São Paulo, quinta-feira, 12 de julho de 2001

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FUTEBOL

Violência e insensatez

SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA

No verão de 93/94, passei três meses trabalhando no Rio. A mídia falava muito da violência na cidade -das balas perdidas, sequestros, arrastões e da guerra entre traficantes. Mas andei por todo lado e em todos os horários, e as ocorrências mais graves que presenciei foram o atropelamento de um ciclista e o pagamento de R$ 50 a um policial que flagrou um conhecido meu com maconha.
Isso significa que o Rio não era violento? Não. Mas a violência não era espetacular como se supunha. Era até pior -subterrânea, insidiosa, enraizando-se profundamente nas condições terríveis deste país tão "fácil de governar" (conforme FHC), tão difícil de viver. A cidade continuava linda, as pessoas tinham prazeres e esperanças, mas havia milhões de problemas em ebulição e em gestação (entre eles, a violência), como em outras grandes cidades.
Quando leio nos jornais que os colombianos estão indignados com os argentinos (porque não vão à Copa América) e escarnecendo dos brasileiros e seu aparato de segurança, eu entendo a reação deles. Lembra a minha indignação com o medo exagerado das pessoas quando eu dizia: "Estou trabalhando no Rio".
A vida continua em Cali e Bogotá; as pessoas vão ao trabalho, às compras e ao cinema e não vêem bombas explodindo a cada instante. Nós também não gostamos de saber que um governante estrangeiro vem ao Brasil com seguranças armados até os dentes, ou que dezenas de turistas cancelaram suas viagens para cá depois da morte de um visitante em um assalto. Muitos paulistanos têm medo de sair de casa à noite, mas não admitem que forasteiros digam que esta cidade é mais perigosa do que o lugar de onde vêm.
Às vezes temos o prazer idiota de ver uma tragédia acontecer em país rico: "Viu? Eles também têm esses problemas. Bombas explodem no metrô de Paris. Americanos malucos fuzilam crianças".
Reconhecer o perigo de qualquer lugar significa concordar que a Colômbia tem condições de abrigar uma Copa? Não. Além da criminalidade comum e poderosa, o país tem forças guerrilheiras e paramilitares se digladiando pelo poder, e a interferência militar estadunidense para "ajudar".
Com motivos justos ou injustos, as ações dos contendores muitas vezes resultam nas mortes daqueles que pretendem defender. Eles julgam que as perdas de vidas civis "acidentes de percurso"; o quanto se importarão com um "incidente diplomático"? Definitivamente, esse não é o cenário ideal para se realizar um evento internacional, que reúne pessoas ricas e famosas, jornalistas e multidões anônimas. Por que insistir? Por que testar os limites?
Mauro Silva tomou uma decisão que pode exclui-lo definitivamente da seleção ou resultar em eterna desconfiança quanto à sua "estabilidade emocional". Ele sabe muito bem disso e, mesmo assim, preferiu não ir à Copa e falar a verdade sobre seus motivos.
Podem dizer que ele foi covarde, mas na verdade precisou de muita coragem para abandonar o time e o treinador que depositava tanta confiança nele. O timing da decisão foi o pior possível, mas ele tem o direito de agir segundo seus princípios e preocupações.
Tomara que nada aconteça e que tenhamos de aguentar o sorriso triunfante dos organizadores e patrocinadores da Copa América. Mas isso não significará que eles tinham razão em expor tanta gente ao perigo.

Direito de discordar
Como eu imaginava, recebi mensagens furiosas de pessoas que defendem e, em alguns casos, apreciam o uso de armas. "Não são as armas que matam, são os cidadãos." E eu por acaso disse que elas disparam sozinhas? Tenho medo do que um cidadão descontrolado ou mal-intencionado pode fazer com uma arma. O mais incômodo é que não aceitam a minha opinião sem concluir que "nós da imprensa" queremos facilitar a vida dos bandidos. Tenho o direito de ter medo de pessoas armadas, não?

Benefício
Eu teria dispensado Edílson depois de (mais um) episódio de indisciplina no começo da temporada (demorou a se apresentar, criou confusão e abandonou a concentração). Desconfiava da relação custo-benefício da sua presença. Agora, tenho de engoli-lo.

E-mail
soninha.folha@uol.com.br



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