São Paulo, sexta-feira, 12 de março de 2004

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Meia-entrada invade o Paulista

Um em cada dois torcedores assiste a jogos no estádio sem pagar o preço total do ingresso

PAULO COBOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O Paulista dos ingressos a R$ 20 -que fez as uniformizadas protestarem, atletas e técnicos brigarem com suas diretorias e a Federação Paulista bater o pé e, depois, voltar atrás-, não existiu na prática para metade dos torcedores.
A Folha analisou as planilhas de receitas e despesas de todas as partidas do Paulista até aqui.
Metade dos quase 300 mil ingressos vendidos até agora custou, no máximo, R$ 10.
Do total, 44% dos bilhetes foram comprados, teoricamente, com a apresentação de documentos que dão ao torcedor o direito de pagar só metade do preço.
A farra da meia-entrada é ainda maior nas partidas que não contam com os clubes grandes. Em nada menos do que 19 jogos de equipes pequenas, 70% das entradas vendidas foram destinadas a portadores de carteiras de estudantes e idosos -os borderôs não especificam a divisão entre esses dois grupos.
Pelo regulamento do Paulista-04, seis grupos podem pagar 50% do valor das entradas. Além de estudantes e pessoas com mais de 65 anos, professores da rede pública, deficientes físicos, aposentados e menores são beneficiados.
Em alguns casos, parece que só pessoas com essas credenciais prestigiam o campeonato.
Foi o que aconteceu, por exemplo, no confronto entre União São João e Mogi Mirim. Na ocasião, todos os 311 ingressos comercializados foram meias-entradas.
"Não sei o que aconteceu nesse jogo especificamente, mas no Paulista só adultos pagam R$ 20", diz Pedro Morgado, diretor de marketing do clube de Araras, apontando o regulamento como motivo por tantas meias.
O Juventus é outro clube que manda jogos em que inteira é raridade. Contra o Sorocaba, na Rua Javari, foram vendidos 541 ingressos. Desses, nada menos que 537 saíram pela metade do preço. "Aqui perto tem muita gente velha e estudante", afirma Armando Raucci, presidente do Juventus, sobre o perfil do público que prestigia seu time.
O presidente da Federação Paulista, Marco Polo Del Nero, disse que a febre da meia-entrada é a prova de que os mais jovens estão voltando aos estádios. "Fico contente, porque uma das metas do torcedor-família é essa mesmo."
Mas, quando questionado pela Folha sobre casos como o do União São João, Del Nero mudou de posição. Disse que, apesar da presença de fiscais da FPF, poderia estar havendo falha no controle dos ingressos. "Vamos apurar o que está acontecendo. É estranho que todos os ingressos de um jogo sejam de meia-entrada."
O preço do ingresso foi o ponto mais polêmico do Paulista até aqui e gerou negociação inédita entre a FPF e as organizadas, que boicotaram boa parte do Estadual. No auge da crise, a entidade chegou até a oferecer ingressos a R$ 10 às torcidas uniformizadas em troca de um cadastramento. Só a Mancha Alviverde topou.
O controle sobre as meias-entradas, na verdade, está relaxado. No Morumbi, um torcedor do São Paulo na casa dos 30 anos assistiu ao confronto contra a Ponte Preta com um ingresso de aposentado comprado pela mãe.
O encalhe nas bilheterias é outro motivo que ajuda na proliferação da meia-entrada. Os clubes, que costumavam pedir baixa carga desse tipo de ingresso quando a arquibancada valia R$ 10, hoje estimula a ida de estudantes.
Isso acontece com times de todos os níveis e tradição.
No Brasileiro de 2003, o Guarani emitia, em média, 50% da carga total de ingressos para a meia-entrada. Agora, no Paulista, o clube de Campinas chega a colocar 86% dos bilhetes para serem vendidos por 50% do valor integral.
Em média, os jogos envolvendo times grandes no Nacional tinha não mais do que 25% dos torcedores com direito a meia-entrada.
Nos clássicos do Morumbi acontece coisa parecida. No último Brasileiro, no jogo Corinthians x São Paulo, foram emitidos 28 mil bilhetes para a arquibancada, sendo que apenas 4.000, ou 14% da carga do setor, eram destinados para estudantes, aposentados e idosos, entre outros.
Em outros Estados não existe uma disponibilidade tão grande de ingressos pela metade do preço. Na final da Taça Guanabara, entre Flamengo e Vasco, apenas 500 entradas, de um total de 76 mil, eram para estudantes.


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