas nadarem. Eu tinha amigas, descendentes de portugueses, que eram proibidas. Mas meu pai era alemão, atleta e me incentivou.

Folha - À época, as nadadoras usavam maiôs compridos, que depois foram encurtados. Como vê o atual retorno dos uniformes largos para melhorar os tempos?
Lenk -
Antes, era uma questão moral, não podia aparecer nada, mesmo que causasse desconforto. Agora, é uma questão prática. Eu usava um maiô de lã pesadíssimo e só no final da carreira consegui um de seda, bem mais leve.

Folha - Como foi viajar em um navio cargueiro para Los Angeles sendo a única mulher da delegação brasileira?
Lenk -
Fui muito bem acolhida no navio, e não houve nenhum problema. Alguns atletas e dirigentes levaram suas mulheres e filhos, e eu fiquei com eles.

Folha - Lá vivia-se a era de ouro do cinema norte-americano. Como foi seu contato com os astros?
Lenk -
Muitos passeavam pelos estádios e ginásios. E nós íamos a festas em que eles estavam. Cheguei a conversar com Johnny Weissmuller, que era uma pessoa muito cativante e amável. Quando soube que ele morreu louco, fiquei muito surpresa.

Folha - Quatro anos depois, você estava em Berlim durante a Alemanha nazista. Como era o clima entre os esportistas?
Lenk -
Nosso contato com a política era nenhum. Na abertura dos Jogos, Hitler fez um discurso porque estava no protocolo, mas as bandeiras nazistas não podiam entrar nos estádios. Entre os atletas, não se percebeu nenhum preconceito de raça ou origem. Algumas delegações mostraram até simpatia pelos nazistas. Os franceses desfilaram fazendo a saudação nazista no estádio Olímpico.

Folha - Mas havia a idéia de Hitler de comprovar a superioridade da raça ariana naqueles Jogos.
Lenk -
Isso poderia passar na cabeça dele enquanto estava na tribuna de honra. Mas, nas competições, não se fazia diferença. O próprio Jesse Owens foi mais bem tratado na Alemanha do que quando voltou aos EUA, onde os negros não podiam sentar nos ônibus com os brancos.


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