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FUTEBOL
O corpo, a alma e o futebol
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Há vários olhares para o
futebol. Um deles é técnico,
tático, racional, consciente, operatório e coletivo. Essa é a visão
dos treinadores. Eles, por necessidade, pensam muito no resultado
e pouco no espetáculo.
Na Europa, predominam a técnica e a tática sobre a habilidade
e a criatividade. Os melhores jogadores executam muito bem todos os fundamentos técnicos da
posição e utilizam essa técnica em
benefício da equipe.
A técnica pode ser aprendida e
aprimorada nas categorias de base dos clubes e durante a carreira.
Mas, quando ela é excessivamente repetida, sem improvisação e
sem fantasia, acaba se tornando
ineficiente e tecnicista.
O outro olhar é para a habilidade, a criatividade e a beleza do espetáculo.
A habilidade é a intimidade
com a bola e se manifesta principalmente no drible, como o do jovem Leandro Lima (18 anos), do
São Caetano, no zagueiro Marinho, do Corinthians.
Num raríssimo espaço e utilizando as duas pernas, ele driblou
e, rapidamente, acertou um belíssimo e calculado chute por cobertura. E ainda muitos disseram
que houve falhas do goleiro e do
zagueiro.
Diferentemente da técnica, a
habilidade é corporal, natural e
instintiva. Ela surge e se desenvolve na infância, nos campos de pelada, sem regras e sem professores.
A mistura de raças é um dos
motivos da freqüente habilidade
dos jogadores brasileiros. Além
disso, como o Brasil é um país pobre, os meninos, em vez de passarem todo o dia nas escolas, se divertem com a bola nas ruas.
A habilidade fascina mais do
que a técnica. Mas não existe craque sem uma ótima técnica. Por
isso, grande número de jovens habilidosos brasileiros fica no meio
do caminho. O instinto precisa da
razão para sobreviver.
Se a habilidade é uma manifestação instintiva e corporal, e a
técnica, um aprendizado consciente, a criatividade tem mais relação com o imaginário e com a
fantasia.
O grande craque, além da técnica e da habilidade, antevê o lance, inventa, improvisa e surpreende. Ele sabe antes dos outros.
Como ele sabe? Sabendo. Existe
um saber intuitivo que antecede o
raciocínio lógico. Ele sabe, mas
não sabe que sabe.
Em qualquer atividade, os intuitivos são os melhores, desde
que tenham também boa técnica
e habilidade. A intuição não é
uma solução mágica. É o conhecimento que ainda não foi percebido, racionalizado pela consciência e que, de repente, sem pensar e
avisar, surge na mente.
Assim como a habilidade, a
criatividade aparece na infância
e continua na vida adulta. Em
qualquer atividade, brincar com
seriedade é a base da imaginação.
Entretanto, para ser um craque,
é necessário ainda ter uma ótima
capacidade física e emocional. Os
campeões são, geralmente, ambiciosos e sabem lidar com as emoções.
O futebol é um jogo de habilidade, inventividade, de técnica e
também de muita emoção e de
expressão corporal. Um balé. Os
sentimentos se manifestam primeiro no corpo antes de chegarem à consciência. O corpo fala
primeiro.
"O corpo é a sombra da alma."
(Clarice Lispector)
Diabo no corpo
Assim como Torero, Xico Sá e
outros, sou contra a troca do tradicional símbolo do América, de
diabo para águia, como quer o
evangélico e bom treinador Jorginho.
No futebol, o diabo costuma ser
uma virtude. Quando um jogador brilha, falam que ele fez diabruras ou que está com o diabo
no corpo. Garrincha era chamado
de "Anjo Endiabrado". O Manchester United é conhecido como
os "Diabos Vermelhos".
Além disso, em proporções bastante variáveis, todos temos dentro de nós um anjo e um diabo,
que tentamos controlar.
Hoje, todos que não são botafoguenses vão torcer para os diabinhos do América infernizarem a
vida do Botafogo.
Modelo
O São Paulo, além de ter uma
diretoria eficiente, que contrata
bem e rápido, uma ótima estrutura profissional e excelentes especialistas de apoio aos atletas e aos
treinadores, revela muitos bons
jogadores.
O jovem Thiago tem grandes
chances de se tornar um jogador
diferenciado.
Ainda não é.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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