|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FUTEBOL
Violência e insensatez
SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA
No verão de 93/94, passei
três meses trabalhando no
Rio. A mídia falava muito da violência na cidade -das balas perdidas, sequestros, arrastões e da
guerra entre traficantes. Mas andei por todo lado e em todos os
horários, e as ocorrências mais
graves que presenciei foram o
atropelamento de um ciclista e o
pagamento de R$ 50 a um policial
que flagrou um conhecido meu
com maconha.
Isso significa que o Rio não era
violento? Não. Mas a violência
não era espetacular como se supunha. Era até pior -subterrânea, insidiosa, enraizando-se profundamente nas condições terríveis deste país tão "fácil de governar" (conforme FHC), tão difícil
de viver. A cidade continuava linda, as pessoas tinham prazeres e
esperanças, mas havia milhões de
problemas em ebulição e em gestação (entre eles, a violência), como em outras grandes cidades.
Quando leio nos jornais que os
colombianos estão indignados
com os argentinos (porque não
vão à Copa América) e escarnecendo dos brasileiros e seu aparato de segurança, eu entendo a
reação deles. Lembra a minha indignação com o medo exagerado
das pessoas quando eu dizia: "Estou trabalhando no Rio".
A vida continua em Cali e Bogotá; as pessoas vão ao trabalho,
às compras e ao cinema e não
vêem bombas explodindo a cada
instante. Nós também não gostamos de saber que um governante
estrangeiro vem ao Brasil com seguranças armados até os dentes,
ou que dezenas de turistas cancelaram suas viagens para cá depois
da morte de um visitante em um
assalto. Muitos paulistanos têm
medo de sair de casa à noite, mas
não admitem que forasteiros digam que esta cidade é mais perigosa do que o lugar de onde vêm.
Às vezes temos o prazer idiota
de ver uma tragédia acontecer em
país rico: "Viu? Eles também têm
esses problemas. Bombas explodem no metrô de Paris. Americanos malucos fuzilam crianças".
Reconhecer o perigo de qualquer lugar significa concordar
que a Colômbia tem condições de
abrigar uma Copa? Não. Além da
criminalidade comum e poderosa, o país tem forças guerrilheiras
e paramilitares se digladiando
pelo poder, e a interferência militar estadunidense para "ajudar".
Com motivos justos ou injustos,
as ações dos contendores muitas
vezes resultam nas mortes daqueles que pretendem defender. Eles
julgam que as perdas de vidas civis "acidentes de percurso"; o
quanto se importarão com um
"incidente diplomático"? Definitivamente, esse não é o cenário
ideal para se realizar um evento
internacional, que reúne pessoas
ricas e famosas, jornalistas e multidões anônimas. Por que insistir?
Por que testar os limites?
Mauro Silva tomou uma decisão que pode exclui-lo definitivamente da seleção ou resultar em
eterna desconfiança quanto à sua
"estabilidade emocional". Ele sabe muito bem disso e, mesmo assim, preferiu não ir à Copa e falar
a verdade sobre seus motivos.
Podem dizer que ele foi covarde,
mas na verdade precisou de muita coragem para abandonar o time e o treinador que depositava
tanta confiança nele. O timing da
decisão foi o pior possível, mas ele
tem o direito de agir segundo seus
princípios e preocupações.
Tomara que nada aconteça e
que tenhamos de aguentar o sorriso triunfante dos organizadores
e patrocinadores da Copa América. Mas isso não significará que
eles tinham razão em expor tanta
gente ao perigo.
Direito de discordar
Como eu imaginava, recebi
mensagens furiosas de pessoas que defendem e, em alguns casos, apreciam o uso
de armas. "Não são as armas
que matam, são os cidadãos."
E eu por acaso disse que elas
disparam sozinhas? Tenho
medo do que um cidadão
descontrolado ou mal-intencionado pode fazer com uma
arma. O mais incômodo é
que não aceitam a minha opinião sem concluir que "nós
da imprensa" queremos facilitar a vida dos bandidos. Tenho o direito de ter medo de
pessoas armadas, não?
Benefício
Eu teria dispensado Edílson
depois de (mais um) episódio
de indisciplina no começo da
temporada (demorou a se
apresentar, criou confusão e
abandonou a concentração).
Desconfiava da relação custo-benefício da sua presença.
Agora, tenho de engoli-lo.
E-mail
soninha.folha@uol.com.br
Texto Anterior: Tênis: Guga viaja para disputar série de competições Próximo Texto: Panorâmica - Futebol: Prisão de Edinho é pedida em caso de passaportes Índice
|