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FUTEBOL
A solidão dos campeões
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Não apenas os atletas, mas
torcedores de todo o mundo,
apaixonados pelo esporte, nacionalistas de ocasião e ufanistas de
plantão já estão preparados para
a maratona das olimpíadas, que
começa hoje com o futebol feminino e masculino.
Estou bem preparado física e
psicologicamente para a cerimônia de abertura e para assistir aos
Jogos. Já abasteci a geladeira e só
vou sair da poltrona diante da televisão para satisfazer as necessidades fisiológicas. Duro será escutar um milhão de vezes palavras e
frases, como espírito olímpico,
deuses gregos, o importante é
competir e outros lugares-comuns.
A maioria dos torcedores, como
eu, entende pouco de muitos esportes. Espero que os jornais e as
televisões sejam mais didáticos.
Não é preciso compreender para
gostar, porém é mais gostoso
quando conhecemos as regras de
cada esporte. Muito mais importante do que competir é vencer.
Essa é a lição número 1 dos campeões. Eles são ambiciosos, perfeccionistas e lutam, obstinadamente, pela vitória. Mesmo os que não
são favoritos sentem-se frustrados
quando perdem.
Para não fugir do chavão, espírito olímpico é o atleta se preparar para competir no seu limite
técnico e físico, além de respeitar
o adversário e não utilizar métodos ilícitos e antiéticos para vencer. Em muitos casos de doping, o
atleta não teve intenção de levar
vantagem. Mas alguns espertalhões perdem o senso da realidade
e acham que nunca serão flagrados no exame. É a onipotência do
pensamento. O esporte é uma disputa prazerosa e agressiva, mas
não é uma batalha. Há um grande número de metáforas de guerra na terminologia do esporte. O
rival é visto como um inimigo que
utiliza de todas as armas para
vencer a luta.
Na maior parte dos esportes, a
criatividade é importante, mas
predomina a técnica. Os lances
são previstos, estudados e treinados. No futebol, a técnica é fundamental, porém os craques fascinam mais pela habilidade, inventividade e imprevisibilidade.
Além de uma disputa técnica e
física, o esporte é uma catarse
emocional. Os sentimentos passam primeiro pelo corpo antes de
serem analisados e racionalizados. O corpo fala primeiro e não
mente. "O corpo é a sombra da alma" (Clarice Lispector).
No esporte, o equilíbrio emocional é fundamental para o sucesso.
O grande campeão não é o que fica tranqüilo, desligado, e sim o
que está apreensivo, tenso, mas
que controla as suas emoções.
A ansiedade é geralmente benéfica. Ela estimula a produção de
substâncias químicas que aumentam a performance. Em situações especiais, o nível dessas
substâncias ultrapassa o limite
permitido. É o doping psicológico.
Mas quando a ansiedade esta acima de um certo nível, que é individual, o cérebro deixa de comandar o corpo e o atleta comete erros
grosseiros. Quanto mais favorito,
mais preocupado e responsável se
sente o atleta. Momentos antes da
disputa de um esporte individual,
ele está só, em completa solidão.
Ninguém pode ajudá-lo. É nesse
instante de dúvida e desamparo,
que nascem os campeões.
Eterno Zagallo
Zagallo completou 73 anos e foi,
merecidamente, homenageado
com o seu busto no Maracanã. É o
que ele mais sonhava. Zagallo
sempre foi um ótimo observador.
Na Copa de 58, percebeu que o
meio-campo era muito grande
para dois jogadores e se tornou o
terceiro armador. Quando o time
recuperava a bola, ele avançava
como um ponta esquerda.
Dos técnicos com quem trabalhei quando jogava, Zagallo foi o
melhor e o único estrategista, detalhista. Gostava de treinos táticos. A seleção de 70 uniu o talento
individual com a organização coletiva. Por isso foi excepcional.
Zagallo foi o mestre dos atuais
treinadores. A seleção atual e a
maioria das equipes brasileiras
jogam como a seleção de 70, com
uma linha de três armadores na
proteção dos quatro defensores e
três jogadores mais adiantados.
O time de 70 recuava e quando
recuperava a bola avançava com
muitos jogadores. Os técnicos
atuais tentam fazer o mesmo. Em
70, no segundo gol contra o Uruguai, os três atacantes (Pelé, Jairzinho e Tostão) trocaram passes
no campo do Brasil e Jairzinho foi
receber a bola na intermediária
do adversário. Com a sua euforia
e cumplicidade, Zagallo faz uma
boa dupla com Parreira. É a
união da prudência e racionalidade do técnico com a emoção e a
ousadia do Zagallo.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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