São Paulo, domingo, 11 de novembro de 2007

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Reforma total

Promoção de Olimpíada também passa por mudança em comportamento da população

DA ENVIADA ESPECIAL A PEQUIM

A preparação de Pequim para a Olimpíada de 2008 não se resume às obras. Boas maneiras se transformaram em uma questão patriótica e os moradores da cidade são conclamados por autoridades e artigos de jornais a se portarem de maneira "civilizada", para transmitirem uma imagem positiva do país ao exterior.
Bombardeados pela campanha e sob ameaça de multas, os habitantes de Pequim começaram a se desfazer de hábitos arraigados, como escarrar na rua, furar filas e buzinar por qualquer razão no trânsito.
No espaço de seis meses entre duas visitas a Pequim -em abril e outubro-, a reportagem da Folha constatou uma visível mudança de comportamento nas ruas da capital chinesa.
O som semelhante ao da erupção de um vulcão que precede o escarro só foi ouvido cerca de 24 horas depois da aterrissagem no aeroporto de Pequim. Até abril, fazia parte da trilha sonora de qualquer caminhada nas ruas da cidade, por mais curta que fosse.
Além da responsabilidade de responderem pela imagem do país diante do mundo, os pequineses foram influenciados pelo impacto que o escarro poderia ter em seus bolsos.
Na semana do feriado de 1º de Maio, o departamento de promoção da civilização de Pequim (o nome é este mesmo) multou 56 pessoas por escarrarem na rua. A pena pelo comportamento "não-civilizado" podia chegar a 50 yuans (US$ 6,4), valor que a maioria dos chineses não ganha em um dia de trabalho.
O mesmo departamento distribuiu 10 mil sacos plásticos durante o feriado de maio, como parte da campanha para que os moradores de Pequim e os que visitam a cidade deixem de jogar lixo nas ruas.
As filas ainda são furadas, mas em escala bem menor. Desde meados do ano, esquadrões de fiscais saem às ruas da cidade todo o dia 11 de cada mês e dão orientações sobre o caráter "civilizado" do respeito à ordem de chegada para atendimento -seja no metrô ou no check-in dos aeroportos. O 11 foi escolhido por se assemelhar a duas pessoas em fila.
Os motoristas também diminuíram as vezes em que levam a mão à buzina. Contrariando o mito da paciência oriental, os moradores de Pequim recorriam à buzina de maneira automática e nas mais diversas situações, mesmo quando seu uso era absolutamente inútil.
O ruído no trânsito continua a ser maior que o de São Paulo, mas diminuiu de maneira sensível entre março e outubro.
Para espanto da repórter, os motoristas de táxi deixaram de fumar dentro dos carros e um deles chegou a apagar um cigarro recém-aceso antes de iniciar a corrida. Neste caso, a ameaça pecuniária pesa mais que o apelo patriótico: a multa é de US$ 25 para o motorista.
(CLÁUDIA TREVISAN)


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